Fique por dentro – Informativo STJ 816 Comentado

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MANDADO DE SEGURANÇA

Não é possível fornecer acesso à informação sobre a carga horária de todos os militares da Organização Militar em virtude da disponibilidade contínua de suas atividades.

MS 28.715-DF, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 12/6/2024, DJe 17/6/2024. (Info 816 STJ)

1.1.  Situação FÁTICA.

Tadeu requereu administrativamente acesso à informação sobre a carga horária de todos os militares da Organização Militar. O pedido foi indeferido. Inconformado, impetrou mandado de segurança objetivando provimento mandamental para determinar ao Comandante da Marinha ao fornecimento do acesso aos dados referentes à carga horária de todos os militares da Organização Militar especificada, o número da escala hierárquica do militar, o posto ou graduação e a respectiva carga horária do mês de abril de 2020.       

1.2.  Análise ESTRATÉGICA.

1.2.1.          Questão JURÍDICA.

Lei n. 8.112/1990:

Art. 19.  Os servidores cumprirão jornada de trabalho fixada em razão das atribuições pertinentes aos respectivos cargos, respeitada a duração máxima do trabalho semanal de quarenta horas e observados os limites mínimo e máximo de seis horas e oito horas diárias, respectivamente. 

1.2.2.          Possível o fornecimento das informações requeridas?

R: Não, senhor!!!

A controvérsia cinge-se sobre à possibilidade de, com fundamento na Lei n. 12.527/2011, ser fornecido acesso à informação sobre a carga horária na carreira militar, cujos dados são tidos como inexistentes pela autoridade impetrada.

Quanto à natureza da atividade militar, verifica-se, da leitura do art. 142, § 3º, VIII, da Constituição da República, que não foram atribuídos ao militares os direitos sociais dos trabalhadores previstos no art. 7º, incisos IX, XIII, XV, XVI, XX, XXII, XXX, da Constituição da República, direitos estes, por outro lado, garantidos aos servidores públicos civis, consoante art. 39, § 3º, do mesmo diploma normativo.

Tal dedicação à carreira é assim descrita no Estatuto dos Militares: “Art. 5º. A carreira militar é caracterizada por atividade continuada e inteiramente devotada às finalidades precípuas das Forças Armadas, denominada atividade militar”.

Nesse sentido, ao analisar a natureza da atividade militar, inclusive a sua característica de disponibilidade permanente, a doutrina pontua que “a carreira militar, privativa do pessoal da ativa, caracteriza-se por ser uma atividade continuada e inteiramente devotada às finalidades precípuas das Forças Armadas, denominada atividade militar. Por ser continuada, impõe ao militar da ativa disponibilidade integral.”

Diversa é a regra do art. 19 da Lei n. 8.112/1990, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos federais, categoria da qual os militares foram apartados, por força da EC n. 19/1998. Assim, o Estatuto dos Servidores Públicos Civis limita a jornada de trabalho semanal e diária dos trabalhadores, nos seguintes termos: “Art. 19. Os servidores cumprirão jornada de trabalho fixada em razão das atribuições pertinentes aos respectivos cargos, respeitada a duração máxima do trabalho semanal de quarenta horas e observados os limites mínimo e máximo de seis horas e oito horas diárias, respectivamente.”

Assim, a lei ou a Constituição não impõem uma limitação à carga horária dos militares, estando estes em disponibilidade contínua para as suas atividades, ao contrário dos servidores públicos civis, em relação aos quais as normas constitucionais e legais delimitam a jornada de trabalho.

Por outro lado, a de Lei de Acesso à Informação, prevê que: “Art. 11. O órgão ou entidade pública deverá autorizar ou conceder o acesso imediato à informação disponível. § 1º Não sendo possível conceder o acesso imediato, na forma disposta no caput, o órgão ou entidade que receber o pedido deverá, em prazo não superior a 20 (vinte) dias: […] III – comunicar que não possui a informação […]”.

In casu, não haveria, portanto, registro de dados ou informações sobre a carga horária de serviços a serem prestados pelos militares, pois sua atividade é contínua, devendo sempre atender ao chamado hierárquico, a despeito de se tratar de serviço noturno ou mesmo nos fins de semana, não se remunerando serviço extraordinárias.

Dessa forma, seria impossível, o acesso aos dados referentes à carga horária de todos os militares da Organização Militar, identificados pelo número da escala hierárquica, o posto ou graduação, pois, pela natureza da atividade, não haveria tal previsão, inexistindo, portanto, a informação requerida, sendo desproporcional e desarrazoada a eventual determinação de sua produção pela via judicial.

1.2.3.          Resultado final.

Não é possível fornecer acesso à informação sobre a carga horária de todos os militares da Organização Militar em virtude da disponibilidade contínua de suas atividades.

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA

A negativa de banca examinadora de concurso público em atribuir pontuação à resposta formulada de acordo com precedente obrigatório do STJ constitui flagrante ilegalidade.

RMS 73.285-RS, Rel. Ministro Teodoro Silva Santos, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 11/6/2024. (Info 816 STJ)

2.1.  Situação FÁTICA.

Gertrude, aluna do ECJ que acompanhava semanalmente os informativos estratégicos, inscreveu-se no Concurso para Ingresso na Carreira da Magistratura do Estado do Rio Grande do Sul. A candidata foi reprovada na prova prática de sentença cível, exame no qual lhe foi atribuída a nota final de 5,61.

Ao conferir o resultado, Gertrude verificou que a banca examinadora teria arbitrariamente deixado de aplicar a jurisprudência consolidada do STJ ao examinar o item “ônus da sucumbência”, violando o conteúdo programático previsto no edital do certame, no qual se exige o domínio da jurisprudência dos tribunais superiores. Inconformada, Gertrude impetrou mandado de segurança no qual alega que a banca deveria ter pontuado a resposta formulada de acordo com precedente obrigatório do STJ.

