Fique por dentro – Informativo STJ Extraordinário 23 Comentado Parte 2

Acesse também o material de estudo!


Informativo nº Extraordinário 23 (Parte 2) do STJ COMENTADO.

DOWNLOAD do PDF AQUI!

1.     Opção de compra de ações. Stock Options. Exercício do direito de opção de compra por terceiros

1.1.  Dos FATOS.

Carlinhos trabalhava há anos em uma grande empresa e, como incentivo, recebeu um plano de stock options, que lhe dava o direito de comprar ações da companhia a um preço vantajoso. Porém, antes de exercer essa opção, ele se enrolou com uma dívida e teve seus bens penhorados, incluindo seu direito de compra dessas ações. O credor, ansioso para recuperar seu dinheiro, queria assumir o direito de compra no lugar do Carlinhos.

Carlinhos contestou, alegando que o plano de stock options é um benefício personalíssimo, concedido apenas a ele e baseado em sua relação com a empresa. O credor, por sua vez, argumentava que qualquer ativo econômico do devedor deveria ser penhorável, incluindo esse direito de aquisição.

1.2.  Análise ESTRATÉGICA.

1.2.1.    Dos FUNDAMENTOS.

A controvérsia resume-se em definir se o direito de compra de ações (stock options) pode ser exercido por terceiro em razão da penhora do direito.

     O direito de opção de compra possui natureza de direito personalíssimo, na medida em que a constituição do plano pela companhia possibilita a outorga exclusiva a seus administradores, empregados e pessoas naturais prestadoras de serviço. Tal exclusividade foi expressamente prevista em lei para possibilitar o desenvolvimento de instrumento de gestão para a companhia, cuja implementação busca beneficiar tanto seus colaboradores como o bom desempenho da atividade da sociedade empresária.

     A constituição dos planos de opção de compra impõe às companhias a observância de diversos requisitos para sua aprovação trazidos pela Lei das Companhias, pela Lei do Mercado de Capitais e futuramente pela redação que vier a ser aprovada pelo Congresso Nacional ao Marco Legal do Stock Options, PL n. 2.724 de 2022.

     No ponto, importa considerar a avaliação de custos e riscos suportados pela sociedade empresária para a instituição do plano, pois a emissão de novas ações pode impactar no retorno do investimento dos acionistas originais. Esse é apenas um dos aspectos a serem considerados na instituição do plano, contudo, denota que o benefício concedido ao colaborador da companhia, a fim de estimular sua permanência no quadro e promover a noção de interesse comum no sucesso da companhia, pode também onerá-la.

     Assim, possibilitar o exercício do direito de opção de compra por terceiro desconhecido significa não apenas impor que a sociedade empresária estabeleça relação negocial compulsória com pessoa estranha, fato que isoladamente já se mostra contraditório, mas também retira da companhia a vantagem que buscou alcançar ao constituir o instrumento de gestão originário do direito em discussão.

1.3.    Da DECISÃO.

O direito de opção de compra de ações (stock options) possui natureza de direito personalíssimo, de modo que comporta exercício apenas pelo beneficiário que firmou o corresponde termo de adesão ao plano de opção de compra, não podendo ser exercido por terceiro em razão de penhora.

REsp 1.841.466-SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 5/11/2024, DJe 11/11/2024  (Info Extraordinário 23)

2.     Certificado de depósito interbancário (CDI). Índice flutuante. Variação do custo da moeda no mercado interbancário

2.1.  Dos FATOS.

A empresa Devodemais Ltda tomou um empréstimo junto ao banco. Quando veio a cobrança, percebeu que os valores estavam sendo corrigidos pelo CDI (Certificado de Depósito Interbancário). Indignada, alegou que o CDI não poderia ser usado como índice de correção monetária, pois não reflete a inflação real da economia, mas sim o custo do dinheiro entre bancos.

O banco, por sua vez, defendeu que o CDI é amplamente aceito no mercado financeiro e reflete o custo da captação de recursos. Além disso, argumenta que, no contrato, as partes haviam concordado expressamente com essa forma de atualização.

