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Vamos concluir o Informativo nº 844 do STJ COMENTADOcom sua Parte 2!
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1. Prescrição Intercorrente: Inércia do Credor e Extinção da Execução
Indexador
Disciplina: Direito Processual Civil
Capítulo: Execução
Área
Magistratura
Ministério Público
Procuradorias
Destaque
A prescrição intercorrente aplica-se nos casos em que o credor, sem justificativa válida, deixa de promover os atos necessários ao prosseguimento da execução no prazo previsto em lei.
EDcl no REsp 1.918.602-SP, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 17/2/2025, DJEN 12/3/2025.
Conteúdo-Base
???? O art. 921, § 5º, do Código de Processo Civil prevê a possibilidade de reconhecimento da prescrição intercorrente na execução quando caracterizada a inércia prolongada do credor sem justa causa.
???? A Súmula nº 150/STF fixa prazo de três anos para prescrição intercorrente em execuções de notas promissórias, aplicando-se à espécie julgada.
???? A inatividade processual do credor, sem justificação válida, conduz à extinção da execução por prescrição intercorrente, em prol da segurança jurídica.
???? O reconhecimento da prescrição intercorrente pode ocorrer de ofício pelo magistrado, dada sua natureza de ordem pública.
???? Não cabe a imposição de ônus sucumbenciais se não demonstrada conduta culposa ou dolosa do credor.
Discussão e Tese
???? A controvérsia versou sobre a incidência da prescrição intercorrente diante da inércia do credor em promover atos executivos necessários por período superior ao prazo prescricional.
⚖️ Para o STJ:
• A ausência de diligência necessária ao prosseguimento justifica o reconhecimento da prescrição intercorrente.
• A prescrição intercorrente promove a segurança jurídica e evita perpetuação indefinida de demandas sem impulso processual válido.
Como será Cobrado em Prova
???? A prescrição intercorrente pode ser reconhecida de ofício pelo juiz quando o credor permanecer inerte sem justificativa válida por prazo superior ao previsto em lei.
✅ Correto. O STJ reconheceu a prescrição intercorrente por inércia injustificada do credor.
???? É obrigatória a imposição de ônus sucumbenciais ao credor em casos de reconhecimento de prescrição intercorrente.
❌ Errado. O STJ determina que, na ausência de má-fé ou culpa demonstrada do credor, não cabe a imposição automática de ônus sucumbenciais.
Versão Esquematizada
???? Prescrição Intercorrente na Execução |
???? Credor deve promover regularmente atos executivos. ???? Inércia injustificada configura prescrição intercorrente. ???? Magistrado pode reconhecer de ofício. ???? Não há ônus sucumbencial automático sem culpa ou dolo do credor. |
Inteiro Teor
A controvérsia versa em analisar se a ausência de justificativa válida para a inércia do credor compromete o prosseguimento da execução, à luz dos princípios da segurança jurídica e da efetividade processual.
No caso concreto, a decisão analisou o longo período de inércia do credor, destacando que, entre os atos processuais relevantes – o registro da penhora em 2011 e o pedido de desconsideração inversa da personalidade jurídica em 2015 -, decorreu o prazo prescricional de três anos previsto na Súmula n. 150 do STF e na Lei Uniforme de Genebra para notas promissórias.
Em razão disso, a prescrição intercorrente foi reconhecida com fundamento em sua natureza de ordem pública, o que possibilita, inclusive, o reconhecimento ex officio.
Tal conclusão decorreu da análise objetiva da inércia do credor, aplicando os princípios que norteiam o processo executivo e em perfeito alinhamento com os precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e com a legislação aplicável.
Além disso, foi observado que o credor não apresentou justificativa válida para a inatividade processual durante esse período, evidenciando a ausência de diligência necessária para o prosseguimento da execução.
Logo, a decisão que reconheceu a prescrição intercorrente no caso concreto aplicou corretamente os princípios da segurança jurídica e da efetividade processual, evitando a perpetuação de litígios inertes e promovendo a estabilidade das relações jurídicas.
Ademais, a decisão determinou a extinção da execução sem ônus às partes, fundamentando-se na boa-fé processual e na ausência de resistência injustificada do credor em relação à prescrição intercorrente.
Este entendimento está em conformidade com o art. 921, § 5º, do Código de Processo Civil (CPC), na redação dada pela Lei n. 14.195/2021, que prevê a extinção sem custos em hipóteses de prescrição intercorrente, pois não foi identificada conduta culposa ou dolosa do credor que justificasse a aplicação de ônus sucumbenciais em favor da parte contrária, de modo que a decisão respeitou o equilíbrio entre os princípios da causalidade e da ausência de culpa das partes.
2. Suspeição por fato superveniente
Indexador
Disciplina: Direito Processual Civil
Capítulo: Magistrados
Item: Suspeição e Impedimento
Área
Magistratura
Ministério Público
Procuradorias
Destaque
O magistrado que se declara suspeito por motivo superveniente pode requerer o cancelamento de seu voto desde que o faça antes de concluído o julgamento com a proclamação do resultado.
REsp 2.072.667-PE, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 11/3/2025.
Conteúdo-Base
???? O § 1º do art. 941 do CPC/2015 permite a alteração do voto do magistrado até o momento da proclamação do resultado pelo presidente do julgamento, salvo o voto de juiz já afastado ou substituído.
???? O caso analisado pelo STJ envolve desembargador que proferiu voto acompanhando o relator e posteriormente declarou suspeição superveniente por foro íntimo, antes do encerramento do julgamento.
???? O pedido de cancelamento do voto ocorreu enquanto o julgamento ainda estava em curso, o que possibilita sua exclusão do processo decisório sem prejuízo ao julgamento colegiado.
???? O STJ já afirmou que a suspeição por motivo superveniente não produz efeitos retroativos nem gera nulidade dos atos já praticados, mas pode justificar o cancelamento do voto se solicitado tempestivamente pelo próprio prolator.