2.2.  Análise ESTRATÉGICA.

2.2.1.          Questão JURÍDICA.

Decreto-Lei n. 4.657/42:

Art. 30.  As autoridades públicas devem atuar para aumentar a segurança jurídica na aplicação das normas, inclusive por meio de regulamentos, súmulas administrativas e respostas a consultas.

2.2.2.          Flagrante ilegalidade?

R: Pau nessas bancas safadas, STJ!!!!

Compete à Administração Pública a escolha dos métodos e dos critérios para aferir a aptidão e o mérito dos candidatos nos concursos públicos destinados ao provimento de cargos públicos efetivos.

Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE n. 632.853/CE (Tema n. 485), sob o regime da repercussão geral, firmou a compreensão de que “não compete ao Poder Judiciário substituir a banca examinadora para reexaminar o conteúdo das questões e os critérios de correção utilizados, salvo ocorrência de ilegalidade e inconstitucionalidade.” (RE n. 632.853/CE, Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 23/4/2015, DJe 29/6/2015).

Entre as hipóteses de ilegalidade que autorizam a revisão judicial da atuação de banca examinadora de concurso público, a inobservância das regras contidas no edital, as quais vinculam tanto os concorrentes no certame quanto a própria Administração Pública. Por essa razão, a jurisprudência do STJ é uníssona ao admitir a intervenção judicial para garantir a observância de normas do edital.

No caso analisado, quanto à avaliação do item relativo à fixação dos ônus da sucumbência, verifica-se que a conduta da banca examinadora, ao negar pontuação à resposta formulada em estrita observância à precedente obrigatório do Superior Tribunal de Justiça, constituiu ato ilegal e contrária ao edital do certame.

A inobservância de precedente obrigatório do STJ nos certames destinados ao provimento de cargos públicos igualmente contraria o art. 30 Decreto-Lei n. 4.657/42 (Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro), o qual determina que as autoridades públicas devem atuar para aumentar a segurança jurídica na aplicação das normas.

Com efeito, é absolutamente contrário à segurança jurídica e à boa-fé administrativa a conduta de banca examinadora de concurso público que, em matéria de lei federal, recusa a interpretação sedimentada pelo órgão constitucionalmente encarregado de uniformizar a interpretação da legislação infraconstitucional.

Por fim, não se pode deixar de assinalar que o edital do concurso público, em seu conteúdo programática de direito processual civil, incluiu expressamente entre os objetos de avaliação “Jurisprudência e Súmulas dos Tribunais Superiores (STJ e STF).”

Assim, ao negar pontuação à resposta formulada em harmonia com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a banca examinadora afastou-se indevidamente do objeto de avaliação expressamente previsto no edital.

2.2.3.          Resultado final.

A negativa de banca examinadora de concurso público em atribuir pontuação à resposta formulada de acordo com precedente obrigatório do STJ constitui flagrante ilegalidade.

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL

A absolvição criminal com fundamento na atipicidade da conduta não faz coisa julgada no juízo cível, considerando a independência das instâncias.

Agint no REsp 1.991.470-MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 11/6/2024. (Info 816 STJ)

3.1.  Situação FÁTICA.

Nelsinho, denunciado pelo crime de apropriação indébita, foi absolvido com fundamento na atipicidade da conduta. Ocorre que, simultaneamente, o sujeito respondia pelos mesmos fatos a uma ação de improbidade administrativa. Após a absolvição da ação penal, sua defesa requereu a aplicação da coisa julgada no juízo cível no qual corria a ação por improbidade.

3.2.  Análise ESTRATÉGICA.

3.2.1.          Questão JURÍDICA.

Lei n. 8.249/1992:

Art. 21. A aplicação das sanções previstas nesta lei independe:

§ 3º As sentenças civis e penais produzirão efeitos em relação à ação de improbidade quando concluírem pela inexistência da conduta ou pela negativa da autoria. 

§ 4º A absolvição criminal em ação que discuta os mesmos fatos, confirmada por decisão colegiada, impede o trâmite da ação da qual trata esta Lei, havendo comunicação com todos os fundamentos de absolvição previstos no art. 386 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal).   

3.2.2.          Interfere no cível?

R: Negativo!!!!

Conforme entendimento sufragado no Superior Tribunal de Justiça, a absolvição operada no Juízo criminal somente se comunica com a esfera administrativa quando negada a existência do fato ou da autoria (AREsp n. 1.358.883/RS, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 3/9/2019).

A absolvição criminal com fundamento na atipicidade da conduta, não faz coisa julgada no cível, considerando a independência das instâncias que, ademais, consta do próprio art. 37, § 4º, da CF: “Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”.

Nesse mesmo sentido da independência das instâncias, diversos são os precedentes do STJ: RMS n. 32.319/GO, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. para acórdão Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe de 22/9/2016 e REsp n. 1.364.075/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe de 2/12/2015.

O referido entendimento jurisprudencial encontra-se em consonância com o disposto no art. 21, § 3º, da Lei n. 8.249/1992 (na redação da Lei n. 14.230/2021), no sentido de que as “sentenças civis e penais produzirão efeitos em relação à ação de improbidade quando concluírem pela inexistência da conduta ou pela negativa da autoria”.

Apesar de o disposto no art. 21, § 4º, da Lei n. 8.429/1992, na redação da Lei n. 14.230/2021, apontar que a “absolvição criminal em ação que discuta os mesmos fatos, confirmada por decisão colegiada, impede o trâmite da ação da qual trata esta Lei, havendo comunicação com todos os fundamentos de absolvição previstos no art. 386 do Decreto-Lei 3.689/1941 (Código de Processo Penal)”, tal disposição está suspensa por liminar deferida na ADI/STF 7.236.

