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Avançamos em nossa caminhada jurisprudencial. Chegou a hora do Informativo nº 829 do STJ COMENTADO. Pra cima dele!

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A exigência da Terminal Handling Charge 2 – THC2 (ou Serviço de Segregação e Entrega de Contêineres – SSE) pelos operadores portuários em face dos terminais retroportuários configura abuso de posição dominante, na modalidade compressão de preços (price squeeze) e, por consequência, violação aos regramentos antitruste da Lei n. 12.529/2011.

REsp 1.899.040-SP, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, por maioria, julgado em 27/8/2024, DJe 27/9/2024. (Info STJ 830)

1.1.  Dos FATOS.

Marimax Transportes realiza a importação de bens estrangeiros mediante transporte aquaviário. Só que toda vez que a Marimax vai fazer armazenagem e movimentação de contêineres no porto, a administradora Embraport cobra uma Tarifa de Segregação e Entrega de Contêineres (SSE), também conhecida como Terminal Handling Charge 2 (THC2).

Segundo a Embraport, a tarifa THC2 é exigível pelos terminais portuários pelo serviço de separação e entrega de contêineres em áreas alfandegadas distintas, indo do terminal próximo ao porto para uma localidade conectada a uma rodovia, ferrovia ou aeroporto.

Marimax alega não haver amparo legal para a cobrança da mencionada tarifa, uma vez os operadores portuários já são remunerados por meio do pagamento da Terminal Handling Charge – THC, a qual abrange os serviços de movimentação ou armazenagem de mercadorias.

1.2.  Análise ESTRATÉGICA.

1.2.1.    Do DIREITO.

Lei n. 12.529/2011:

Art. 36.  Constituem infração da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados: 

I – limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa; 

II – dominar mercado relevante de bens ou serviços; 

III – aumentar arbitrariamente os lucros; e 

IV – exercer de forma abusiva posição dominante. 

§ 3o  As seguintes condutas, além de outras, na medida em que configurem hipótese prevista no caput deste artigo e seus incisos, caracterizam infração da ordem econômica: 

IV – criar dificuldades à constituição, ao funcionamento ou ao desenvolvimento de empresa concorrente ou de fornecedor, adquirente ou financiador de bens ou serviços; 

V – impedir o acesso de concorrente às fontes de insumo, matérias-primas, equipamentos ou tecnologia, bem como aos canais de distribuição; 

X – discriminar adquirentes ou fornecedores de bens ou serviços por meio da fixação diferenciada de preços, ou de condições operacionais de venda ou prestação de serviços; 

1.2.2.    Dos FUNDAMENTOS.

Cinge-se a controvérsia a respeito da legalidade da cobrança de tarifa decorrente da prestação de serviço portuário, denominada Terminal Handling Charge 2 – THC2 ou Serviço de Segregação e Entrega de Contêineres – SSE, sob o ponto de vista concorrencial, frente às normas estampadas na Lei n. 12.529/2011.

No cenário regulatório atual, a garantia de acesso às instalações portuárias por todos os atores do mercado constitui elemento indispensável ao fomento de cenário competitivo, especialmente para obstar a concentração da prestação de serviços em reduzido número de players. Trata-se da adoção da teoria das infraestruturas essenciais (essential facilities doctrine), desenvolvida, inicialmente, pela Suprema Corte dos Estados Unidos da América no caso United States v. Terminal Railroad Association,a qual tem especial aplicação em situações nas quais o detentor da infraestrutura está verticalmente integrado com o mercado subsequente, competindo diretamente com seus concorrentes na etapa posterior da cadeia de produtos ou serviços – hipótese dos operadores portuários.

Inobstante a citada teoria não interdite, por si só, a cobrança de preço para o acesso a serviços desempenhados por agente com poder de mercado, mister ressaltar que eventual exigência de valores para essa finalidade pode implicar violação antitruste quando sua exigência (i) for atentatória à livre concorrência ou à livre iniciativa, (ii) tenha o condão de implicar domínio de mercado relevante de bens ou serviços, (iii) importe aumento arbitrário de lucros, ou, ainda, (iv) culmine em exercício abusivo de posição dominante, como consigna o art. 36, caput, I, II, III e IV, e § 3º, III, IV, V e X, da Lei n. 12.529/2011.

De acordo com tais dispositivos, na medida em que atendam aos critérios do caput do art. 36 da Lei n. 12.529/2011, são infrações concorrenciais as ações de limitar ou impedir o acesso de novos players ao mercado, criar dificuldades à constituição ou desenvolvimento de concorrente, impedir acesso de competidores às fontes de insumos ou matérias primas, e, ainda, discriminar adquirentes ou fornecedores de serviços mediante a fixação diferenciada de preços ou condições de prestação de serviço.

Aplicando-se tais prescrições em contextos envolvendo a remuneração do detentor de facilidade essencial pelo acesso a bens ou serviços cuja utilização, pelos concorrentes, é imprescindível ao desenvolvimento de suas atividades, vislumbra-se a possibilidade de eclosão de violações antitruste quando, apesar de voltados à contraprestação por supostas atividades desempenhadas, os preços exigidos pelo competidor verticalmente integrado conferem-lhe, comparativamente aos demais agentes não integrados, vantagem econômica no mercado subsequente.

Isso porque, uma vez exigida determinada quantia pela disponibilização da essential facility, o seu detentor impõe incremento de custos a serem exclusivamente suportados pelos demais concorrentes, restringindo suas margens de fixação de preços, e, em consequência, a competitividade no setor em decorrência de valor unilateralmente cobrado pelo agente econômico verticalmente integrado. Tal prática implica limitação de acesso ou dificuldade ao desenvolvimento de atividades por outros players, especialmente na perspectiva de impedimento financeiro ao usufruto de insumos essenciais à realização do objeto empresarial, caracterizando, portanto, as infrações descritas nos supracitados incisos III, IV, V e X do § 3º do art. 36 da Lei n. 12.529/2011.