Discussão e Tese
???? A controvérsia analisada consistiu em saber se é possível ao magistrado solicitar o cancelamento de voto proferido antes do final do julgamento, em razão da declaração de suspeição superveniente.
⚖️ Para o STJ:
• O cancelamento do voto é possível antes da proclamação final do resultado;
• A declaração superveniente de suspeição autoriza o cancelamento do voto pelo próprio magistrado;
• O julgamento deve prosseguir com a substituição do magistrado.
Como será Cobrado em Prova
???? É possível ao magistrado solicitar o cancelamento de seu voto antes da conclusão do julgamento quando ocorrer suspeição por motivo superveniente.
✅ Correto. Esse é o entendimento adotado pelo STJ com base no art. 941, § 1º, do CPC.
???? O magistrado só pode se declarar suspeito antes de proferir voto.
❌ Errado. A jurisprudência permite que o magistrado solicite o cancelamento antes do término do julgamento.
Versão Esquematizada
???? Suspeição Superveniente e Cancelamento de Voto |
???? Cancelamento permitido antes da proclamação final do julgamento. ???? Suspeição superveniente autoriza o magistrado a cancelar o voto. ???? Não há efeitos retroativos da declaração de suspeição. ???? Princípio do juiz natural mantido com a substituição do magistrado suspeito. |
Inteiro Teor
O Código de Processo Civil de 2015 estabelece, no § 1º do art. 941, regra expressa a respeito da modificação de voto nos julgamentos colegiados, fixando limitação de ordem temporal e subjetiva para tanto: “o voto poderá ser alterado até o momento da proclamação do resultado pelo presidente, salvo aquele já proferido por juiz afastado ou substituído”.
Na hipótese, o Desembargador havia proferido seu voto em sessão de julgamento, acompanhando o relator, que negava provimento ao recurso, seguindo-se pedido de vista do desembargador presidente. Todavia, na sessão seguinte, pediu que fosse anotada sua suspeição por questão de foro íntimo, tendo esclarecido tratar-se de suspeição por fato superveniente; e requereu fosse anulado seu voto.
Tal fato ensejou a renovação do julgamento para permitir a leitura do relatório e voto perante o novo integrante convocado para compor o colegiado, oportunidade em que o relator modificou seu entendimento anterior para dar provimento ao recurso, sendo acompanhado pelo novo integrante. Houve pedido de vista do presidente, que abriu divergência, negando provimento ao agravo de instrumento.
O Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou no sentido de que a suspeição decorrente de fato superveniente não tem efeitos retroativos, deixando de acarretar a nulidade dos atos anteriormente praticados.
Isso não significa, contudo, não possa o magistrado que se declara suspeito por motivo superveniente requerer o cancelamento de seu voto antes de concluído o julgamento com a proclamação do resultado.
No presente caso, o cancelamento do voto foi solicitado pelo próprio prolator e quando ainda em curso o julgamento. Da mesma forma, não há falar em comprometimento do princípio do juiz natural.
3. Técnica de Julgamento Ampliado em Agravo de Instrumento na Liquidação de Sentença
Indexador
Disciplina: Direito Processual Civil
Capítulo: Recursos
Área
Magistratura
Ministério Público
Defensoria Pública
Procuradorias
Destaque
A técnica de julgamento ampliado prevista no art. 942, § 3º, II, do CPC aplica-se ao agravo de instrumento em fase de liquidação de sentença quando o acórdão valida, por decisão não unânime, os cálculos apresentados pelo credor (quantum debeatur).
REsp 2.072.667-PE, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 11/3/2025.
Conteúdo-Base
???? Conforme o art. 942, § 3º, II, do CPC, a técnica de julgamento ampliado cabe nos agravos que reformam decisão parcial de mérito.
???? A definição do quantum debeatur tem natureza integrativa da sentença de mérito, justificando o julgamento ampliado.
???? A decisão que valida cálculos na liquidação constitui julgamento meritório, sujeitando-se à ampliação quando houver divergência no colegiado.
Discussão e Tese
???? O debate foi sobre a aplicação da técnica de julgamento ampliado ao agravo de instrumento em fase de liquidação, especificamente quanto à validação dos cálculos.
⚖️ Para o STJ:
• A definição do quantum debeatur integra o mérito, ensejando a aplicação da técnica de julgamento ampliado se não houver unanimidade.
• Decisões dessa natureza fazem coisa julgada material, justificando a ampliação em caso de divergência.
Como será Cobrado em Prova
???? O julgamento ampliado somente é aplicável em fase de conhecimento, sendo vedado em liquidação de sentença.
❌ Errado. A jurisprudência do STJ permite expressamente sua aplicação na fase de liquidação quando houver validação dos cálculos com decisão não unânime.
???? A técnica de julgamento ampliado aplica-se ao agravo de instrumento não unânime que, em liquidação, valide os cálculos do credor.
✅ Correto. A decisão em liquidação de sentença que valida cálculos integra o mérito e justifica o julgamento ampliado em caso de não unanimidade.
Versão Esquematizada
???? Técnica de Julgamento Ampliado no Agravo |
???? Aplicação na liquidação de sentença (cálculos) ???? Decisão não unânime integrativa do mérito ???? Validação dos cálculos: conteúdo meritório ???? Art. 942, § 3º, II, CPC |
Inteiro Teor
A técnica do julgamento ampliado somente se aplica ao agravo de instrumento quando houver reforma de decisão que julgar parcialmente o mérito (art. 942, § 3º, II, do Código de Processo Civil de 2015).
A definição do quantum debeatur tem caráter integrativo da sentença proferida na fase de conhecimento, possuindo, portanto, a mesma natureza desta. Na liquidação de sentença, seja ela por arbitramento, por artigos ou por cálculos, o juiz decide parte da lide ainda não decidida, ou seja, profere decisão com conteúdo meritório e que fará coisa julgada material.