Ademais, nem sempre há correspondência exata entre o dolo que autoriza a improcedência da ação penal por atipicidade da conduta com o dolo exigido no crime de apropriação.

3.2.3.          Resultado final.

A absolvição criminal com fundamento na atipicidade da conduta não faz coisa julgada no juízo cível, considerando a independência das instâncias.

EMBARGOS DECLARATÓRIOS NO AGRAVO DE INSTRUMENTO NA SUSPENSÃO DE LIMINAR E SENTENÇA

A Defensoria Pública não possui legitimidade ativa para manejar pedido de Suspensão de Segurança ou Suspensão de Liminar e Sentença, salvo na preservação do interesse público primário quando atua em defesa de prerrogativas institucionais próprias do poder público.

EDcl no AgInt na SLS 3.156-AM, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Corte Especial, por maioria, julgado em 7/2/2024, DJe 6/6/2024. (Info 816 STJ)

4.1.  Situação FÁTICA.

 A Defensoria Pública do Estado do Amazonas requereu a Suspensão de Liminar e Sentença contra decisão tratando do direito de moradia de pessoas carentes. O STJ decidiu que Defensoria Pública não teria legitimidade para tanto, por entender que a legitimidade da DPE, limita-se à defesa de suas prerrogativas e funções institucionais, não alcançando a hipótese de interesses privados.

4.2.  Análise ESTRATÉGICA.

4.2.1.          DP tem legitimidade ativa para a SS nesses casos?

R: Como regra, NÃO, SALVO na preservação do interesse público primário quando atua em defesa de prerrogativas institucionais próprias do poder público!!!!

Em relação à instituição Defensoria Pública, vale anotar que, conquanto não se ignore, tampouco se negue a importância e relevância social sempre presente quando atua em juízo na defesa dos interesses das classes menos favorecidas falta-lhe, na forma da legislação em vigor, legitimidade para manejar pedido de suspensão de liminar e sentença, tal como já anotado. O status constitucional de função essencial à Justiça (CF, Título IV, Capítulo IV, Seção IV), só por si, não é suficiente a lhe conferir legitimidade para atuar em toda e qualquer demanda ou, especialmente, para ingressar com todo e qualquer incidente processual sem observar os requisitos legais específicos.

Nesse particular, cumpre ver que é assente o entendimento no sentido de que, por revestir excepcional forma de intervenção no regular curso do processo, o incidente de suspensão de liminar e sentença, tal como disciplinado pela Lei n. 8.437/1992, não comporta, nem deve receber interpretação extensiva de modo a ampliar as hipóteses de cabimento e/ou rol de legitimados ativos. Isso porque seu fundamento e razão de ser residem na proteção dos interesses públicos primários, representados, exclusivamente, pelo Estado-administração. Assim, não se devem buscar propósitos sociais a fim de justificar risco de grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, a fim de se reconhecerem outros legitimados afora aqueles listados pela lei.

Ademais, especificamente sobre a legitimidade da Defensoria Pública, colhe-se, também da lavra da Ministra Presidente do STF, precedente aplicável ao tema em foco, de que é: “(…) Consabido que o instituto da suspensão de liminar, desde a sua origem, com a Lei n. 191/1936, art. 13, sob a égide da Constituição de 1934, positivou-se como prerrogativa processual das pessoas jurídicas de direito público interessadas – União, Estados, Distrito Federal, Municípios, respectivas autarquias e fundações públicas -, para efeito de suspensão da eficácia das decisões judiciais desfavoráveis à Fazenda Pública nas hipóteses de grave lesão à ordem, saúde, segurança e à economia públicas. Ainda hoje é o que emerge da literalidade dos arts. 4º da Lei n. 8.437/1992 e 15 da Lei n. 12.016/2009, que também contemplam o Ministério Público como legitimado universal. Embora a jurisprudência, ao influxo da Constituição de 1988, venha paulatinamente ampliando o rol dos legitimados ativos enumerados na legislação de regência, pontuo que a regra geral – pessoas jurídicas de Direito Público e Ministério Público – tem sofrido, e comporta mitigação – interpretada a lei conforme os fins a que se destina -, apenas em casos especialíssimos, nos quais presente a ratio legis de preservação do interesse público primário que a orienta (…). Acaso estivesse a Defensoria Pública, na espécie, utilizando a presente via para tal fim, deteria legitimidade ad causam. Contudo, está a veicular, nesta sede processual, pretensão voltada a assegurar a tutela dos direitos do grupo interessado que assiste, desvinculando-se, pois, do interesse público primário protegido pela legislação de regência, a despeito da sensibilidade e relevância do tema de fundo (…). Assim, quando a Defensoria Pública, em razão da personalidade judiciária, integra o polo passivo da demanda, em defesa de prerrogativas institucionais, atua, em realidade, como o próprio Poder Público, a legitimar, excepcionalmente, a utilização do instrumento de contracautela (…)”.

Dessa forma, apesar do status constitucional da Defensoria Pública – função essencial à Justiça (CF, Título IV, Capítulo IV, Seção IV) – nos termos da legislação em vigor, não lhe é reconhecida legitimidade ativa para manejar pedido de Suspensão de Segurança (SS) ou de Suspensão de Liminar e Sentença (SLS), afora “casos especialíssimos, nos quais presente a ratio legis de preservação do interesse público primário que a orienta”, particularmente, quando, “em defesa de prerrogativas institucionais, atua, em realidade, como o próprio Poder Público” (STF, SS n. 5.628/MA).