Surge, nesse contexto, a ideia subjacente à criação de mecanismos antitruste voltados a impedir a compressão de preços (price squeeze), na qual, conforme a doutrina, “[o] agente econômico pode encontrar-se em posição que lhe permita o aumento do preço de matérias-primas ou insumos essenciais à atividade do concorrente, sem aumentar seus próprios custos (…). É possível, também, que haja ilicitude da prática, caso, mesmo aumentando seus custos, esse incremento prejudique mais seus concorrentes do que a empresa dominante […]. Percebe-se, portanto, que o price squeeze é uma forma de aumentar os custos dos concorrentes”.

Trazendo essas concepções para o caso, verifica-se que a cobrança da THC2 (ou SSE) pelos operadores portuários caracteriza evidente exercício abusivo de posição dominante, na modalidade de compressão de preços (price squeeze). No contexto da exploração do mercado de infraestrutura portuária, os operadores portuários detêm nítida posição dominante, pois a atividade de movimentação de cargas e contêineres caracteriza, a depender do porto organizado onde realizada, exemplo de monopólio ou oligopólio, os quais podem, em razão dessa circunstância, alterar unilateralmente as condições de exercício das subsequentes atividades inerentes ao setor (art. 36, § 2º, da Lei n. 12.529/2011).

1.2.3.    Da DECISÃO.

A exigência da Terminal Handling Charge 2 – THC2 (ou Serviço de Segregação e Entrega de Contêineres – SSE) pelos operadores portuários em face dos terminais retroportuários configura abuso de posição dominante, na modalidade compressão de preços (price squeeze) e, por consequência, violação aos regramentos antitruste da Lei n. 12.529/2011.

É compatível com o ordenamento jurídico o Decreto n. 4.680/2003, na parte que estabelece o limite de 1 (um) por cento, acima do qual se torna obrigatória a informação expressa nos rótulos dos produtos alimentícios comercializados da presença de organismos geneticamente modificados (OGM).

REsp 1.788.075-DF, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 15/10/2024. (Info STJ 830)

2.1.  Dos FATOS.

O Ministério Público Federal e o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor – IDEC ajuizaram ação civil pública contra a União, buscando obrigá-la a proibir a comercialização de alimentos que contenha OGMs (organismos geneticamente modificados) sem a expressa referência de tal dado em sua rotulagem, independentemente da quantidade.

A União alega que o Decreto 4.680/2003 obedece aos ditames respectivos no tocante ao limite de tolerância para a presença não intencional em alimentos convencionais de OGM, dispensando a rotulagem quando tal presença for inferior a 1%. Ainda, sustenta que com a edição da Lei de Biossegurança, o Poder Legislativo transferiu para o Executivo a missão de regulamentar o percentual de OGMs a ser informado pelo consumidor, não podendo ser objeto de apreciação pelo Poder Judiciário.

2.2.  Análise ESTRATÉGICA.

2.2.1.    Do DIREITO.

Constituição Federal:

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

I – soberania nacional;

II – propriedade privada;

III – função social da propriedade;

IV – livre concorrência;

V – defesa do consumidor;

VI – defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;

VII – redução das desigualdades regionais e sociais;

VIII – busca do pleno emprego;

IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País

Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei. 

2.2.2.    Dos FUNDAMENTOS.

Cinge-se a controvérsia acerca da legalidade e compatibilidade com o ordenamento jurídico do Decreto n. 4.680/2003, na parte que estabelece o limite de 1 (um) por cento, acima do qual se torna obrigatória a informação expressa nos rótulos dos produtos comercializados a respeito da presença de organismos geneticamente modificados (OGM).

No Brasil, o início do plantio de transgênicos somente ocorreu em 1999/2000. Naquele momento era compreensível, diante da novidade, a preocupação com a informação absoluta nos rótulos dos produtos.

Passados quase vinte e cinco anos, hoje já se sabe que os alimentos cem por cento transgênicos não representam risco comprovado à saúde, como se imaginava pudessem vir a se mostrar nocivos, muito menos em proporções ínfimas, abaixo de um por cento.

Considerando a proliferação do uso dos transgênicos em inúmeros setores da indústria alimentícia, dificilmente se poderia identificar algum produto que fosse cem por cento isento de alguma partícula de alimentos transgênicos, já que o próprio processo produtivo ou a mera armazenagem dos grãos, por exemplo, pode implicar a presença de algum percentual mínimo de OGM nos produtos finais.

O entendimento no sentido de impedir a comercialização de qualquer alimento que contenha OGM, independentemente do percentual, sem a expressa referência em sua rotulagem, ultrapassa os limites da razoabilidade e proporcionalidade, mostrando-se contrário ao ordenamento vigente, mormente no que concerne aos parâmetros de necessidade e adequação, tendo em vista o atual estado da técnica e a harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo em face do necessário desenvolvimento econômico e tecnológico, a fim de viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal).

Para aqueles que, por questões pessoais de cunho individual, seja insuportável a possibilidade de que algum alimento contenha ínfimas partículas de OGMs, podem buscar no mercado alimentos produzidos com extremo cuidado ascético que lhes garanta que sejam cem porcento livres de quaisquer resquícios de OGM, como ocorre em outros nichos, que oferecem alimentos cem por cento orgânicos, cem por cento livres de agrotóxicos, cem por cento veganos, e outros similares.