Dessa forma, o acórdão prolatado em agravo de instrumento que, aplicando a presunção de que trata o art. 475-B, § 2º, do Código de Processo Civil de 1973, valida os cálculos apresentados pela parte credora tem conteúdo meritório e enseja a aplicação da técnica do julgamento ampliado.
Indexador
Disciplina: Direito Processual Penal
Capítulo: Tribunal do Júri
Área
Magistratura
Ministério Público
Defensoria Pública
Carreiras Policiais
Destaque
É excepcionalmente possível a condenação no Tribunal do Júri com base em testemunhos indiretos quando comprovado que o temor provocado pelo denunciado na comunidade impede a colheita de depoimentos oculares, especialmente em contexto de tráfico de drogas.
AgRg no REsp 2.192.889-MG, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 18/3/2025.
Conteúdo-Base
???? O STJ normalmente entende que testemunho indireto (hearsay testimony) não basta para fundamentar condenação.
???? O medo generalizado da comunidade pode justificar a ausência de testemunhas presenciais.
???? A jurisprudência admite distinguishing quando há prova de represálias ou intimidações.
???? O caso envolvia contexto de tráfico, com ameaças, agressões e omissão de testemunhos por temor.
Discussão e Tese
???? A tese discutida foi se é possível admitir como suficiente a prova testemunhal indireta no Tribunal do Júri quando há temor coletivo decorrente da atuação do denunciado no tráfico.
⚖️ Para o STJ:
• A exceção se justifica pela impossibilidade real de colher depoimentos presenciais, desde que demonstrada a intimidação da comunidade.
• O distinguishing preserva a soberania dos veredictos sem abrir mão da legalidade e da racionalidade probatória.
Como será Cobrado em Prova
???? O STJ admite, como regra, a condenação no Tribunal do Júri com base exclusiva em testemunho indireto, desde que dotada de alta credibilidade.
❌ Errado. O testemunho indireto isolado não é suficiente, salvo em hipóteses excepcionais com prova do temor coletivo.
???? Quando há temor generalizado causado pelo réu, comprovadamente envolvido com o tráfico, o STJ admite a condenação no júri mesmo sem testemunhas oculares do crime.
✅ Correto. O Tribunal reconheceu a excepcionalidade da situação diante das provas de intimidação e contexto de violência.
Versão Esquematizada
???? Testemunho Indireto no Tribunal do Júri |
???? Regra: insuficiência para condenação ???? Exceção: intimidação coletiva em contexto de tráfico ???? Depoimentos indiretos corroborados por medo e ameaças ???? Distinguishing aplicado pelo STJ em situações excepcionais |
Inteiro Teor
A quebra da soberania dos veredictos é apenas admitida em hipóteses excepcionais, em que a decisão do Júri for manifestamente dissociada do contexto probatório, hipótese em que o Tribunal de Justiça está autorizado a determinar novo julgamento. E, manifestamente contrária à prova dos autos é a decisão que não encontra amparo nas provas produzidas, destoando, desse modo, inquestionavelmente, de todo o acervo probatório.
Segundo entendimento do STJ, o testemunho de “ouvir dizer” ou hearsay testimony não é suficiente para fundamentar a condenação. É que “o testemunho indireto (também conhecido como testemunho de “ouvir dizer” ou hearsay testimony) não é apto para comprovar a ocorrência de nenhum elemento do crime e, por conseguinte, não serve para fundamentar a condenação do réu. Sua utilidade deve se restringir a apenas indicar ao juízo testemunhas referidas para posterior ouvida na instrução processual, na forma do art. 209, § 1º, do CPP.” (AREsp 1.940.381/AL, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 16/12/2021).
Contudo, no caso, apesar de nenhuma testemunha ocular ter sido ouvida perante o juízo, verifica-se que todas as pessoas da comunidade tinham medo dos envolvidos. A testemunha velada, em sessão plenária, registrou ter recebido ameaças pela sua condição; o genitor da vítima informou que uma senhora lhe relatou que seu filho viu o momento da execução, mas que não o permitiu testemunhar, acrescentando que várias pessoas no local foram agredidas para não prestarem testemunho; a genitora do ofendido esclareceu que várias pessoas presenciaram o delito, tendo sido algumas ameaçadas no bairro a não prestar depoimento, e outras agredidas.
Note-se que a autoria do crime foi indicada por diversos populares, que não prestaram depoimento devido ao medo de represálias. Essas informações foram comunicadas ao primeiro policial que chegou à cena do crime e aos pais da vítima. Como é de conhecimento geral, em crimes envolvendo conflitos com o tráfico de drogas, o receio de represálias dificulta a obtenção de informações de possíveis testemunhas oculares, algo confirmado pelos depoimentos das testemunhas veladas e pelas contundentes declarações dos pais da vítima.
Portanto, embora a jurisprudência do STJ considere insuficiente o testemunho indireto para fundamentar a condenação pelo Tribunal do Júri, excepcionalmente, a especificidade do caso, em que a comunidade teme os acusados, envolvidos com o tráfico de drogas, com atuação habitual na região, razão pela qual as pessoas que presenciaram o crime não se dispuseram a testemunhar perante as autoridades policiais e judiciais, merece um distinguishing.
5. Vedação ao Acesso a Registros Criminais da Vítima e Revitimização
Indexador
Disciplina: Direito Processual Penal
Capítulo: Provas
Área
Magistratura
Ministério Público
Defensoria Pública
Destaque
É vedado o acesso a registros criminais da vítima com o objetivo de desqualificar seu testemunho, por configurar revitimização secundária e violência institucional, conforme o art. 474-A do CPP.
AgRg no HC 953.647-SP, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 26/2/2025, DJEN 7/3/2025.
Conteúdo-Base
???? O art. 474-A do CPP, incluído pela Lei n. 14.245/2021, proíbe o uso de informações que atentem contra a dignidade da vítima.
???? A tentativa de desqualificação da vítima com base em registros criminais viola a dignidade e configura violência institucional.