4.2.2.          Resultado final.

A Defensoria Pública não possui legitimidade ativa para manejar pedido de Suspensão de Segurança ou Suspensão de Liminar e Sentença, salvo na preservação do interesse público primário quando atua em defesa de prerrogativas institucionais próprias do poder público.

RECURSO ESPECIAL

Sob a égide do CPC/2015, estabelecido o grau de sucumbência recíproca entre os litigantes, a parte autora deverá arcar com os honorários sucumbenciais do advogado do réu e este com os honorários sucumbenciais do advogado do autor.

REsp 2.082.582-RJ, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/6/2024. (Info 816 STJ)

5.1.  Situação FÁTICA.

A CEF ajuizou ação monitória para a cobrança de valor decorrente de cédula de crédito bancário emitida em favor de Pagonada Ltda. A sentença condenou ambas as partes ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, fixados em 10% sobre a diferença entre o valor originariamente cobrado e o novo valor recalculado (sucumbência recíproca), devidos pela respectiva parte a seus próprios advogados.

Em recurso, Pagonada sustenta que não seria possível determinar que cada parte arque com os honorários sucumbenciais de seu próprio advogado, notadamente porque tal proceder representaria vedada compensação de honorários.

5.2.  Análise ESTRATÉGICA.

5.2.1.          Questão JURÍDICA.

CPC/2015:

Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.

§ 14. Os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial.

Art. 86. Se cada litigante for, em parte, vencedor e vencido, serão proporcionalmente distribuídas entre eles as despesas.

Parágrafo único. Se um litigante sucumbir em parte mínima do pedido, o outro responderá, por inteiro, pelas despesas e pelos honorários.

5.2.2.          Cada uma paga o seu?

R: Negativo!!!!

O propósito recursal consiste em dizer se, na hipótese de sucumbência recíproca, pode cada parte ser condenada a arcar com os honorários advocatícios sucumbenciais do seu próprio advogado.

O §14 do art. 85 do CPC/2015 representa relevante inovação legislativa ao dispor que “os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial”.

O art. 86 do CPC/2015 prevê que “se cada litigante for, em parte, vencedor e vencido, serão proporcionalmente distribuídas entre eles as despesas”.

Sob a égide do novo CPC, não mais se aplica o entendimento firmado no STJ no sentido de que “os honorários advocatícios devem ser compensados quando houver sucumbência recíproca, assegurado o direito autônomo do advogado à execução do saldo sem excluir a legitimidade da própria parte” (Súmula n. 306/STJ).

Em se tratando de honorários sucumbenciais, se estabelece uma relação jurídica própria entre a parte sucumbente (devedora) e o advogado da parte contrária (credor), tendo por objeto o pagamento da verba honorária (prestação). Não há, pois, quanto aos honorários sucumbenciais, relação jurídica entre a parte sucumbente e o seu próprio advogado.

Nos termos do art. 85, caput, do CPC/2015, estabelecido o grau de sucumbência recíproca entre os litigantes, a parte autora deverá arcar com os honorários sucumbenciais do advogado do réu e este com os honorários sucumbenciais do advogado do autor. Não é lícito, portanto, na hipótese de sucumbência recíproca, a condenação de cada parte ao pagamento de honorários sucumbenciais de seus próprios advogados, sob pena de, indiretamente, se chancelar a compensação vedada expressamente pela lei e de se produzir situações inadmissíveis do ponto de vista lógico-jurídico e sistemático.

5.2.3.          Resultado final.

Sob a égide do CPC/2015, estabelecido o grau de sucumbência recíproca entre os litigantes, a parte autora deverá arcar com os honorários sucumbenciais do advogado do réu e este com os honorários sucumbenciais do advogado do autor.

RECURSO ESPECIAL

É cabível agravo de instrumento contra decisão interlocutória que julga procedente, total ou parcialmente, a primeira fase da ação de exigir contas. É aplicável a técnica de julgamento estendido ou de ampliação do colegiado na hipótese de parcial provimento a agravo de instrumento contra decisão que julgou a primeira fase da ação de exigir contas.

REsp 2.105.946-SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/6/2024, DJe 14/6/2024. (Info 816 STJ)

6.1.  Situação FÁTICA.

Gertrude ajuizou ação de exigir contas em face de sua mãe Crementina, questionando as contas relativas aos bens administrados pela segunda enquanto da minoridade da autora. O juiz julgou parcialmente procedente o pedido, para condenar a requerida na obrigação de prestar contas da administração do patrimônio do requerente.

As duas partes interpuseram agravo de instrumento, que foi julgado por maioria em favor de Gertrude. Em recurso especial, Crementina sustenta que o ato do juiz que encerra a primeira fase da ação de exigir contas seria sentença impugnável por apelação. Além disso, defende que seria aplicável à hipótese a técnica de julgamento estendido.

6.2.  Análise ESTRATÉGICA.

6.2.1.          Cabível o agravo de instrumento?

R: Yeap!!!!

Embora tenha existido, sobretudo nos primeiros anos de vigência do CPC/2015, controvérsia doutrinária e jurisprudencial sobre a natureza da decisão e o recurso cabível contra a decisão que julga a primeira fase da ação de exigir contas, se decisão parcial de mérito impugnável por agravo de instrumento ou se sentença de mérito impugnável por apelação, fato é que essa controvérsia foi definitivamente resolvida pelo STJ em sucessivos precedentes.