Todavia, exigir de toda a indústria que submeta todos os produtos a rigorosos testes, de alto custo, para garantir a informação específica de qualquer ínfimo resquício de OGM, em toda a cadeia produtiva, é providencia exagerada, assaz desproporcional, que afronta a razoabilidade e a proporcionalidade, e impede a convivência harmoniosa dos interesses dos participantes do mercado, a fim de compatibilizar a proteção do consumidor com os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal) e viabilizar o desenvolvimento econômico e tecnológico sustentável, em prol de toda a sociedade.

Nesse sentido, o Decreto n. 4.680/2003 obedece aos ditames legais, no tocante ao limite de tolerância dos OGMs, dispensando a rotulagem em 1% (um por cento), porcentagem que não afronta a razoabilidade e a proporcionalidade, em vista ao desenvolvimento econômico sustentável, sem qualquer risco conhecido aos consumidores e à saúde pública.

2.2.3.    Da DECISÃO.

É compatível com o ordenamento jurídico o Decreto n. 4.680/2003, na parte que estabelece o limite de 1 (um) por cento, acima do qual se torna obrigatória a informação expressa nos rótulos dos produtos alimentícios comercializados da presença de organismos geneticamente modificados (OGM).

É possível presumir a maternidade de mãe não biológica de criança gerada por inseminação artificial “caseira” no curso de união estável homoafetiva.

Processo em segredo de justiça, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 15/10/2024. (Info STJ 830)

3.1.  Dos FATOS.

Craudete, mulher mui pragmática em uma união estável homoafetiva, resolveu ser mãe por meio do método conhecido como inseminação artificial “caseira” ou autoinseminação.

Após o nascimento da criança, a maternidade da mãe não biológica foi questionada judicialmente.

3.2.  Análise ESTRATÉGICA.

3.2.1.    Do DIREITO.

CC/2002:

Art. 1.597. Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:

V – havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido.

3.2.2.    Dos FUNDAMENTOS.

Para que se verifique a presunção de filiação prevista no art. 1.597, V, do CC/2002, é necessário que estejam presentes os seguintes requisitos: (I) a concepção da criança na constância do casamento; (II) a utilização da técnica de inseminação artificial heteróloga; e (III) a prévia autorização do marido.

Verificada a concepção de filho no curso de convivência pública, contínua e duradoura, com intenção de constituição de família, viável a aplicação análoga do disposto no art. 1.597, do Código Civil, às uniões estáveis hétero e homoafetivas, em atenção à equiparação promovida pelo julgamento conjunto da ADI 4.277 e ADPF 132 pelo Supremo Tribunal Federal.

Conquanto o acompanhamento médico e de clínicas especializadas seja de extrema relevância para o planejamento da concepção por meio de técnicas de reprodução assistida, não há, no ordenamento jurídico brasileiro, vedação explícita ao registro de filiação realizada por meio de inseminação artificial “caseira”, também denominada “autoinseminação”.

Ao contrário, a interpretação do art. 1.597, V, do CC/2002, à luz dos princípios que norteiam o livre planejamento familiar e o melhor interesse da criança, indica que a inseminação artificial “caseira” é protegida pelo ordenamento jurídico brasileiro.

No caso, preenchidos, simultaneamente, todos os requisitos do art. 1.597, V, do Código Civil, presume-se a maternidade.

3.2.3.    Da DECISÃO.

É possível presumir a maternidade de mãe não biológica de criança gerada por inseminação artificial “caseira” no curso de união estável homoafetiva.

Para configurar o animus domini, requisito da usucapião, é necessário que o autor tenha a posse efetiva do bem, e não apenas a detenção.

AgInt no AREsp 2.306.673-SP, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 2/9/2024, DJe 4/9/2024. (Info STJ 830)

4.1.  Dos FATOS.

Crementino ajuizou ação de usucapião na qual visa ao reconhecimento do domínio de imóvel. Disse que morava naquela casa fazia mais de década.

Creiton, o demandado, respondeu que Crementino realmente lá morava, mas unicamente por tolerância: ele permitira que Crementino lá residisse, tratando-se de mera detenção, não posse como se dono fosse.

4.2.  Análise ESTRATÉGICA.

4.2.1.    Do DIREITO.

Código Civil:

Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.

Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.

4.2.2.    Dos FUNDAMENTOS.

O ordenamento jurídico permite a aquisição de propriedade por meio do instituto denominado de usucapião, previsto nos artigos 1238 e seguintes do Código Civil, sendo requisitos para tanto a comprovação do transcurso de determinado lapso temporal, o animus domini e a posse mansa e pacífica.

Assim, há três requisitos essenciais: lapso temporal, inexistência de oposição e animus domini.

Em relação a esse último requisito, exige-se que o autor detenha efetivamente a posse do bem, e não a mera detenção. Isso porque a detenção ou mera tolerância do proprietário no uso do bem por outrem não levam à posse apta e legítima a ensejar a declaração de usucapião (como assim se denomina de posse ad usucapionem).

Nesse sentido, leciona a doutrina que se exclui “toda posse que não se faça acompanhar da intenção de ter a coisa para si – animus rem sibi habendi, como por exemplo a posse direta do locatário, do usufrutuário, do credor pignoratício (…)”.

4.2.3.    Da DECISÃO.

Para configurar o animus domini, requisito da usucapião, é necessário que o autor tenha a posse efetiva do bem, e não apenas a detenção.

Em situações excepcionais, em que demonstrada a inviabilidade de conhecimento dos demais sócios acerca da gestão fraudulenta da sociedade pelo administrador, a regra do art. 189 do Código Civil assume viés humanizado e voltado aos interesses sociais, admitindo-se a aplicação da teoria da actio nata em sua vertente subjetiva, que adota como marco inicial do prazo prescricional o conhecimento da violação ao direito subjetivo pelo seu titular.