???? A plenitude de defesa no júri não autoriza práticas que contrariem normas protetivas da vítima.
???? O indeferimento da prova não configura cerceamento de defesa quando visa impedir revitimização.
Discussão e Tese
???? O debate centrou-se na possibilidade de acesso, pela defesa, ao histórico criminal da vítima para comprometer sua credibilidade no Tribunal do Júri.
⚖️ Para o STJ:
• A proteção à vítima impõe limites à produção probatória, sobretudo se baseada em estigmas e estereótipos.
• A plenitude de defesa não autoriza práticas violadoras da dignidade humana ou contrárias ao ordenamento jurídico.
Como será Cobrado em Prova
???? A vedação à revitimização secundária impede o acesso a registros criminais da vítima com o objetivo de enfraquecer seu testemunho.
✅ Correto. O STJ reconhece a prática como violência institucional vedada pelo art. 474-A do CPP.
???? A plenitude de defesa no Tribunal do Júri autoriza o uso de antecedentes criminais da vítima como estratégia legítima de argumentação.
❌ Errado. O STJ reafirma que tal conduta viola normas protetivas da vítima e não encontra amparo constitucional.
Versão Esquematizada
???? Prova e Revitimização |
???? Vedação à exposição vexatória da vítima ???? Art. 474-A do CPP: proteção da dignidade ???? Defesa não pode usar registros da vítima para desqualificação ???? Produção probatória limitada por direitos fundamentais |
Inteiro Teor
A questão em discussão consiste em saber se o indeferimento do pedido de acesso aos registros criminais da vítima configura cerceamento de defesa, especialmente no contexto do Tribunal do Júri.
Inicialmente, frise-se que o poder conferido ao magistrado para conduzir o processo e realizar o juízo de admissibilidade das provas encontra respaldo não apenas no art. 251 do Código de Processo Penal, mas decorre da própria função jurisdicional e do poder geral de cautela que lhe é inerente.
A pretensão de vasculhar o histórico criminal e os boletins de ocorrência da ofendida revela nítida tentativa de desqualificação de seu testemunho com base em circunstâncias alheias ao caso concreto. Embora se sustente que não pretende promover um “espetáculo vexatório”, a estratégia defensiva escolhida configura evidente hipótese de revitimização secundária.
O ordenamento jurídico brasileiro, em sua evolução legislativa recente, tem se orientado justamente no sentido oposto, buscando coibir práticas que perpetuem a violência institucional contra vítimas de crimes. Nesse contexto, merece destaque a Lei n. 14.245/2021, que introduziu o art. 474-A no Código de Processo Penal, estabelecendo verdadeira regra de conduta ao magistrado.
O referido dispositivo veda expressamente a utilização de informações relacionadas à pessoa ofendida que possam malferir sua dignidade. Tal inovação normativa representa significativo avanço civilizatório, refletindo a compreensão de que o processo penal não pode ser instrumentalizado como meio de perpetuação da violência já experimentada.
O argumento de que o procedimento do Tribunal do Júri demandaria maior flexibilidade na produção probatória tampouco se sustenta. Isso porque, a plenitude de defesa, princípio basilar do procedimento escalonado do júri, não autoriza práticas proscritas pelo ordenamento jurídico, como a violência institucional expressamente vedada pelo art. 15-A da Lei n. 13.869/2019 (incluído pela Lei n. 14.321/2022).
Ademais, a análise do caso sob a perspectiva de gênero, conforme orientação do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça, revela que a pretensão defensiva poderia reforçar estereótipos e assimetrias historicamente utilizados para desqualificar a palavra feminina no âmbito do sistema de justiça criminal.
É importante ressaltar que tal compreensão não implica qualquer mitigação do direito à ampla defesa ou à presunção de inocência do acusado. Trata-se, em verdade, de adequar a atividade probatória aos limites estabelecidos pela legislação processual penal, interpretada em consonância com os compromissos constitucionais e convencionais assumidos pelo Estado Brasileiro na proteção dos direitos humanos das mulheres.
6. Medida de Segurança em Sentença Absolutória Imprópria e Duração Indeterminada
Indexador
Disciplina: Direito Penal
Capítulo: Medidas de Segurança
Área
Magistratura
Ministério Público
Defensoria Pública
Destaque
A medida de segurança imposta em sentença absolutória imprópria não se limita ao tempo da pena abstratamente cominada, devendo ser mantida enquanto não cessada a periculosidade do agente.
HC 894.787-SP, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 26/2/2025, DJEN 10/3/2025.
Conteúdo-Base
???? O art. 97, § 1º, do Código Penal prevê que a medida de segurança dura enquanto não cessar a periculosidade do inimputável.
???? A Súmula 527/STJ limita a duração apenas quando a medida substitui pena corporal, o que não se aplica à sentença absolutória imprópria.
???? Nesses casos, não há pena privativa de liberdade para servir de parâmetro de tempo.
???? Aplica-se o princípio do in dubio pro societate para preservação da ordem pública quando não comprovada a cessação da periculosidade.
Discussão e Tese
???? A discussão envolveu a possibilidade de limitar temporalmente a medida de segurança imposta a inimputável absolvido impropriamente.
⚖️ Para o STJ:
• Não há limitação temporal se a medida não substitui pena corporal.
• A cessação da periculosidade deve ser comprovada por laudo, sendo a dúvida resolvida em favor da coletividade.
Como será Cobrado em Prova
???? A medida de segurança aplicada a inimputável em sentença absolutória imprópria deve cessar após o prazo da pena abstratamente cominada.
❌ Errado. O STJ entende que, nesse caso, a duração independe da pena abstrata e exige cessação comprovada da periculosidade.
???? A manutenção da medida de segurança imposta a inimputável depende de avaliação pericial que ateste a cessação da periculosidade.
❌ Errado. O art. 97, § 1º, do CP condiciona a desinternação à demonstração inequívoca de não periculosidade.