Por ocasião do julgamento do REsp n. 1.746.337/RS, Terceira Turma, DJe 12/4/2019, concluiu-se que “o ato judicial que encerra a primeira fase da ação de exigir contas possuirá, a depender de seu conteúdo, diferentes naturezas jurídicas: se julgada procedente a primeira fase da ação de exigir contas, o ato judicial será decisão interlocutória com conteúdo de decisão parcial de mérito, impugnável por agravo de instrumento; se julgada improcedente a primeira fase da ação de exigir contas ou se extinto o processo sem a resolução de seu mérito, o ato judicial será sentença, impugnável por apelação“.

Contudo, o caso em julgamento é inédito no STJ, na medida em que aborda decisão interlocutória que encerra a primeira fase da ação de exigir contas, especialmente na hipótese de procedência parcial que permita o ingresso na segunda fase dessa ação. De todo modo, não há razão para que, nessa hipótese, adote-se uma solução distinta daquelas anteriormente fixadas.

Assim, se a decisão interlocutória que julga procedente, total ou parcialmente, o pedido na primeira fase da ação de exigir contas possui natureza jurídica meritória, caberá agravo de instrumento.

E em relação à aplicação da técnica ampliada de julgamento???

Aplicável ao caso!!!!

A técnica de ampliação de colegiado possui requisitos próprios e distintos quando aplicada ao agravo de instrumento e à apelação. Na primeira hipótese exige-se, para incidência da norma, que exista a reforma da decisão que julgar parcialmente o mérito, o que não está limitado ao julgamento antecipado parcial de mérito previsto no art. 356 do CPC. Ao contrário, possui sentido mais amplo e se refere às decisões interlocutórias que versem sobre o mérito do processo.

Nesse sentido, o STJ, reiteradamente, conferido contornos mais precisos às hipóteses em que deve ser aplicada a técnica de ampliação do colegiado prevista no art. 942, § 3º, II, do CPC. Inicialmente, definiu-se que a regra somente se aplicará à hipótese de decisão interlocutória que tenha sido proferida na fase de conhecimento, não se aplicando a técnica de ampliação de colegiado ao processo executivo e à fase de cumprimento de sentença.

Posteriormente, concluiu-se pela aplicação da técnica nas hipóteses: i) decisão interlocutória a respeito do crédito e de sua classificação em incidente de impugnação de crédito, a qual possui natureza jurídica de ação declaratória incidental; ii) decisão interlocutória de mérito proferida na fase de liquidação por arbitramento; iii) decisão interlocutória que reconhece a inexistência de ato de improbidade administrativa; e iv) decisão proferida em incidente de desconsideração (direta ou inversa) da personalidade jurídica.

O caso em julgamento é inédito no STJ, na medida em que aborda o exame da aplicação da mencionada regra quando se tratar da decisão interlocutória que encerra a primeira fase da ação de exigir contas, especialmente na hipótese de procedência parcial que permita o ingresso na segunda fase dessa ação.

Dessa forma, a decisão interlocutória que julga a primeira fase da ação de exigir contas possui conteúdo meritório e o conceito de “julgar parcialmente o mérito” diz respeito amplamente às decisões interlocutórias que versam sobre o mérito do processo. Por essa razão, uma vez reformada, por maioria, a decisão interlocutória que julgou parcialmente procedente a primeira fase da ação de exigir contas, há a necessidade de ampliação do colegiado.

6.2.2.          Resultado final.

É cabível agravo de instrumento contra decisão interlocutória que julga procedente, total ou parcialmente, a primeira fase da ação de exigir contas. É aplicável a técnica de julgamento estendido ou de ampliação do colegiado na hipótese de parcial provimento a agravo de instrumento contra decisão que julgou a primeira fase da ação de exigir contas.

RECURSO ESPECIAL

O importador por conta e ordem de terceiros não tem legitimidade para utilizar créditos de PIS-importação e Cofins-importação, uma vez que não arca com o custo financeiro da operação.

REsp 1.552.605-SC, Rel. Ministro Paulo Sérgio Domingues, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 11/6/2024. (Info 816 STJ)

7.1.  Situação FÁTICA.

Mapa Mundi Importação ajuizou ação por meio da qual intentava ter garantido o direito para utilização dos créditos de PIS-importação e Cofins-importação, mesmo quando realizada a importação por conta e ordem de terreiros. A Fazenda Nacional não curtiu a ideia e sustenta a ilegitimidade da importadora para tanto.

7.2.  Análise ESTRATÉGICA.

7.2.1.          Questão JURÍDICA.

Lei 10.865/2004:

Art. 18. No caso da importação por conta e ordem de terceiros, os créditos de que tratam os arts. 15 e 17 desta Lei serão aproveitados pelo encomendante.

7.2.2.          Parte legítima para utilização dos créditos?

R: Nooopsss!!!

O ponto central da controvérsia cinge-se à possibilidade ou não de restituição de valores referentes ao PIS-importação e à COFINS-importação à empresa que atuou como importadora por conta e ordem de terceiros.

A importação indireta, diferentemente da importação direta – em que o importador assume total responsabilidade pela operação -, envolve a participação de intermediários e pode ser dividida em duas modalidades: importação por encomenda e importação por conta e ordem de terceiro.

A definição mais recente da Receita Federal sobre importação por conta e ordem de terceiros está no artigo 2º da Instrução Normativa RFB 1.861/2018, que assim dispõe: “Art. 2º Considera-se operação de importação por conta e ordem de terceiro aquela em que a pessoa jurídica importadora é contratada para promover, em seu nome, o despacho aduaneiro de importação de mercadoria de procedência estrangeira adquirida no exterior por outra pessoa, física ou jurídica”.

Nesse sentido, observa-se que uma empresa (importadora por conta e ordem) é contratada para viabilizar (promover ao despacho aduaneiro), em seu nome, a importação de mercadoria adquirida no exterior por outra pessoa (que assume os encargos financeiros da operação), atuando como mandatário.