2.2.  Análise ESTRATÉGICA.

2.2.1.    Dos FUNDAMENTOS.

A controvérsia na jurisprudência do STJ reside, atualmente, na definição do Certificado de Depósito Interfinanceiro (CDI) como correção monetária ou taxa de juros e, caso entendida como fator de atualização, se pode ser utilizada com a finalidade de correção em financiamento bancário.

     Há, atualmente, DUAS teses em vigência:

  1. O emprego do CDI será possível apenas quando contratado como encargo remuneratório (devendo ser afastado quando pactuado a título de atualização monetária).
  2. Admite-se o referido encargo, independentemente do nome (nomen iuris) a ele conferido pelo contrato.

     No caso de contratos bancários, o próprio objeto do serviço prestado pelo banco é o dinheiro. A instituição financeira capta recursos junto a poupadores, pequenos, médios e grandes investidores e os empresta a clientes que necessitam de financiamento. Como explicado no voto do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, nos autos do REsp 1.781.959, as regras do Banco Central exigem que os bancos diariamente encerrem o dia com saldo positivo. Caso um banco esteja com saldo negativo ao se aproximar o fechamento do expediente bancário, recorre a dinheiro emprestado de outras instituições financeiras no mercado financeiro ou interbancário. O instrumento de que se utilizam as instituições financeiras para tomar ou fornecer recursos entre si é o Depósito Interfinanceiro (DI). O título que lastreia essas operações no mercado interbancário é o Certificado de Depósito Interfinanceiro (CDI).

     Conclui-se, portanto, que o índice setorial adequado para refletir a evolução do custo de captação dos recursos no mercado financeiro é o CDI. Este é o índice tomado por base pelos bancos tanto para a captação de recursos quanto para a concessão de financiamentos a seus clientes.

     Ao contrário do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) e do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que são índices neutros de correção destinados a reajustar os contratos envolvendo bens e serviços em geral, o índice setorial que mede a variação do custo do dinheiro em negócios bancários é o CDI, do mesmo modo como Índice Nacional de Custo da Construção (INCC) é o índice que mede a variação do custo dos insumos na construção civil.

     Dessa forma, NÃO há obstáculo legal à estipulação dos encargos financeiros em contratos bancários com base no índice flutuante CDI, acrescido de juros remuneratórios, sendo desimportante o nome atribuído a tal encargo (juros, correção monetária, “correção remuneratória”), cumprindo apenas verificar se a somatória dos encargos contratados não se revela abusiva, devendo eventual abuso ser observado caso a caso, em cotejo com as taxas médias de mercado regularmente divulgadas pelo Banco Central do Brasil para as operações de mesma espécie.

2.3.    Da DECISÃO.

Nos serviços que tenham por objeto a captação de recursos ou concessão de empréstimos pelas instituições financeiras, o CDI é índice flutuante adequado para medir a variação do custo da moeda.

AgInt no AREsp 2.318.994-SC, Rel. Ministro Marco Buzzi, Rel. para acórdão Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por maioria, julgado em 27/8/2024, DJe 16/10/2024 (Info Extraordinário 23)

3.     Contrato de consórcio. Desistência. Devolução das parcelas pagas. Dedução da taxa de administração e da multa contratual.

3.1.  Dos FATOS.

Gertrudes entrou em um consórcio para comprar um carro, mas logo percebeu que não conseguiria pagar as parcelas. Quando foi solicitar o desligamento do plano com a devolução do valor pago, levou um susto: a administradora queria descontar a taxa de administração sobre o valor total do contrato, e não sobre as parcelas que ela efetivamente pagou.

Gertrudes alega que isso é puro enriquecimento sem causa. A administradora afirma que a taxa é sempre cobrada sobre o valor total do grupo e que essa é a prática do mercado.