Versão Esquematizada
???? Medida de Segurança e Sentença Absolutória Imprópria |
???? Não há pena de referência: inaplicável a Súmula 527 ???? Duração depende da cessação da periculosidade ???? Necessidade de laudo pericial ???? In dubio pro societate justifica manutenção |
Inteiro Teor
A questão em discussão consiste em saber se a medida de segurança aplicada ao paciente deve ser limitada ao tempo máximo da pena abstratamente cominada ao delito, conforme a Súmula 527 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ou se deve ser mantida enquanto não cessada a periculosidade do agente, nos termos do art. 97, § 1º, do Código Penal (CP).
A jurisprudência do STJ consolidou-se no sentido de que, quando a medida de segurança é aplicada em substituição à pena corporal, no curso da execução penal, sua duração deve ser limitada ao tempo restante da pena privativa de liberdade imposta na sentença condenatória original, nos termos do art. 183 da Lei de Execução Penal (LEP).
No entanto, a medida de segurança não foi imposta em substituição à pena privativa de liberdade previamente aplicada, mas sim na SENTENÇA ABSOLUTÓRIA IMPRÓPRIA, dada a inimputabilidade do paciente. Assim, a hipótese não se subsume ao enunciado da Súmula 527 do STJ, pois não há pena privativa de liberdade a ser utilizada como referência para a duração da medida de segurança.
Ademais, o art. 97, § 1º, do Código Penal estabelece que a medida de segurança será mantida enquanto não for averiguada a cessação da periculosidade do agente.
Dessa forma, a jurisprudência do STJ entende que a cessação da periculosidade é condição essencial para a desinternação de paciente inimputável, sendo necessário que tal condição seja demonstrada de forma inequívoca e segura.
Em casos de dúvida, aplica-se o princípio do in dubio pro societate, que orienta a manutenção da medida de segurança em prol da segurança pública (HC 878.047/SP, Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 10/12/2024, DJEN 17/12/2024).
7. Busca Domiciliar e Depoimento Policial: Dropsy Testimony e Necessidade de Especial Escrutínio
Indexador
Disciplina: Direito Processual Penal
Capítulo: Provas
Área
Magistratura
Ministério Público
Defensoria Pública
Destaque
Diante da possibilidade de manipulação narrativa para legitimar diligência policial, deve-se exercer especial escrutínio sobre o depoimento policial em casos de ingresso forçado em domicílio sem mandado, sobretudo na ausência de elementos objetivos de corroboração.
HC 768.440-SP, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 20/8/2024, DJe 29/8/2024.
Conteúdo-Base
???? O ingresso em domicílio sem mandado exige fundadas razões justificadas a posteriori (Tema 280/STF).
???? A prática do dropsy testimony configura alteração sistemática da narrativa policial para legitimar buscas.
???? O depoimento policial isolado deve ser submetido a análise rigorosa de coerência, verossimilhança e confronto com os autos.
???? A ausência de bodycams e contradições entre depoimentos fragilizam a versão acusatória.
Discussão e Tese
???? A tese debatida foi a validade da prova obtida mediante busca domiciliar não autorizada, com base exclusivamente no relato dos policiais, em contexto de contradições e antecedentes de abuso.
⚖️ Para o STJ:
• Não se pode atribuir presunção absoluta de veracidade ao depoimento policial.
• Em contextos de abusos, sem corroboração externa, o depoimento exige escrutínio reforçado para preservar direitos fundamentais.
Como será Cobrado em Prova
???? A jurisprudência do STJ confere presunção de veracidade ao depoimento policial, mesmo quando contraditório, em casos de flagrante domiciliar.
❌ Errado. O STJ determina análise crítica e especial escrutínio sobre depoimentos policiais isolados e contraditórios.
???? A busca domiciliar sem mandado deve ser acompanhada de elementos objetivos que justifiquem a medida, não bastando narrativa inverossímil dos agentes.
✅ Correto. O STJ reconhece que o depoimento policial deve ser corroborado e analisado sob parâmetros rigorosos, sob pena de nulidade.
Versão Esquematizada
???? Busca Domiciliar e Depoimento Policial |
???? Ingresso exige fundadas razões e justificação posterior ???? Dropsy testimony e testilying: manipulação da narrativa ???? Depoimento policial isolado não basta ???? Relevância da corroboração objetiva e bodycams ???? Especial escrutínio sobre a verossimilhança dos relatos |
Inteiro Teor
O caso sob exame traz a lume antiga discussão sobre a legitimidade do procedimento policial que, depois do ingresso no interior da residência de determinado indivíduo, sem autorização judicial, logra encontrar e apreender drogas – de sorte a configurar a suposta prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 -, cujo caráter permanente autorizaria, segundo ultrapassada linha de pensamento, o ingresso domiciliar.
O Plenário do Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE n. 603.616/RO, com repercussão geral previamente reconhecida (Tema STF n. 280), assentou que “a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade dos atos praticados” (Rel. Ministro Gilmar Mendes, DJe 8/10/2010).
Depois do julgamento do Supremo, o Superior Tribunal de Justiça, imbuído da sua missão constitucional de interpretar a legislação federal, passou – sobretudo a partir do REsp n. 1.574.681/RS (Rel. Ministro Rogerio Schietti, DJe 30/5/2017) – a tentar dar concretude à expressão “fundadas razões”, por se tratar de expressão extraída pelo STF do art. 240, § 1º, do CPP. Assim, dentro dos limites definidos pela Carta Magna e pelo Supremo Tribunal Federal, esta Corte vem empreendendo esforços para interpretar o art. 240, § 1º, do CPP e, em cada caso, decidir sobre a existência prévia (ou não) de elementos prévios e concretos que amparem a diligência policial e configurem fundadas razões quanto à prática de crime no interior do imóvel.