A legislação prevê expressamente que é o adquirente quem tem direito ao crédito de Pis-importação e de Cofins-importação, nesses casos, conforme disposto na Lei 10.865/2004, em especial no seu art. 18, nos seguintes termos: “Art. 18. No caso da importação por conta e ordem de terceiros, os créditos de que tratam os arts. 15 e 17 desta Lei serão aproveitados pelo encomendante”.

Ademais, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, no AgRg no REsp n. 1.573.681/SC, julgado em 3/3/2016, também já decidiu nesse mesmo sentido, afirmando que “não é possível ao importador que realizou a operação por conta e ordem do terceiro repetir o indébito do tributo pago a maior, até porque os créditos já podem ter sido utilizados pelo terceiro encomendante e, assim, não poderiam ser restituídos ao importador sob pena de dupla repetição“.

Dessa forma, o importador por conta e ordem de terceiros não tem legitimidade para utilizar créditos de PIS-importação e Cofins-importação, uma vez que não arca com o custo financeiro da operação.

7.2.3.          Resultado final.

O importador por conta e ordem de terceiros não tem legitimidade para utilizar créditos de PIS-importação e Cofins-importação, uma vez que não arca com o custo financeiro da operação.

RECURSO ESPECIAL

A retirada de valores do caixa da sociedade, em contrariedade ao deliberado em reunião de sócios, configura falta grave, apta a justificar a exclusão de sócio.

REsp 2.142.834-SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/6/2024. (Info 816 STJ)

8.1.  Situação FÁTICA.

Em uma ação de dissolução parcial de sociedade, foi postulada a exclusão de um dos sócios com fundamento na comprovada ocorrência de retiradas irregulares de valores do caixa da sociedade e na prática de outras condutas que configurariam falta grave apta a justificar a exclusão do sócio. Havia regra específica no contrato social acerca da necessidade de deliberação prévia dos sócios para a distribuição de lucros.

Em recurso, o sócio faltoso Creiton alega que não houve prática de falta grave, tratando-se de mera discordância entre os sócios quanto à gestão da sociedade.

8.2.  Análise ESTRATÉGICA.

8.2.1.          Questão JURÍDICA.

Código Civil:

Art. 1.030. Ressalvado o disposto no art. 1.004 e seu parágrafo único, pode o sócio ser excluído judicialmente, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios, por falta grave no cumprimento de suas obrigações, ou, ainda, por incapacidade superveniente.

Parágrafo único. Será de pleno direito excluído da sociedade o sócio declarado falido, ou aquele cuja quota tenha sido liquidada nos termos do parágrafo único do art. 1.026.

Art. 1.072. As deliberações dos sócios, obedecido o disposto no art. 1.010, serão tomadas em reunião ou em assembléia, conforme previsto no contrato social, devendo ser convocadas pelos administradores nos casos previstos em lei ou no contrato.

§ 5 As deliberações tomadas de conformidade com a lei e o contrato vinculam todos os sócios, ainda que ausentes ou dissidentes.

8.2.2.          Falta grave?

R: Com certeza!!!

Trata-se de ação de dissolução parcial de sociedade na qual foi postulado, na origem, a exclusão de um dos sócios com fundamento na ocorrência de retiradas irregulares de valores do caixa da sociedade e na prática de outras condutas que configurariam falta grave apta a justificar a exclusão do sócio, nos termos do art. 1.030 do Código Civil.

Nas instâncias de origem ficou comprovado que houve o levantamento de valores de forma contrária à previsão expressa do contrato social, que exigia, para a distribuição de lucros, deliberação de sócios que representassem, no mínimo, 90% do capital social.

Na hipótese, havia regra específica no contrato social acerca da necessidade de deliberação prévia dos sócios para a distribuição de lucros.

O art. 1.072, § 5º, do Código Civil, por sua vez, dispõe que “as deliberações tomadas de conformidade com a lei e o contrato vinculam todos os sócios, ainda que ausentes ou dissidentes.”

Assim, sob qualquer ângulo, não havia margem que autorizasse a conduta, que, à revelia da deliberação dos sócios, realizaram retiradas do caixa da sociedade.

A conduta, para além de violar a lei e o contrato social, é contrária aos interesses da sociedade e, portanto, configura prática de falta grave que justifica a exclusão judicial do sócio, nos termos do art. 1.030 do Código Civil.

A despeito da noção de falta grave consistir em conceito jurídico indeterminado, no caso, a conduta do sócio violou a integridade patrimonial da sociedade e concretizou descumprimento dos deveres de sócio, em evidente violação do contrato social e da lei, o que configura prática de falta grave, apta a justificar a exclusão de sócio.

8.2.3.          Resultado final.

A retirada de valores do caixa da sociedade, em contrariedade ao deliberado em reunião de sócios, configura falta grave, apta a justificar a exclusão de sócio.

RECURSO ESPECIAL

A aplicação da agravante do art. 61, inc. II, alínea f, do Código Penal, em conjunto com as disposições da Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/2006), não configura bis in idem.

REsp 2.027.794-MS, Rel. Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador convocado do TJDFT), Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 12/6/2024. (Tema 1197). (Info 816 STJ)

9.1.  Situação FÁTICA.

Craudião foi condenado pelo crime de lesão corporal cometido em violência doméstica contra sua esposa Creide. O MP recorreu da condenação por entender que deveria incidir a agravante ao art. 61, inciso II, aliena ‘f’, do CP — circunstância afastada pelo tribunal local por entender que a violência doméstica seria circunstância qualificadora do tipo penal (§ 9º do art. 129), razão pela qual a incidência da agravante importaria dupla punição pelo mesmo fato.