3.2.  Análise ESTRATÉGICA.

3.2.1.    Do DIREITO.

LEGISLAÇÃO

Lei n. 11.795/2006, artigos 5º, § 3º, e 27, § 1º

SÚMULAS

Súmula n. 538/STJ

3.2.2.    Dos FUNDAMENTOS.

Da análise detida da Lei n. 11.795/2006, conclui-se que o art. 27, § 1º, da referida norma não contempla a forma de cálculo da taxa de administração e da multa para os casos de restituição de valores pagos a consorciado excluído.

     Isso porque a taxa de administração representa a remuneração da administradora pela formação, organização e administração do consórcio até seu encerramento, nos termos do § 3º do art. 5º da referida lei. Assim, com a desistência do consorciado e sua consequente exclusão do grupo, não subsiste a obrigação de custear serviço não mais prestado a ele.

     A taxa de administração devida sobre as prestações vencidas após a exclusão do consorciado será devida pelo novo titular da cota, de modo que sua cobrança sobre o valor total do contrato na data do encerramento do grupo implicaria enriquecimento sem causa da administradora.

     Conclui-se que a taxa de administração e a multa devidas pelo consorciado desistente devem incidir apenas sobre as parcelas efetivamente pagas pelo consorciado.

3.3.    Da DECISÃO.

A taxa de administração a ser deduzida do valor que será devolvido ao consorciado desistente incide sobre as parcelas efetivamente pagas, e não sobre o valor total do contrato.

AgInt no AREsp 2.267.326-PR, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 4/12/2024 (Info Extraordinário 23)

4.     Recálculo do salário de participação em previdência privada

4.1.  Dos FATOS.

Joaninha, funcionária de uma estatal, contribuiu por anos para um fundo de previdência privada. Ao ter reconhecido na Justiça o direito a verbas trabalhistas retroativas, percebeu que o cálculo do benefício previdenciário não considerava esses novos valores. Ela, então, requereu que a entidade recalculasse sua base de contribuição, incluindo os valores que passaram a integrar seu salário após a decisão judicial.

A entidade de previdência alegava que a revisão não era possível, pois o regulamento do plano previa que o cálculo deveria ser feito com base no que foi efetivamente pago durante o período de contribuição. Ademais, haveria prescrição quinquenal a incidir desde o respectivo salário. Joana, por outro lado, argumentava que, a prescrição decenal só passaria a contar de quando a Justiça reconheceu que aquelas verbas faziam parte de seu salário.

4.2.  Análise ESTRATÉGICA.

4.2.1.    Do DIREITO.

LEGISLAÇÃO

Lei Complementar n. 109/2001

SÚMULAS

Súmula n. 291/STJ

Súmula n. 427/STJ

4.2.2.    Dos FUNDAMENTOS.

Cinge-se a controvérsia quanto ao prazo de prescrição no âmbito da previdência complementar, nos casos em que envolve o recálculo do salário de participação de um participante/assistido ainda na ativa e que obtém, pela Justiça do Trabalho, o reconhecimento de verbas trabalhistas.

     De acordo com a legislação aplicável ao regime de previdência complementar, a prescrição quinquenal ocorre somente na hipótese de parcelas não pagas e não reclamadas na época própria.

     Contudo, quando a pretensão deduzida não diz respeito ao pagamento de parcelas relativas ao próprio benefício, mas se refere a uma obrigação de fazer ou não fazer, como é o caso de recálculo do salário de participação ou contribuição de um participante/assistido que, ainda na ativa, obtém o reconhecimento de verbas trabalhistas e realiza do referido pedido junto à entidade de previdência, o prazo prescricional é o geral de 10 anos.

     Ademais, o termo inicial do prazo de prescrição da pretensão de recálculo de salário de participação é a data em que deveria ter sido realizado o recolhimento das parcelas patronal e empregatícia. Assim, havendo o reconhecimento de direitos na Justiça laboral e que impliquem a alteração do cálculo do salário de participação, conta-se o prazo prescricional da data do trânsito em julgado da ação de conhecimento, nos termos do princípio da actio nata

4.3.    Da DECISÃO.

Aplica-se o prazo prescricional geral de 10 anos à pretensão de recálculo do salário de participação ou contribuição de um participante/assistido que, no âmbito da previdência complementar, ainda na ativa, obtém o reconhecimento de verbas trabalhistas e realiza do referido pedido junto à entidade de previdência.