Tomando como experiência estrangeira sobre a temática em julgamento, vale mencionar que, nos Estados Unidos da América, depois do julgamento do caso Mapp v. Ohio (1961) – no qual a Suprema Corte expandiu a regra de exclusão das provas ilícitas (exclusionary rule) aos tribunais estaduais -, observou-se que, em muitas ocasiões, em vez de adequar sua conduta para respeitar as regras sobre a legalidade de medidas invasivas, a polícia passou a burlar a proibição por meio da alteração das narrativas sobre as prisões. Por exemplo, o que antes era uma justificativa pouco comum começou a ser frequente nos depoimentos policiais: ao avistar a guarnição, o indivíduo supostamente haveria corrido e dispensado uma sacola com drogas, circunstâncias que tornavam a apreensão das substâncias válida.
Em um estudo empírico que analisou quase quatro mil autos de prisão em flagrante no distrito de Manhattan no período de seis meses antes e seis meses depois do julgamento do caso Mapp, constatou-se um aumento de até 85,5% desse tipo de descrição da ocorrência, fenômeno comportamental que ficou conhecido como dropsy testimony, em razão do verbo to drop (soltar/largar).
Outro estudo realizado na cidade de Nova Iorque em período similar chegou a resultados parecidos e concluiu que “Mudanças suspeitas nos dados de prisões após o julgamento do caso Mapp indicam claramente que muitas alegações policiais foram alteradas para se adequarem aos requisitos de Mapp”.
O dropsy testimony, naquele país, foi visto como parte de um fenômeno mais amplo, conhecido como testilying, mistura do verbo testify (testemunhar) com lying (mentindo), prática associada à conduta de distorcer os fatos em juízo para tentar legitimar uma ação policial ilegal, como, por exemplo, “fabricar” a justa causa para uma medida invasiva. No cenário brasileiro, esse fenômeno é conhecido, no jargão policial, por “arredondar a ocorrência”, ou seja, “tornar transparente uma situação embaraçosa”.
É o que frequentemente se vê, por exemplo, nos casos em que se alega de maneira absolutamente inverossímil que o réu, depois de abordado e revistado em via pública, sem nenhum objeto ilícito, milagrosamente convidou o policial para ir até a sua casa e consentiu com a realização de uma busca que resulta na apreensão de quilos de drogas que lhe custarão anos na prisão.
O cenário descrito traz de volta à tona a discussão sobre o valor probatório do testemunho policial, meio de prova admitido e ainda visto como relevante por esta Corte, mas que gradativamente vem sofrendo importantes relativizações, sobretudo em contextos nos quais a narrativa dos agentes se mostra claramente inverossímil.
Reforça-se, nessa conjuntura, a importância da corroboração do depoimento policial por outros elementos independentes, cujo principal e mais confiável exemplo é a filmagem por meio de câmeras corporais, na linha do que já se externou em outros julgamentos desta Corte.
Também nos EUA, aliás, essa “regra de corroboração” (corroboration rule) é apontada como uma das principais formas de enfrentar os fenômenos dropsy e testilying.
Enquanto não se atinge o patamar ideal, em que todas as polícias do Brasil estejam equipadas com bodycams em tempo integral, diante da possibilidade de que se criem discursos ou narrativas dos fatos para legitimar a diligência policial, deve-se, no mínimo, exigir que se exerça um “especial escrutínio” sobre o depoimento policial, na linha do que propôs o Ministro Gilmar Mendes, por ocasião do julgamento do Tema de Repercussão Geral n. 280: “O policial pode invocar o próprio testemunho para justificar a medida. Claro que o ingresso forçado baseado em fatos presenciados pelo próprio policial que realiza a busca coloca o agente público em uma posição de grande poder e, por isso mesmo, deve merecer especial escrutínio”.
Trata-se, portanto, de abandonar a cômoda e antiga prática de atribuir caráter quase inquestionável a depoimentos prestados por testemunhas policiais, como se fossem absolutamente imunes à possibilidade de desviar-se da verdade; do contrário, deve-se submetê-los a cuidadosa análise de coerência – interna e externa -, verossimilhança e consonância com as demais provas dos autos, conforme decidido pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça no HC n. 877.943/MS (Rel. Ministro Rogerio Schietti, DJe 14/5/2024).
Para isso, é fundamental repensar práticas usuais e inadequadas que dificultam o exercício desse especial escrutínio sobre o testemunho policial. Uma delas é o frequente “copia e cola” dos depoimentos dos agentes no inquérito, o qual sugere que ou eles foram ouvidos juntos – em violação da incomunicabilidade das testemunhas – ou apenas um deles foi ouvido – do que decorre a falsidade do segundo termo de depoimento.
Outro expediente a ser repelido é a leitura integral do boletim de ocorrência para os policiais em juízo a fim de que apenas confirmem o seu teor, prática que gera induzimento da resposta (art. 212, caput, do CPP), burla indevidamente a vedação a que a testemunha traga suas declarações por escrito (art. 204, caput, do CPP) e configura verdadeiro simulacro de depoimento, o que deve ser substituído por um relato inicial livre e espontâneo do agente sobre os fatos, de modo a permitir um exame efetivo da narrativa apresentada sob o crivo do contraditório.
Isso não significa, naturalmente, desprezar como regra o depoimento policial ou presumir a sua falsidade, mas apenas repensar a crença ingênua e dissociada da realidade de que policiais nunca faltam com a verdade.
Portanto, Judiciário e Ministério Público devem ter a coragem necessária para “chamar as coisas pelo nome certo” e exercer o devido controle sobre a atividade policial.
No caso, de acordo com a versão acusatória, a entrada dos policiais na residência do acusado haveria sido supostamente embasada no seguinte contexto fático: a) os policiais abordaram o corréu porque ele estava transitando com sua motocicleta e quase colidiu com a viatura; b) ele confessou espontaneamente que tinha drogas na mochila e indicou o endereço e as características físicas do paciente e suposto fornecedor das substâncias; c) os policiais foram até o endereço informado e chamaram pelo morador, mas, antes que ele abrisse o portão, os agentes o teriam visto arremessar, de dentro da casa, entorpecentes, uma balança de precisão e um celular para outra casa; d) a esposa do suposto fornecedor abriu o portão; e) foi realizada busca domiciliar e, nela, apreenderam-se drogas.