AgInt no REsp 1.494.347-SP, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 10/9/2024, DJe 12/9/2024. (Info STJ 830)

5.1.  Dos FATOS.

Genuíno moveu ação de dissolução parcial de sociedade seu sócio Creisson da empresa. A sentença de primeiro grau julgou procedente o pedido, excluindo o Sr. Creisson da sociedade.

Inconformado, Creisson alega que a pretensão para reconhecer a suposta irregularidade dos atos que lhes são imputados surgira na data do respectivo ato ou fato, tendo portanto corrido prescrição.

Genuíno, por sua vez, responde que apesar de a violação do direito ter data pretérita, no caso de má gestão administrativa, o prazo da inércia só pode ser contado do conhecimento das falcatruas….

5.2.  Análise ESTRATÉGICA.

5.2.1.    Do DIREITO.

Código Civil:

Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206.

Art. 206. Prescreve:

§ 3 o Em três anos:

VII – a pretensão contra as pessoas em seguida indicadas por violação da lei ou do estatuto, contado o prazo:

b) para os administradores, ou fiscais, da apresentação, aos sócios, do balanço referente ao exercício em que a violação tenha sido praticada, ou da reunião ou assembléia geral que dela deva tomar conhecimento;

5.2.2.    Dos FUNDAMENTOS.

O Superior Tribunal de Justiça adota como regra a teoria da actio nata em sua vertente objetiva, considerando a data da efetiva violação ao direito como marco inicial para a contagem do prazo prescricional.

Com efeito, em sociedades regulares, a má gestão de recursos pelos administradores atrai a aplicação do prazo trienal prescrito no art. 206, § 3º, VII, b, do Código Civil, cujo início se dá com a efetiva lesão ou violação do direito, a partir da definitividade das regras estabelecidas no estatuto social e da previsibilidade de realização das assembleias.

No caso, contudo, foi reconhecido pela instância originária que, durante a administração empresarial, não houve a apresentação do balanço relativo aos respectivos exercícios, tampouco reunião assemblear para deliberação acerca da gestão empreendida, de onde se depreende que a publicidade dos atos relativos à administração empresarial ficou sensivelmente vulnerada, circunstância que, inevitavelmente, obsta a fixação da data em que a assembleia deveria ter ocorrido como marco inicial do lapso prescricional.

Nesse contexto, a regra do art. 189 do Código Civil, assume viés humanizado e voltado aos interesses sociais, admitindo-se como marco inicial não mais o momento da ocorrência da violação do direito, mas a data do conhecimento do ato ou fato do qual decorre o direito de agir, sob pena de se punir a vítima por uma negligência que não houve, esquecendo-se o fato de que a aparente inércia pode ter decorrido da absoluta falta de conhecimento do dano.

Assim, a controvérsia atrai a aplicação da teoria da actio nata em sua vertente subjetiva, segundo a qual a fluência do prazo prescricional deve ocorrer, como regra, do conhecimento da violação da lesão ao direito subjetivo pelo seu titular e não da violação isoladamente considerada.

5.2.3.    Da DECISÃO.

Em situações excepcionais, em que demonstrada a inviabilidade de conhecimento dos demais sócios acerca da gestão fraudulenta da sociedade pelo administrador, a regra do art. 189 do Código Civil assume viés humanizado e voltado aos interesses sociais, admitindo-se a aplicação da teoria da actio nata em sua vertente subjetiva, que adota como marco inicial do prazo prescricional o conhecimento da violação ao direito subjetivo pelo seu titular.

A natureza personalíssima dos alimentos, além de seu caráter de patrimônio moral em razão de sua finalidade, torna inviável a transferência aos herdeiros em caso de morte da alimentada.

Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 9/9/2024, DJe 12/9/2024. (Info STJ 830)

6.1.  Dos FATOS.

Creosvalda recebia alimentos de seu ex-marido Tadeu. Ocorre que Creosvalda tivera um filho de outra relação após o rompimento com Tadeu. Quando Creosvalda veio a falecer, Toinho, filho e herdeiro de Creosvalda, ajuizou ação por meio da qual alega que os alimentos devidos à falecida agora seriam devidos a ele.

6.2.  Análise ESTRATÉGICA.

6.2.1.    Dos FUNDAMENTOS.

Ressalta-se, de início, que os alimentos constituem o patrimônio moral do alimentando, não integrando seu patrimônio econômico; assim, em caso de falecimento, esse montante não se transmite aos herdeiros, tendo em vista a natureza personalíssima, ainda que vencidos e não adimplidos.

De fato, a orientação do STJ é no sentido de que, na ação de execução de alimentos, não é cabível a sucessão quando sobrevém a morte do alimentando, ainda que a verba alimentar esteja vencida e não tenha sido adimplida, em virtude de sua natureza personalíssima, sob pena de desviar a sua função alimentar. No mesmo sentido, veja-se o precedente abaixo:

[…] Os alimentos integram o patrimônio moral do alimentando, e não o seu patrimônio econômico, ainda que possam ser apreciáveis economicamente. Para efeito de caracterização da natureza jurídica do direito aos alimentos, a correlata expressão econômica afigura-se in totum irrelevante, apresentando-se de modo meramente reflexo, como ocorre com os direitos da personalidade. 4. Do viés personalíssimo do direito aos alimentos, destinado a assegurar a existência do alimentário e de ninguém mais, decorre a absoluta inviabilidade de se transmiti-lo a terceiros, seja por negócio jurídico, seja por qualquer outro fato jurídico. […] (REsp 1.771.258/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 6/8/2019, DJe de 14/8/2019).

6.2.2.    Da DECISÃO.

A natureza personalíssima dos alimentos, além de seu caráter de patrimônio moral em razão de sua finalidade, torna inviável a transferência aos herdeiros em caso de morte da alimentada.