AgInt no AREsp 2.099.043-DF, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/9/2024, DJe 25/9/2024 (Info Extraordinário 23)

5.     Propositura de ação revisional pelo devedor. Interrupção do prazo prescricional

5.1.  Dos FATOS.

Marquito, empresário do setor de transportes, tinha uma dívida com um banco. Antes de o banco ingressar com uma execução, ele ajuizou uma ação revisional para discutir os juros e encargos aplicados no contrato. Alguns anos depois, o banco decidiu executar a dívida, mas Marquito argumentou que a ação já estava prescrita.

O banco, por sua vez, alegava que a prescrição tinha sido interrompida quando Marquito ajuizou a ação revisional. Já Marcos sustentava que, como a ação revisional era para discutir os valores, e não para reconhecer a obrigação, a prescrição não deveria ter sido interrompida.

5.2.  Análise ESTRATÉGICA.

5.2.1.    Dos FUNDAMENTOS.

Cinge-se a controvérsia em saber se o ajuizamento de ação revisional pelo devedor interrompe o prazo prescricional para o ajuizamento de execução.

     A despeito de existirem precedentes mais remotos, inclusive da Quarta Turma, posicionando-se de maneira contrária à interrupção do prazo prescrional na hipótese, é certo que o entendimento atualmente aplicado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a propositura da ação revisional pelo devedor interrompe o prazo prescricional para o ajuizamento de execução, pois “a quebra da inércia do credor é caracterizada não só pela ação executiva, mas por qualquer outro meio que evidencie a defesa do crédito representado pelo título executivo” (REsp n. 1.956.817/MS, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 14/6/2022, DJe de 17/6/2022).

     Isso se justifica porque é entendimento do STJ que a manifestação do credor, de forma defensiva, nas ações impugnativas promovidas pelo devedor, afasta a sua inércia no recebimento do crédito, sendo apta a evidenciar que o devedor tinha inequívoca ciência do interesse do credor na perseguição do crédito.

     No caso, o ajuizamento de ação revisional implicou o reconhecimento do direito afeto ao crédito buscado pela parte, pois, partindo-se da premissa de que a relação jurídica discutida era válida, o devedor pretendeu discutir a exigibilidade do título, seja por aventada abusividade de cláusulas ou eventual excesso na cobrança de valores.

     A circunstância de ter a insurgente apresentado defesa nos autos da ação revisional, a fim de que prevalecesse a exigibilidade do título e, consequentemente, do crédito discutido afasta a sua inércia, sendo absolutamente desimportante a tese apontada de que a notificação manejada anteriormente à data da ação revisional seria bastante para estabelecer que o termo inicial não se contaria da data da última parcela, pois ante o ajuizamento da revisional, a defesa apresentada pela parte adversa (credora) demonstra a sua intenção em perceber o que lhe é devido.

5.3.    Da DECISÃO.

A propositura da ação revisional pelo devedor interrompe o prazo prescricional para o ajuizamento de execução pelo credor

AgInt no AREsp 2.396.880-SP, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 18/11/2024, DJe 22/11/2024 (Info Extraordinário 23)

6.     Execução de liminar posteriormente revogada. Ação de reparação pelos danos causados.

6.1.  Dos FATOS.

Ricardinho conseguiu uma liminar para interromper a construção de um prédio vizinho que, segundo ele, ameaçava a estrutura de sua casa. Durante anos, a obra ficou embargada. Mas, ao final do processo, a Justiça entendeu que o embargo era indevido e revogou a liminar. O problema? A construtora alegava que teve grandes prejuízos financeiros com a paralisação e queria ser indenizada.

Ricardinho argumentava que o tempo para a construtora pedir indenização já tinha passado e que o prazo de prescrição deveria contar a partir do momento em que a obra foi paralisada. A construtora, por outro lado, sustentava que o prazo só começava a contar depois que a liminar foi revogada em definitivo.