Observa-se, no entanto, a existência de relevante conflito de versões, de importantes contradições nos depoimentos dos policiais envolvidos na ocorrência e total inverossimilhança da narrativa por eles apresentada em cotejo com a versão do acusado. Ademais, é incontroverso nos autos que, apenas dois meses antes dos fatos ora analisados, o réu havia sido absolvido em outro processo de tráfico, em razão de haver sido torturado com agressões físicas e choques elétricos por policiais militares do mesmo batalhão. A tortura foi reconhecida pela Corregedoria da própria PM ao final do procedimento administrativo instaurado contra os agentes para apurar os fatos e também pelo Tribunal de origem, quando julgou a apelação e absolveu o réu.
Segundo o réu e as testemunhas de defesa, o fato de ele haver denunciado a tortura dos policiais deu causa a episódios de intimidação e retaliação. Ainda que não fossem exatamente os mesmos policiais que foram condenados pela tortura ao acusado, tratava-se de agentes do mesmo batalhão de ações especiais e o contexto descrito nos autos corrobora a tese de retaliação contra o paciente, por haver denunciado a tortura que sofreu por parte de alguns membros do grupo. Relatos sobre esse tipo de prática, aliás, não são raros em situações nas quais ilegalidades praticadas por policiais são expostas.
É clara a ausência de consentimento livre e voluntário para ingresso no imóvel, uma vez que o paciente falou para sua esposa abrir o portão só para que os policiais não o arrombassem, já que estavam tentando forçá-lo, de modo que a mera submissão à força policial não pode ser considerada consentimento livre e voluntário. Desde sua oitiva na delegacia, aliás, o réu sempre deixou claro que, “como os policiais estavam quase arrombando o portão, sua esposa abriu e eles entraram”.
Assim, diante do conflito entre a versão acusatória, bastante inverossímil, e a do acusado, a qual está amparada no depoimento de duas testemunhas e de uma informante, não há como considerar provada a existência da justificativa apresentada para a realização da busca domiciliar, de modo que se deve reconhecer a ilicitude da diligência e, por consequência, de todas as provas dela derivadas, o que conduz à absolvição do acusado.
Cabe salientar, que não houve gravação audiovisual da ação policial, o que poderia haver dirimido as relevantes dúvidas existentes sobre a dinâmica fática, as quais, uma vez que persistem, devem favorecer o acusado, em conformidade com antigo brocardo jurídico in dubio pro reo.
8. Acordo de Não Persecução Penal e Vedação ao Comportamento Contraditório
Indexador
Disciplina: Direito Processual Penal
Capítulo: Acordos Penais
Área
Magistratura
Ministério Público
Defensoria Pública
Destaque
Não se admite a rediscussão das cláusulas do acordo de não persecução penal validamente homologado, sob pena de violação ao princípio da boa-fé objetiva e da vedação ao comportamento contraditório.
HC 969.749-RJ, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 18/3/2025.
Conteúdo-Base
???? O ANPP é um negócio jurídico pré-processual, disciplinado pelo art. 28-A do CPP, que exige voluntariedade e assistência da defesa técnica.
???? A jurisprudência do STJ veda a reanálise das cláusulas após homologação, por configurar comportamento contraditório (nemo potest venire contra factum proprium).
???? A alegação de onerosidade após a celebração viola a boa-fé objetiva e compromete a credibilidade do instituto.
???? O habeas corpus não é via adequada para revisão de cláusulas de acordo validamente homologado.
Discussão e Tese
???? A tese discutida foi se o investigado pode, após a homologação judicial, questionar cláusulas do ANPP por considerá-las excessivamente onerosas.
⚖️ Para o STJ:
• O princípio da boa-fé objetiva impede a rediscussão posterior.
• A atuação contraditória enfraquece a justiça penal negocial e afeta a segurança jurídica.
Como será Cobrado em Prova
???? A cláusula de perdimento de bem prevista no ANPP pode ser impugnada mesmo após sua homologação judicial, se considerada desproporcional.
❌ Errado. O STJ entende que não se admite rediscussão de cláusulas após homologação válida.
???? O investigado assistido por defensor a rigor não pode alegar onerosidade excessiva após ter aderido voluntariamente ao acordo de não persecução penal.
✅ Correto. A jurisprudência do STJ aplica o princípio da boa-fé objetiva e veda comportamento contraditório.
Versão Esquematizada
???? Acordo de Não Persecução Penal |
???? Art. 28-A do CPP: natureza consensual ???? Vedação à rediscussão após homologação ???? Princípio da boa-fé objetiva ???? Inadequação do habeas corpus para revisão do acordo |
Inteiro Teor
A questão em discussão consiste em saber se é possível rediscutir as cláusulas de acordo de não persecução penal já celebrado e homologado, sob alegação de onerosidade excessiva, sem violar o princípio da boa-fé objetiva e a vedação ao comportamento contraditório.
O ANPP, previsto no art. 28-A do Código de Processo Penal, introduzido pela Lei n. 13.964/2019, constitui negócio jurídico de natureza pré-processual celebrado entre o Ministério Público e o investigado, que visa obstar o oferecimento da denúncia mediante o cumprimento de determinadas condições.
Trata-se de instituto que expressa o modelo consensual de justiça criminal, no qual se privilegia a autonomia da vontade do investigado que, assistido por defesa técnica, aceita cumprir determinadas condições em troca do não oferecimento da denúncia, para não se submeter ao processo penal tradicional, com todos os seus ônus e possíveis consequências mais gravosas.