No julgamento assíncrono em ambiente eletrônico, caso o processo seja retirado da pauta (e não adiado) é obrigatória a renovação de intimação das partes, notadamente quando há determinação expressa de retirada em atendimento à solicitação de sustentação oral.

REsp 2.163.764-RJ, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 15/10/2024, DJe 17/10/2024. (Info STJ 830)

7.1.  Dos FATOS.

Dr. Juvenal, advogado, teve seu pedido atendido para que o seu recurso fosse retirado da pauta dos julgamentos assíncronos – aqueles em ambiente eletrônico no qual apenas julgadores participam. A ideia era se permitir a sustentação oral em julgamento presencial ou telepresencial. Ocorre que Dr. Juvenal não foi intimado da alteração.

O Dr. Juvena alega a nulidade do julgamento por ofensa ao devido processo legal, à ampla defesa e ao contraditório, pois se tornou inviável a realização de sustentação oral ou qualquer possibilidade de participação do julgamento cuja realização desconhecia!

7.2.  Análise ESTRATÉGICA.

7.2.1.    Dos FUNDAMENTOS.

Cinge-se a controvérsia em saber se a determinação de retirada de recurso de pauta (de julgamento assíncrono em ambiente eletrônico no qual apenas julgadores participam) – para fins de se permitir futura sustentação oral em julgamento presencial ou telepresencial – pode caracterizar cerceamento de defesa quando a parte é posteriormente surpreendida com a ocorrência do julgamento em contrariedade ao que foi determinado.

Segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, uma vez incluído processo em pauta de julgamento, seu adiamento não requer nova intimação das partes. A retirada de pauta, contudo, exige nova intimação.

A finalidade da publicação da pauta é cientificar as partes da data da apreciação colegiada do recurso, permitindo participação no julgamento com entrega de memoriais, preparação de sustentação oral ou esclarecimento de matéria de fato.

Ocorrendo retirada de processo da pauta com finalidade de atendimento a pedido de sustentação oral, afigura-se legítima a expectativa de que, uma vez definida a nova data do julgamento, seja publicada nova pauta sob pena de cerceamento da participação das parte no julgamento.

No caso, o julgamento de apelação foi inicialmente pautado para julgamento na modalidade assíncrona em ambiente eletrônico, o qual não permite qualquer participação das partes. A objeção foi acolhida para retirada do processo de pauta em atendimento ao pedido de sustentação oral. Contudo, a parte foi surpreendida com o julgamento na modalidade assíncrona apesar da determinação, violando sua expectativa legítima e confiança, no sentido de que o julgamento ocorreria em momento posterior ao originalmente previsto, estando o prejuízo caracterizado com o resultado desfavorável.

7.2.2.    Da DECISÃO.

No julgamento assíncrono em ambiente eletrônico, caso o processo seja retirado da pauta (e não adiado) é obrigatória a renovação de intimação das partes, notadamente quando há determinação expressa de retirada em atendimento à solicitação de sustentação oral.

8.     (Im)Possibilidade da substituição da penhora em dinheiro por seguro garantia judicial

É possível a substituição da penhora em dinheiro por seguro garantia judicial, observados os requisitos do art. 835, § 2º, do CPC/2015, pois trata-se de medida que produz os mesmos efeitos jurídicos que o dinheiro, seja para fins de garantir o juízo, seja para possibilitar a substituição de outro bem objeto de anterior penhora, não podendo o exequente rejeitar a indicação, salvo por insuficiência, defeito formal ou inidoneidade da salvaguarda oferecida.

TutCautAnt 672-SP, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 24/9/2024, DJe 30/9/2024. (Info STJ 830)

8.1.  Dos FATOS.

Transnordeste S.A. era ré em uma ação de cobrança multimilionária. Considerando o vulto da questão, uma penhora em dinheiro poderia inviabilizar o fluxo de caixa da empresa. Requereu então a substituição da penhora em dinheiro por seguro garantia judicial.

O juizão, contudo, estava resistente em aceitar a substituição. Como dizia o homi da toga: dinheiro é dinheiro, papel é papel, e o seguro morreu de velho.

8.2.  Análise ESTRATÉGICA.

8.2.1.    Do DIREITO.

CPC:

Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

Art. 835. A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem:

§ 2º Para fins de substituição da penhora, equiparam-se a dinheiro a fiança bancária e o seguro garantia judicial, desde que em valor não inferior ao do débito constante da inicial, acrescido de trinta por cento.

Art. 996. O recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério Público, como parte ou como fiscal da ordem jurídica.

Parágrafo único. Cumpre ao terceiro demonstrar a possibilidade de a decisão sobre a relação jurídica submetida à apreciação judicial atingir direito de que se afirme titular ou que possa discutir em juízo como substituto processual.

8.2.2.    Dos FUNDAMENTOS.

Nos termos dos arts. 300 e 996, parágrafo único, do CPC, em caso de recurso sem efeito suspensivo, a eficácia da decisão recorrida pode ser suspensa por decisão do relator, na hipótese em que houver perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso.

O art. 835, § 2º, do CPC/2015, equipara a dinheiro a fiança bancária e o seguro-garantia judicial, para fins de substituição da penhora, desde que em valor não inferior ao do débito constante da inicial, acrescido de 30% (trinta por cento).

Em relação ao referido dispositivo, há diversos julgados do STJ reconhecendo que, em que pese a lei se referir a “substituição”, que pressupõe a anterior penhora de outro bem, o seguro-garantia judicial produz os mesmos efeitos jurídicos que o dinheiro, seja para fins de garantir o juízo, seja para possibilitar a substituição de outro bem objeto de anterior penhora, não podendo o exequente rejeitar a indicação, salvo por insuficiência, defeito formal ou inidoneidade da salvaguarda oferecida. No caso de seguro-garantia judicial a idoneidade da apólice deve ser aferida mediante verificação da conformidade de suas cláusulas às normas editadas pela autoridade competente, no caso, a Superintendência de Seguros Privados – SUSEP.