6.2.  Análise ESTRATÉGICA.

6.2.1.    Do DIREITO.

LEGISLAÇÃO

Código Civil (CC), art. 206, § 3º, V

6.2.2.    Dos FUNDAMENTOS.

A controvérsia diz respeito ao termo inicial do prazo prescricional para o ajuizamento de ação de reparação de danos materiais e morais decorrentes do ajuizamento de ação anterior – ação de nunciação de obra nova – em que, concedida liminar, foi julgada procedente em primeiro grau de jurisdição e posteriormente, em decorrência do provimento do recurso de apelação, foi julgada improcedente, oportunidade em que foi afastado o provimento provisório outrora deferido.

     O termo inicial da prescrição é a data a partir da qual é possível exercer a pretensão. Na espécie, o autor poderia exercitar seu direito ao recebimento de perdas e danos desde o trânsito em julgado da ação na qual a tutela foi concedida e depois revogada.

     Nesse sentido, observa-se que somente com o trânsito em julgado, momento em que não seria mais possível a reversão do aresto que revogou parcialmente a tutela antecipada, é que se pode falar em reparação de danos. Nesse sentido, os seguintes precedentes: REsp n. 1.645.759/SC, rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 20/4/2021, DJe de 26/4/2021 e AgRg no REsp n. 1.014.923/GO, rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 20/11/2014, DJe de 25/11/2014.

     Desse modo, deve ser considerada como termo inicial do prazo prescricional para o ajuizamento da ação de reparação de danos – cujo lapso prescricional é de 3 anos (art. 206, § 3º, V, do CC) – a data do trânsito em julgado da ação de nunciação de obra nova.

6.3.    Da DECISÃO.

O termo inicial da prescrição da pretensão de reparação de danos causados por liminar concedida e posteriormente revogada é a data do trânsito em julgado da correspondente ação de conhecimento.

AgInt no AREsp 1.725.366-SP, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/9/2024, DJe 25/9/2024 (Info Extraordinário 23)

7.     Juros remuneratórios. Limitação.

7.1.  Dos FATOS.

Josefina contratou um financiamento para expandir sua empresa, mas, ao longo dos anos, percebeu que os juros aplicados eram muito superiores à média do mercado. Revoltada, entrou na Justiça pretendendo a revisão das taxas, alegando que os valores cobrados eram abusivos e que o banco se aproveitou de sua necessidade de crédito.

O banco, por outro lado, alegava que os juros praticados estavam dentro da liberdade contratual e que não havia nenhuma irregularidade, já que as taxas estavam claramente definidas no contrato. Além disso, argumentava que a simples diferença entre a taxa cobrada e a média de mercado não seria suficiente para provar abusividade.

7.2.  Análise ESTRATÉGICA.

7.2.1.    Do DIREITO.

LEGISLAÇÃO

Código Civil (CC), art. 591 e art. 406

SÚMULAS

Súmula n. 596/STF

Súmula n. 382/STJ

PRECEDENTES QUALIFICADOS

Recurso Especial n. 1.061.530/RS (Temas Repetitivos n. 24, 25, 26 e 27).

7.2.2.    Dos FUNDAMENTOS.

Cinge-se a controvérsia a analisar a configuração ou não da excepcionalidade apta a autorizar a revisão de contratos bancários no tocante à taxa de juros remuneratórios.

     Acerca do tema, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça – STJ possui entendimento consolidado no Recurso Especial 1.061.530/RS, processado segundo o rito dos repetitivos, no sentido de que as instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulados na Lei de Usura, em consonância com a Súmula n. 596/STF; de que aos contratos de mútuo bancário não se aplicam as disposições do art. 591 c/c o art. 406, ambos do Código Civil de 2002, salvo nas hipóteses previstas em legislação específica; e de que a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade, nos termos da Súmula n. 382/STJ, impondo-se para a redução das taxas de juros a comprovação da onerosidade excessiva – capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – em cada caso concreto, tendo como um dos parâmetros a taxa média de mercado para as operações equivalentes.