A jurisprudência desta Corte tem sido firme no sentido de que, uma vez celebrado e homologado o ANPP, não é possível a rediscussão de suas cláusulas, sob pena de violação do princípio da boa-fé objetiva e da vedação ao comportamento contraditório (nemo potest venire contra factum proprium).
Com efeito, consoante já decidido pela Quinta Turma do STJ, “comportamentos contraditórios como o da defesa, além de violar o princípio da boa-fé objetiva (art. 5º do CPC), aplicável a todos os sujeitos processuais e ao processo penal, vai de encontro ao objetivo da justiça penal negocial, gerando processos e gastos que deveriam ser evitados com o ANPP, além de enfraquecer o instituto, que acaba sendo utilizado como subterfúgio para postergar o oferecimento da denúncia pelo Ministério Público.” (AgRg no RHC 196.094/SP, Ministro Reynaldo Soreas da Fonseca, Quinta Turma, DJe de 18/9/2024).
No caso, a defesa sustenta que as cláusulas do ANPP são mais onerosas do que uma eventual pena condenatória, especialmente no que concerne ao perdimento da motocicleta em favor da União e à prestação de serviços à comunidade, notadamente considerando a ausência de antecedentes criminais do paciente.
Contudo, observa-se que o paciente foi assistido por defensor público por ocasião da celebração do acordo, e ainda assim optou por aceitá-lo nos termos propostos pelo Ministério Público. A alegação posterior de que as cláusulas seriam excessivamente onerosas caracteriza inequívoco comportamento contraditório, incompatível com o princípio da boa-fé objetiva, que deve permear todas as relações processuais.
Nesse sentido, o art. 565 do Código de Processo Penal estabelece que nenhuma das partes poderá arguir nulidade a que haja dado causa, ou para que tenha concorrido, reforçando a vedação ao comportamento contraditório no âmbito processual penal.
Ora, a reanálise da proporcionalidade das condições pactuadas, após a homologação judicial do acordo, além de violar o princípio da boa-fé objetiva, comprometeria a própria segurança jurídica e a credibilidade do instituto, desestimulando o Ministério Público a oferecer novos acordos e prejudicando futuros investigados que poderiam se beneficiar dessa alternativa à persecução penal tradicional.
Por fim, cabe destacar que o habeas corpus, por seu rito célere e natureza urgente, não constitui via adequada para a rediscussão das cláusulas de um acordo validamente celebrado e homologado, sobretudo quando não há demonstração de flagrante ilegalidade que justifique a intervenção excepcional desta Corte.
9. Validade de Decisão sem Nome do Magistrado em Processo Eletrônico
Indexador
Disciplina: Direito Processual Penal
Capítulo: Atos Processuais
Área
Magistratura
Ministério Público
Defensoria Pública
Destaque
É válida a decisão proferida em processo eletrônico que não apresenta o nome do magistrado no corpo do texto, desde que assinada digitalmente, conforme previsto na Lei n. 11.419/2006.
AgRg no RHC 177.305-SE, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 5/3/2025, DJEN 11/3/2025.
Conteúdo-Base
???? O parágrafo único do art. 8º da Lei n. 11.419/2006 admite a assinatura exclusivamente digital nos atos processuais eletrônicos.
???? A ausência do nome do juiz no corpo da decisão não compromete sua validade se houver assinatura digital validada no sistema.
???? A autenticação digital garante a integridade, autoria e validade jurídica do ato.
???? A posterior assinatura física em ato relacionado confirma a regularidade da tramitação.
Discussão e Tese
???? A tese discutiu se a omissão do nome do juiz em decisão eletrônica configura nulidade do ato judicial por ausência de autenticidade formal.
⚖️ Para o STJ:
• A assinatura digital supre a exigência formal de identificação textual.
• O processo eletrônico tem regime normativo próprio que afasta a nulidade nos moldes tradicionais.
Como será Cobrado em Prova
???? A ausência do nome do juiz no corpo da decisão proferida em processo eletrônico pode ser suprida por assinatura digital válida.
✅ Correto. A jurisprudência do STJ reconhece como válida a decisão digitalmente assinada, mesmo sem o nome no texto.
???? Em processo eletrônico, a assinatura digital do juiz dispensa a exigência formal de identificação textual do magistrado.
✅ Correto. O STJ considera que a assinatura digital assegura validade e autenticidade da decisão.
Versão Esquematizada
???? Processo Eletrônico e Validade Formal |
???? Art. 8º, parágrafo único, da Lei n. 11.419/2006 ???? Assinatura digital supre nome no corpo da decisão ???? Validade dos atos assinados eletronicamente ???? Ausência de nulidade por forma em ambiente digital |
Inteiro Teor
A questão em discussão consiste em saber se a ausência do nome do magistrado em decisão proferida em processo eletrônico caracteriza nulidade processual.
A Lei n. 11.419/2006, que dispõe sobre a informatização do processo judicial, prevê, no parágrafo único do art. 8º, que todos os atos processuais do processo eletrônico serão assinados eletronicamente na forma estabelecida nesta Lei.
No caso, a ação cautelar de interceptação telefônica tramitou integralmente na instância de origem em meio eletrônico, de modo que o impulsionamento do feito pressupõe que as decisões sejam proferidas mediante assinatura eletrônica do Juiz de primeiro grau.
A decisão questionada foi assinada digitalmente e consta regularmente nos autos, inexistindo indícios de invalidade do ato processual. Isso porque a assinatura digital é suficiente para validar decisões judiciais em processos eletrônicos, conforme estabelecido na Lei n. 11.419/2006.
Ademais, embora a defesa alegue que não teria visualizado no sistema eletrônico a assinatura do magistrado, é possível verificar, na sequência, a existência de Alvará de Quebra de Sigilo Telefônico, firmado com assinatura física do Juiz de Direito, de modo que a referida decisão, ainda que não tivesse sido, por lapso, assinada – o que seria impossível, por se tratar de processo eletrônico -, considera-se posteriormente convalidada.
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Créditos:
Estratégia Concursos