Ressalta-se, também, que a simples fixação de prazo de validade determinado na apólice e a inserção de cláusula condicionando os efeitos da cobertura ao trânsito em julgado da decisão não implicam inidoneidade da garantia oferecida, pois a renovação da apólice, a princípio automática, somente não ocorrerá se não houver mais risco a ser coberto ou se apresentada nova garantia. Caso não renovada a cobertura ou se o for extemporaneamente, caraterizado estará o sinistro, de acordo com a regulamentação estabelecida pela SUSEP, abrindo-se, para o segurado, a possibilidade de execução da própria apólice em face da seguradora.

No caso, diante do fumus bonis iuris e do periculum in mora devidamente demonstrados, bem como, considerando-se que: i) o CPC, art. 835, § 2º, e a jurisprudência do STJ autorizam a substituição da penhora em dinheiro por seguro-garantia; ii) o valor dado em garantia é 30% maior que o débito executado; iii) houve a juntada de apólice de seguro garantia, com validade até 04/07/2029 e de certidão de regularidade da seguradora perante a SUSEP; iv) se está no âmbito de uma execução provisória; v) a manutenção da penhora em dinheiro, em sede de execução provisória, certamente causará ao executado onerosidade maior que a necessária, afetando a atividade empresarial diante da vultuosidade do valor penhorado, mostra-se plausível a liberação do referido valor em favor da requerente.

Ora, se o possível provimento do recurso especial ensejará o reconhecimento da inexistência de título judicial com a consequente extinção da execução provisória (que é o máximo dos efeitos), é plenamente plausível, por óbvio, a concessão de um efeito menor que é a substituição da penhora em dinheiro pelo seguro garantia.

Assim, deve ser concedido efeito suspensivo ao recurso especial ainda em curso perante o Tribunal de origem, para autorizar a substituição da penhora em dinheiro pela apólice de seguro-garantia ofertado, no valor do débito, acrescido de trinta por cento.

8.2.3.    Da DECISÃO.

É possível a substituição da penhora em dinheiro por seguro garantia judicial, observados os requisitos do art. 835, § 2º, do CPC/2015, pois trata-se de medida que produz os mesmos efeitos jurídicos que o dinheiro, seja para fins de garantir o juízo, seja para possibilitar a substituição de outro bem objeto de anterior penhora, não podendo o exequente rejeitar a indicação, salvo por insuficiência, defeito formal ou inidoneidade da salvaguarda oferecida.

A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago, restituindo-se as partes ao estado anterior e liquidando-se eventuais prejuízos nos mesmos autos, na forma do art. 520, II, do CPC/2015 (art. 475-O, II, do CPC/1973).

EDcl na Pet 12.482-DF, Rel. Ministro Afrânio Vilela, Primeira Seção, julgado em 9/10/2024, DJe 11/10/2024 (Complementação do Tema Repetitivo 692/STJ). (Info STJ 830)

9.1.  Dos FATOS.

Josefa teve benefício previdenciário negado administrativamente pelo INSS. Inconformada, ajuizou ação na qual foi determinada a concessão do benefício em antecipação de tutela. Mas não é que o pedido foi julgado improcedente ao final, e a liminar cassada?

O INSS então requereu a devolução dos valores recebidos indevidamente e nos mesmos autos.

9.2.  Análise ESTRATÉGICA.

9.2.1.    Do DIREITO.

Lei 8.213/1991:

Art. 115.  Podem ser descontados dos benefícios:

II – pagamento administrativo ou judicial de benefício previdenciário ou assistencial indevido, ou além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão judicial, em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da sua importância, nos termos do regulamento;

9.2.2.    Dos FUNDAMENTOS.

Cinge-se a controvérsia a respeito da possibilidade de complementar o entendimento firmado no tema repetitivo 692/STJ (REsp 1.401.560/MT, julgado em 12/2/2014), que continha a seguinte redação: “a reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos”.

Em 11/5/2022, no julgamento da Questão de Ordem na Pet 12.482/DF, proposta para revisar o entendimento do Tema 692/STJ, a Primeira Seção esclareceu que “a tutela de urgência não deixa de ser precária e passível de modificação ou revogação a qualquer tempo, o que implicará o retorno ao estado anterior à sua concessão“. Além disso, aduziu que a maioria dos precedentes contrários ao Tema 692/STJ não diziam respeito a lides previdenciárias e que todos seriam anteriores às alterações inseridas pela Lei 13.846/2019, no art. 115, II, da Lei 8.213/1991.

Dessa forma, a Primeira Seção decidiu por julgar a questão de ordem no sentido da reafirmação da tese jurídica contida no Tema Repetitivo 692/STJ, com acréscimo redacional para ajuste à nova legislação de regência (art. 115, II, da Lei n. 8.213/1991).

O INSS indaga, nos presentes embargos de declaração, sobre a possibilidade de cobrança dos valores pagos por força de decisão precária nos próprios autos ou em autos apartados e a necessidade de complementação da redação da tese jurídica firmada no Tema 692/STJ.

Nesse sentido, não obstante o voto proferido na Questão de Ordem na Pet 12.482/DF tenha sido claro quanto à possibilidade de liquidação nos próprios autos, quando reformada a decisão que lastreava a execução provisória, com base no art. 520, I e II, do CPC/2015 (art. 475-O, I e II, do CPC/1973), observa-se que a tese jurídica firmada não fez nenhuma referência a esse posicionamento.