O atual entendimento firmado pela jurisprudência deste Tribunal Superior é no sentido de que é INSUFICIENTE para a decretação da abusividade da taxa contratada: a) a menção genérica às “circunstâncias da causa” ou outra expressão equivalente; b) o simples cotejo entre a taxa de juros prevista no contrato e a média de mercado divulgada pelo BACEN e c) a aplicação de algum limite adotado, aprioristicamente, pelo próprio Tribunal estadual REsp 2.009.614/SC, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 30/9/2022.

     No caso em discussão, o Tribunal de origem, considerando as peculiaridades do caso concreto, entendeu pela abusividade dos juros nos diversos contratos firmados entre as partes, em razão da comparação entre a taxa média de mercado e a taxa contratada (50% acima da média), bem como por considerar que a modalidade de pagamento entabulada pelas partes (desconto em conta corrente) apresenta garantia de satisfação do débito, reduz o risco de inadimplemento, além do que não houve demonstração por parte da instituição financeira dos eventuais riscos da operação de crédito ou do custo da captação dos recursos, comparado ao de outras operações disponíveis no mercado.

     Assim, adotando a jurisprudência do STJ, a decisão na origem concluiu pela abusividade dos juros remuneratórios previstos contratualmente, em análise das peculiaridades do caso concreto, razão pela qual os limitou à taxa média de mercado estabelecida pelo Banco Central do Brasil.

7.3.    Da DECISÃO.

Admite-se a revisão da taxa de juros remuneratórios excepcionalmente, quando ficar caracterizada a relação de consumo e a abusividade for devidamente demonstrada diante das peculiaridades do caso concreto

AgInt no AREsp 2.608.935-RS, Rel. Ministtro Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 4/11/2024, DJe 7/11/2024 (Info Extraordinário 23)

8.     Plano de saúde. Sistema de infusão contínua de insulina

8.1.  Dos FATOS.

Josiclei, diabético desde a infância, recebeu a recomendação médica de usar uma bomba de insulina para melhor controle glicêmico. Ao acionar seu plano de saúde, recebeu um “não” categórico: o aparelho não estaria listado no rol de procedimentos obrigatórios da ANS. Josiclei argumenta que a bomba de insulina não é um medicamento, mas sim um dispositivo médico essencial, e que a negativa do plano feria seu direito à saúde.

8.2.  Análise ESTRATÉGICA.

8.2.1.    Do DIREITO.

LEGISLAÇÃO

Lei n. 9.656/1998, art. 10, VI, e § 13

Lei n. 14.454/2022

8.2.2.    Dos FUNDAMENTOS.

A controvérsia consiste em saber se a recusa de cobertura do sistema de infusão contínua de insulina ou bomba de insulina por plano de saúde é legítima, considerando a classificação do equipamento como “dispositivo médico” pela ANVISA e a ausência de previsão no rol da ANS.

     A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça havia se orientado no sentido de que “não há obrigatoriedade de cobertura de bomba infusora de insulina (e insumos), por se tratar de equipamento de uso domiciliar” (AgInt no REsp n. 2.078.761/MG, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 29/4/2024, DJe de 2/5/2024).

     Em princípio, pela leitura do art. 10, e seu inciso VI e § 1º, da Lei n. 9.656/1998, as operadoras de plano de saúde estão desobrigadas ao fornecimento ou custeio de medicamento prescrito pelo médico assistente para administração em ambiente externo ao da unidade de saúde e este é o fundamento pelo qual o sistema de infusão contínua de insulina – SICI ou as bombas de insulina estavam excluídas das coberturas dos planos.

     No entanto, conforme consulta formulada pelo Instituto Diabetes Brasil à Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA, depreende-se que o sistema de infusão contínua de insulina – SICI ou bomba de insulina não pode ser categorizado como medicamento, mas sim como DISPOSITIVO médico, de tal forma que se encontra fora da abrangência do espectro regulatório previsto no art. 10, VI, da Lei n. 9.956/1998 e, por tal razão, não pode ser excluído do conjunto de serviços prestados pelas operadoras de planos de saúde. Constitui, em verdade, modalidade de tratamento médico para pacientes portadores de Diabetes Mellitus Tipo 1 que têm dificuldade em manter o controle glicêmico adequado com outras formas de tratamento, como injeções.