Em recurso, o MP alega não haver bis in idem porque são circunstâncias distintas que tornam mais reprovável o delito, tese da qual sustenta a defesa do apenado.

9.2.  Análise ESTRATÉGICA.

9.2.1.          Questão JURÍDICA.

Código Penal:

Art. 61 – São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime:

II – ter o agente cometido o crime:

f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica

Lesão corporal

Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem:

Pena – detenção, de três meses a um ano.

Violência Doméstica    

§ 9o  Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: 

Pena – detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos.

9.2.2.          Configurado o bis in idem?

R: Negativo!!!

Não há bis in idem na aplicação da agravante genérica prevista na alínea f do inc. II do art. 61 do Código Penal, inserida pela Lei n. 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), em relação ao crime previsto no art. 129, § 9º, do mesmo Código, vez que a agravante objetiva uma sanção punitiva maior quando a conduta criminosa é praticada “com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica”.

Já as elementares do crime de lesão corporal, tipificado no art. 129, § 9º, do Código Penal, traz a figura da lesão corporal praticada no espaço doméstico, de coabitação ou de hospitalidade, contra qualquer pessoa independente do gênero, bastando ser ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem o agente conviva ou tenha convivido, ou seja, as elementares do tipo penal não fazem referência ao gênero feminino da vítima, enquanto o que justifica a agravante é essa condição de caráter pessoal (gênero feminino – mulher).

caput do art. 61 do Código Penal estabelece que as circunstâncias agravantes genéricas sempre devem ser observadas na dosimetria da pena, desde que não constituem ou qualificam o crime.

A circunstância que agrava a pena é a prática do crime de violência doméstica contra a mulher, enquanto a circunstância elementar do tipo penal do art. 129, § 9º, do Código Penal, não faz nenhuma referência ao gênero feminino, ou seja, a melhor interpretação – segundo o art. 5° da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – é aquela que atende a função social da Lei, e, por isso, deve-se punir mais a lesão corporal contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, se a vítima for mulher (gênero feminino), haja vista a necessária aplicação da agravante genérica do art. 61, inc. II, alínea f, do Código Penal.

9.2.3.          Resultado final.

A aplicação da agravante do art. 61, inc. II, alínea f, do Código Penal, em conjunto com as disposições da Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/2006), não configura bis in idem.

AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DECLARATÓRIOS EM HABEAS CORPUS

A prática do crime sob monitoramento eletrônico é fundamento idôneo para modular a fração da minorante do tráfico, pois denota descaso com a Justiça.

AgRg nos EDcl no HC 850.653-SC, Rel. Ministro Antonio Saldanha Palheiro, por unanimidade, Sexta Turma, julgado em 20/5/2024, DJe 23/5/2024. (Info 816 STJ)

10.1.       Situação FÁTICA.

Creitinho foi condenado à pena de reclusão, no regime inicialmente aberto, substituída a pena corporal por restritiva de direitos, por ter sido flagrado em posse de 5g (cinco gramas) de crack.

No momento dos fatos, o rapaz já estava sob monitoramento eletrônico decorrente de outro processo, o que foi utilizado pelo juízo de origem para modular em 1/3 a fração da minorante do tráfico, por entender que o fato dele ter praticado o delito estando sob monitoramento eletrônico devido à prisão em outro processo seria fundamento idôneo para modular a fração do benefício legal, pois denota descaso com a Justiça.

10.2.       Análise ESTRATÉGICA.

10.2.1.       Questão JURÍDICA.

Lei n. 11.343/2006:

Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

§ 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos , desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa. 

10.2.2.       Fundamento idôneo?

R: Com certeza!!!

Nos termos do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, o agente poderá ser beneficiado com a redução de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços) da pena, desde que seja primário e portador de bons antecedentes e não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.

Assim, o referido benefício tem como destinatário o pequeno traficante, ou seja, aquele que inicia sua vida no comércio ilícito de entorpecentes muitas das vezes até para viabilizar seu próprio consumo, e não os que, comprovadamente, fazem do crime seu meio habitual de vida.

No caso, o juízo singular modulou a causa de diminuição de pena para 1/3 em razão de o sentenciado estar “de tornozeleira eletrônica no momento em que executava a prática delitiva, demonstrando maior intensidade no dolo de sua conduta”.

Com efeito, nos termos do entendimento do STJ, “o fato de [ele] ter praticado o delito estando sob monitoramento eletrônico devido à prisão em outro processo é fundamento idôneo para modular a fração do benefício legal, pois denota descaso com a Justiça” (AgRg no REsp n. 2.044.306/PR, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJe de 1/9/2023).

10.2.3.       Resultado final.

A prática do crime sob monitoramento eletrônico é fundamento idôneo para modular a fração da minorante do tráfico, pois denota descaso com a Justiça.

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL

O espólio possui legitimidade para contestar a validade de interceptações telefônicas em processo penal, mesmo após a extinção da punibilidade devido ao falecimento do acusado, especialmente quando tais provas impactam significativamente o patrimônio dos herdeiros em ações de improbidade administrativa que se baseiam em provas emprestadas da ação penal originária.

AREsp 2.384.044-SP, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 11/6/2024. (Info 816 STJ)

11.1.       Situação FÁTICA.

O auditor fiscal Geremia foi condenado à pena de reclusão pelo crime de corrupção passiva. Porém, antes do trânsito em julgado e cumprimento da sentença, foi declarada a extinção da punibilidade em virtude do falecimento do acusado, estando pendente o julgamento em relação à tese de nulidade das interceptações telefônicas que embasaram a condenação.

O espólio de Geremia, nem um pouco interessado no pagamento da multa, peticionou no processo e reivindicava interesse processual na continuidade do julgamento dos embargos anteriormente opostos. Na ocasião, o tribunal local não reconheceu a legitimidade do espólio na medida em que a extinção da punibilidade extingue a própria pretensão punitiva.