Por essa razão, a fim de evitar desnecessárias controvérsias derivadas do julgamento da Questão de Ordem na Pet 12.482/DF, se faz necessária uma complementação no conteúdo da tese jurídica consagrada no Tema 692/STJ, para incluir, expressamente, a possibilidade de liquidação nos próprios autos, na forma do art. 520, I e II, do CPC/2015 (art. 475-O, I e II, do CPC/1973).

Fixa, assim, a seguinte tese jurídica: “a reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago, restituindo-se as partes ao estado anterior e liquidando-se eventuais prejuízos nos mesmos autos, na forma do art. 520, II, do CPC/2015 (art. 475- O, II, do CPC/1973)”.

9.2.3.    Da DECISÃO.

A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago, restituindo-se as partes ao estado anterior e liquidando-se eventuais prejuízos nos mesmos autos, na forma do art. 520, II, do CPC/2015 (art. 475-O, II, do CPC/1973).

O fato de a vítima, menor de 18 e maior de 14 anos de idade, atuar na prostituição e ter conhecimento dessa condição é irrelevante para a configuração do crime de favorecimento à prostituição de adolescentes (art. 218-B, § 2º, I, do Código Penal).

Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 20/8/2024, DJe 28/8/2024. (Info STJ 830)

10.1.               Dos FATOS.

Craudião atua como intermediário entre clientes e prostitutas (cafetão). Ocorre que uma das moças de seu plantel era menor de 18 anos, informação que ocultou do chefe.

O MP ficou sabendo da situação e denunciou Craudião pelo crime de crime de favorecimento à prostituição de adolescentes. A defesa alega que o desconhecimento da idade pelo acusado desconfiguraria o crime.

10.2.               Análise ESTRATÉGICA.

10.2.1. Do DIREITO.

Código Penal:

Favorecimento da prostituição ou de outra forma de exploração sexual de criança ou adolescente ou de vulnerável.

Art. 218-B.  Submeter, induzir ou atrair à prostituição ou outra forma de exploração sexual alguém menor de 18 (dezoito) anos ou que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, facilitá-la, impedir ou dificultar que a abandone:

§ 2o  Incorre nas mesmas penas:           

I – quem pratica conjunção carnal ou outro ato libidinoso com alguém menor de 18 (dezoito) e maior de 14 (catorze) anos na situação descrita no caput deste artigo;  

10.2.2. Dos FUNDAMENTOS.

O art. 218-B, § 2º, I, do Código Penal afirma que incorre nas mesmas penas de quem submete, induz ou atrai à prostituição ou outra forma de exploração sexual alguém menor de 18 anos aquele que pratica conjunção carnal ou outro ato libidinoso com pessoa menor de 18 e maior de 14 anos, critério etário, notoriamente OBJETIVO, que não dá margem para relativização quanto à vulnerabilidade da vítima, ao aferimento de seu consentimento e à sua experiência sexual anterior – argumentos esses sexistas, porquanto deslocam para a vítima a responsabilidade pela prática da violência sexual cometida pelo réu.

Autorizar esse viés argumentativo implicaria assumir, na espécie e em casos similares, a legitimidade de um escrutínio nada disfarçado das vítimas do sexo feminino de crimes sexuais e reconhecer que existe um paradigma de mulher apta ao sexo, de acordo com seu aspecto físico, de seu fenótipo, e, consequentemente, definidor de sua idade. Além disso, importaria a objetificação do corpo feminino e o reconhecimento, essencialmente, da impossibilidade da contenção da libido masculina.

Nessa linha, a orientação do Superior Tribunal de Justiça é de que o fato de a vítima, menor de 18 e maior de 14 anos de idade, atuar na prostituição e ter conhecimento dessa condição é irrelevante para a configuração do tipo penal previsto no art. 218-B, § 2º, I, do Código Penal, norteada pela regra etária.

Dessa forma, verifica-se que a Corte local concluiu corretamente pela existência dos elementos constitutivos do crime de favorecimento à prostituição de menores, pois as adolescentes praticaram atos sexuais com o acusado em troca de pagamento, fatos suficientes para a configuração do tipo penal.

10.2.3. Da DECISÃO.

O fato de a vítima, menor de 18 e maior de 14 anos de idade, atuar na prostituição e ter conhecimento dessa condição é irrelevante para a configuração do crime de favorecimento à prostituição de adolescentes (art. 218-B, § 2º, I, do Código Penal).

Compete ao Superior Tribunal de Justiça processar e julgar desembargadores, mesmo que os fatos imputados não tenham relação com o exercício do cargo, para garantir a imparcialidade.

Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 2/10/2024, DJe 8/10/2024. (Info 10) (Info STJ 830)

11.1.               Dos FATOS.

Um Desembargador de TJ foi denunciado por agredir a esposa. A agressão ocorreu na casa do casal e sem testemunhas. A defesa alega a incompetência do STJ, por entender que o caso nada teria a ver com o cargo ou função exercida, além da falta de provas somadas ao depoimento da esposa.

11.2.               Análise ESTRATÉGICA.

11.2.1. Dos FUNDAMENTOS.

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Questão de Ordem na Ação Penal n. 937/RJ, estabeleceu que o foro por prerrogativa de função deve limitar-se aos crimes praticados no cargo e em sua função, não se estendendo aos delitos praticados por autoridades, ainda que durante o exercício do cargo, mas que com ele não tenham relação alguma.

Assim, ao restabelecer o critério da contemporaneidade, o Supremo Tribunal Federal procurou manter o foro por prerrogativa de função circunscrito àquelas hipóteses em que o crime, além de ser praticado durante o exercício do cargo, tenha relação com o exercício das funções desempenhadas.