     Ademais, ao correlato incremento do custo pela absorção do tratamento pelo plano de saúde, há sensível diminuição das despesas pela redução das internações, como têm demonstrado estudos relacionados à eficácia das bombas de insulina. Deve ser anotado, outrossim, que o sistema de infusão contínua de insulina – SICI faz parte da tabela de recomendações da Sociedade Brasileira de Diabetes, que reúne estudos acerca das evidências de sua eficácia, notadamente a recomendação n. 9. Acrescente-se que, conforme se verifica do relatório da própria CONITEC, o dispositivo já se encontra aprovado por outras agências de países diversos (Inglaterra, Escócia e Austrália).

     Nesse sentido, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça firmou recente entendimento de que “O Conitec e a Anvisa classificam o sistema de infusão contínua de insulina como ‘produto para saúde’; logo, não se enquadra no conceito de medicamento, inserido no inciso VI do art. 10 da Lei 9.656/1998, embora seu uso se destine a tratamento domiciliar”, de modo que “Não há autorização legal expressa à exclusão de cobertura, pela operadora do plano de saúde, do sistema de infusão contínua de insulina para tratamento domiciliar.” (REsp 2.130.518/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 12/11/2024, DJe 18/11/2024).

     Anote-se, por fim, que tal tratamento não se insere entre aqueles constantes no rol da ANS, mas é admitido em razão das inovações introduzidas pela Lei n. 14.454/2022, que acrescentou o § 13 ao art. 10 da Lei n. 9.656/1998, e dos julgados sobre a questão proferidos pelo STJ.

     Dessa forma, a cobertura do mencionado tratamento é obrigatória, desde que observados os parâmetros estabelecidos pela jurisprudência e pela Lei n. 14.454/2022.

8.3.    Da DECISÃO.

O sistema de infusão contínua de insulina é classificado como dispositivo médico e não pode ser excluído da cobertura dos planos de saúde, mesmo não estando no rol da ANS, desde que observados os parâmetros estabelecidos pela jurisprudência e pela Lei n. 14.454/2022.

REsp 2.162.963-RJ, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 17/12/2024, DJEN 23/12/2024 (Info Extraordinário 23)

9.     Contrato de plano de saúde. Necessidade de prévia notificação para rescisão unilateral

9.1.  Dos FATOS.

Dona Marlene, idosa e com problemas cardíacos, foi surpreendida ao tentar marcar uma consulta: seu plano de saúde havia sido cancelado por falta de pagamento. O detalhe? Ela nunca havia sido notificada sobre o risco de cancelamento.

O plano de saúde argumentava que o contrato previa a suspensão automática após 60 dias de inadimplência e que a consumidora deveria estar ciente dessa cláusula. Marlene, por sua vez, sustentava que o Código de Defesa do Consumidor exige notificação prévia, para que o usuário tenha a chance de regularizar a situação antes da rescisão.

Indaga-se: um plano de saúde pode simplesmente cancelar um contrato por inadimplência ou precisa, obrigatoriamente, notificar o consumidor com antecedência?

9.2.  Análise ESTRATÉGICA.

9.2.1.    Do DIREITO.

LEGISLAÇÃO

Lei n. 9.656/1998, art. 13, parágrafo único, II

9.2.2.    Dos FUNDAMENTOS.

A jurisprudência do STJ é firme no sentido de que, nos termos do art. 13, parágrafo único, II, da Lei n. 9.656/1998, é vedada a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato de plano de saúde, salvo por fraude ou não-pagamento da mensalidade por período superior a sessenta dias, consecutivos ou não, nos últimos doze meses de vigência do contrato, desde que o consumidor seja comprovadamente notificado até o quinquagésimo dia de inadimplência.