11.2.       Análise ESTRATÉGICA.

11.2.1.       Questão JURÍDICA.

Constituição Federal:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XLV – nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido;

Código Civil:

Art. 1.997. A herança responde pelo pagamento das dívidas do falecido; mas, feita a partilha, só respondem os herdeiros, cada qual em proporção da parte que na herança lhe coube.

Lei 8.429/1992:

Art. 3º As disposições desta Lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra dolosamente para a prática do ato de improbidade.

CPC:

Art. 110. Ocorrendo a morte de qualquer das partes, dar-se-á a sucessão pelo seu espólio ou pelos seus sucessores, observado o disposto no art. 313, §§ 1º e 2º .

Código Penal:

Art. 107 – Extingue-se a punibilidade:

I – pela morte do agente;

11.2.2.       Espólio é parte legítima para tanto?

R: Yeap!!!

Cinge-se a controvérsia acerca da legitimidade do espólio para contestar a validade das interceptações telefônicas em processo penal em que houve a extinção da punibilidade, sob o argumento de que impactariam negativamente o patrimônio dos herdeiros, visto que continuam a ser utilizadas em processos cíveis e administrativos relacionados à improbidade administrativa, mesmo após a extinção da punibilidade do acusado devido ao seu falecimento.

Ante a morte do agente condenado e a subsequente transferência patrimonial para seus sucessores, emerge a possibilidade de que estes respondam, até o limite das forças da herança, pelas obrigações deixadas pelo de cujus. Esta prerrogativa encontra fundamento no art. 5º, XLV, da Constituição Federal e é corroborada pelo art. 1.997 do Código Civil, segundo o qual a herança se compromete ao pagamento das dívidas do falecido. Uma vez realizada a partilha, a responsabilidade recai individualmente sobre os herdeiros, proporcionalmente à parte que lhes coube, se tratando do princípio da intranscendência.

Quando ocorre o falecimento do agente público infrator, a questão do ressarcimento dos danos se estende ao patrimônio por ele deixado. Conforme o art. 8º da Lei de Improbidade, as sanções pecuniárias são transmissíveis aos sucessores até o limite do valor do patrimônio transferido. Isso estabelece um marco claro: os herdeiros são responsabilizados apenas até a extensão da herança recebida, sem sofrer penalizações que superem o legado do agente falecido.

Assim, os herdeiros do réu, em ações de improbidade administrativa fundamentadas nos arts. 9º ou 10 da Lei 8.429/1992, possuem legitimidade para continuar no polo passivo da demanda, limitados aos contornos da herança, com vistas ao ressarcimento e ao pagamento da multa civil correspondente, como já decidiu a Corte Superior de Justiça.

No caso, é patente que ao falecido foram atribuídas violações do art. 9º da Lei 8.429/1992, decorrentes do recebimento de vantagens patrimoniais indevidas em razão de seu cargo público, articuladas conjuntamente ao art. 3° da mesma legislação.

Ressalte-se que a extinção da punibilidade do agente, embora resolva a persecução penal em seu aspecto mais imediato, não possui o poder de extinguir os efeitos civis e as obrigações indenizatórias derivadas dos atos ilícitos presumivelmente praticados. Deste modo, a responsabilidade civil, emergente de tais atos, transita indubitavelmente para os sucessores do de cujus.

Nesse contexto, esta continuidade da responsabilidade civil é sustentada pelo ordenamento jurídico, que confere ao espólio a prerrogativa de prosseguir ou iniciar ações que impactem o patrimônio hereditário, nos termos do art. 110 do CPC.

As decisões proferidas no contexto de ações de improbidade administrativa, que se fundamentam em provas potencialmente ilícitas, tais como interceptações telefônicas viciadas, podem ser legitimamente contestadas pelo espólio. Isso porque, a utilização de provas emprestadas que eram questionadas no âmbito do processo penal, após morte do acusado e extinção da punibilidade pelo tribunal de origem, bem como a inadmissão dos embargos de declaração opostos pelo espólio em razão do não reconhecimento da sua legitimidade, inviabiliza o devido contraditório e ampla defesa.

A nulidade das provas em casos penais implica também sua invalidade em processos de improbidade administrativa. Portanto, se as provas são anuladas em um processo penal por irregularidades, como violações a direitos fundamentais, elas se tornam inutilizáveis em processos de improbidade administrativa.

A Lei n. 9.296/1996, que normatiza as interceptações telefônicas, estabelece critérios rigorosos para sua realização, exigindo, sobretudo, uma ordem judicial devidamente fundamentada. Qualquer violação desses critérios pode ser contestada pelo espólio, quando essas ações influenciam diretamente o patrimônio transmitido.

Conforme o art. 107, I, do Código Penal, a morte do agente extingue sua punibilidade. No entanto, isso não elimina os efeitos civis de decisões anteriores que repercutem sobre o patrimônio do espólio. Apesar de a responsabilidade penal ser extinta, os impactos patrimoniais de decisões em ações penais ou de improbidade – que se basearam em interceptações – podem continuar afetando o espólio. Isso exige uma revisão cuidadosa da aplicação da lei ao caso concreto para assegurar que não ocorram violações aos direitos sucessórios.

11.2.3.       Resultado final.

O espólio possui legitimidade para contestar a validade de interceptações telefônicas em processo penal, mesmo após a extinção da punibilidade devido ao falecimento do acusado, especialmente quando tais provas impactam significativamente o patrimônio dos herdeiros em ações de improbidade administrativa que se baseiam em provas emprestadas da ação penal originária.

Créditos:

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