No entanto, o Superior Tribunal de Justiça passou a reconhecer que, em se tratando de delitos praticados por desembargadores, a competência se mantém no STJ, ainda que os fatos não tenham relação com o exercício do cargo, considerando que o processamento e o julgamento do feito por magistrado de primeiro grau de jurisdição vinculado ao mesmo Tribunal poderiam afetar a independência e a imparcialidade que orientam a atividade jurisdicional.

Ademais, a Corte Especial do STJ tem entendimento de que “a necessidade de que o julgador possa reunir as condições para o desempenho de suas atividades judicantes de forma imparcial não se revela como um privilégio do julgador ou do acusado, mas como uma condição para que se realize justiça criminal de forma isonômica e republicana” (QO na APn n. 878/DF, relator Ministro Benedito Gonçalves, Corte Especial, julgado em 21/11/2018, DJe 19/12/2018).

No caso, o Ministério Público Federal ofereceu denúncia contra Desembargador, imputando-lhe a prática do delito previsto no art. 129, § 9º, do Código Penal, por ofender a integridade corporal de sua então esposa, prevalecendo-se das relações domésticas.

A jurisprudência do STJ é firme no sentido de que inexiste ilegalidade no fato de a acusação referente aos delitos praticados em ambiente doméstico ou familiar estar lastreada, sobretudo, no depoimento prestado pela ofendida, pois tais ilícitos geralmente são praticados à clandestinidade, sem a presença de testemunhas, e muitas vezes não deixam rastros materiais, motivo pelo qual a palavra da vítima possui especial relevância.

Nesse contexto, da análise da inicial acusatória verifica-se que estão presentes provas da materialidade e indícios suficientes de autoria, impondo-se o recebimento da denúncia.

11.2.2. Da DECISÃO.

Compete ao Superior Tribunal de Justiça processar e julgar desembargadores, mesmo que os fatos imputados não tenham relação com o exercício do cargo, para garantir a imparcialidade. Em casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, a palavra da vítima tem especial relevância, haja vista que muitos desses casos ocorrem em situações de clandestinidade.

Verificada a atuação extra autos do magistrado que influencia no depoimento do acusado, não se pode cogitar da validade do ato, nem sequer a pretexto de ausência de prejuízo, visto que a quebra de imparcialidade do juiz gera nulidade absoluta.

Processo em segredo de justiça, Rel. Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 15/10/2024. (Info STJ 830)

12.1.               Dos FATOS.

Em um processo criminal, o magistrado responsável pela instrução realizou oitivas informais dos acusados acerca dos fatos antes da audiência em continuação. A defesa dos acusados alega a quebra de imparcialidade e necessária nulidade da condenação.

12.2.               Análise ESTRATÉGICA.

12.2.1. Do DIREITO.

Constituição Federal:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

12.2.2. Dos FUNDAMENTOS.

O Superior Tribunal de Justiça tem se manifestado acerca da relevância e do caráter fundamental das garantias inerentes ao devido processo legal, cuja envergadura vem impressa, de maneira indelével, no art. 5º, LIV, da Constituição Federal, que assegura que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.

Dentro do conjunto de garantias conferido aos litigantes, “o processo penal, além de instrumento de legitimação do poder punitivo estatal e de proteção dos bens jurídicos mais caros à sociedade, ao fixar arquétipos normativos rígidos, constitui significativo meio de limitação do arbítrio estatal e de salvaguarda dos direitos fundamentais dos investigados, acusados e réus.” (STF, RE 1.301.250-RJ, relatora Ministra Rosa Weber).

No caso, o Tribunal de origem entendeu não ter havido nulidade pelo motivo de o magistrado responsável pela instrução realizar oitivas informais dos acusados acerca dos fatos antes da audiência em continuação.

Contudo, tal entendimento vai de encontro ao que vem sendo decidido por esta Corte Superior. Acerca da confissão informal, mutatis mutandis, vale lembrar que recentemente a Terceira Seção do STJ firmou a seguinte tese: “11.1: A confissão extrajudicial somente será admissível no processo judicial se feita formalmente e de maneira documentada, dentro de um estabelecimento estatal público e oficial. Tais garantias não podem ser renunciadas pelo interrogado e, se alguma delas não for cumprida, a prova será inadmissível. A inadmissibilidade permanece mesmo que a acusação tente introduzir a confissão extrajudicial no processo por outros meios de prova (como, por exemplo, o testemunho do policial que a colheu)…” (AREsp 2.123.334-MG, Ministro Ribeiro Dantas, Terceira Seção, DJe 2/7/2024).

Ou seja, se a confissão informal já merece profundo escrutínio quando suscitada em fase extrajudicial e para acusado maior de idade, com maior razão há de se acautelar em garantia do devido processo legal quando tais diálogos informais são travados pelo magistrado que preside o ato e com menor acusado de ato infracional.

Na situação em análise, apurado que o magistrado responsável por presidir a audiência em continuação, onde as provas judiciais orais seriam colhidas sob contraditório, atuou de maneira direta e fora da solenidade, “no corredor” das dependências do fórum, tendo mencionado tal fato a pretexto de influenciar no depoimento da parte já durante a audiência, observa-se flagrante descumprimento dos deveres de prudência, imparcialidade e transparência, a indicar a nulidade do ato.

Portanto, verificada a atuação extra autos do magistrado que influenciou no depoimento do adolescente infrator, não se pode cogitar da validade do ato, nem sequer a pretexto de ausência de prejuízo, uma vez que o entendimento pacífico do STJ é no sentido de que quebra de imparcialidade do magistrado é causa de nulidade absoluta.

12.2.3. Da DECISÃO.

Verificada a atuação extra autos do magistrado que influencia no depoimento do acusado, não se pode cogitar da validade do ato, nem sequer a pretexto de ausência de prejuízo, visto que a quebra de imparcialidade do juiz gera nulidade absoluta.

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Créditos:

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