     Da análise do art. 13 da Lei n. 9.656/1998, compreende-se que o legislador, atento à natureza do contrato em análise, bem como à essencialidade do bem jurídico por ele tratado, estabeleceu mecanismo diferenciado de resolução contratual para os casos de não pagamento.

     Assim, não se admite a rescisão unilateral, mesmo em caso de inadimplência do consumidor, antes da operadora do plano de saúde proceder à notificação do usuário, não podendo ocorrer o cancelamento no mesmo dia da notificação, devendo-se aguardar o vencimento da dívida.

9.3.    Da DECISÃO.

A operadora de plano de saúde somente poderá suspender ou encerrar unilateralmente o vínculo contratual por inadimplência após o sexagésimo dia de atraso, e desde que tenha previamente notificado o beneficiário até o quinquagésimo dia da mora.

AgInt no AREsp 2.477.912-SE, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 9/9/2024, DJe 12/9/2024 (Info Extraordinário 23)

10.  Legitimidade ativa das associações. Ação coletiva representativa

10.1.               Dos FATOS.

Uma associação de servidores públicos entrou com uma ação coletiva para questionar reajustes em um plano de saúde fechado. Segundo a associação, os aumentos aplicados feriam o equilíbrio econômico do contrato e prejudicavam seus associados.

A administradora do plano de saúde contestou a ação, dizendo que a associação não tinha autorização expressa de todos os beneficiários para representá-los e que, por isso, não poderia falar em nome de cada um. A associação, por sua vez, defendia que, como entidade representativa, sua legitimidade era automática e não precisava de autorização nominal de cada associado.

10.2.               Análise ESTRATÉGICA.

10.2.1. Do DIREITO.

LEGISLAÇÃO

Constituição Federal (CF), 5º, XXI

Código de Defesa do Consumidor (CDC), art. 81, art. 82 e art. 91

Código de Processo Civil (CPC/2015), art. 76

Lei n. 7.347/1985 (Lei da Ação Civil Pública), art. 5º

PRECEDENTES QUALIFICADOS

Tema 948/STJ

Tema n. 82/STF

10.2.2. Dos FUNDAMENTOS.

O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.438.263-SP, submetido a sistemática dos recursos repetitivos (Tema 948/STJ), fez a distinção entre as ações coletivas representativas (previstas no art. 5º, XXI, da Constituição Federal) e as ações coletivas substitutivas, conforme previsto nos arts. 81, 82 e 91 do Código de Defesa do Consumidor (Ação Coletiva de Consumo) e art. 5º da Lei n. 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública).

     Na ocasião, a Segunda Seção do STJ asseverou que “o ordenamento jurídico nacional expressa duas distintas previsões acerca da atuação de associações em processos coletivos, ou, mais exatamente, duas espécies de ações, absolutamente diferentes.

REPRESENTATIVASUBSTITUTIVA
De origem constitucional, expressamente trata do tema da representação, autorizando genericamente que as associações promovam a defesa de direitos e interesses exclusivos de seus associados.Tem suporte jurídico para a atuação de associações em processos coletivos, sem apresentar ranço de incompatibilidade com a Constituição Federal, veiculado, sobretudo, na Lei n. 7.347/1985 e no Código de Defesa do Consumidor, que afirmam que, na defesa dos interesses e direitos dos consumidores, as associações, dispensada até mesmo a autorização assemblear (CDC, arts. 81 e 82, IV)

   No caso analisado, a associação ajuizou “Ação Revisional Coletiva” em face de uma Fundação com o objetivo de obter a revisão do índice de reajuste das mensalidades/taxas e o cumprimento dos termos de um acordo relativo a plano fechado de assistência à saúde, destinado aos funcionários e dependentes de um Banco que já se encontra extinto.

     Assim, verifica-se que a hipótese não trata de ação coletiva de consumo, mas de ação coletiva representativa, ajuizada por associação, em defesa dos interesses individuais e exclusivos de seus filiados, sem reflexos no interesse público de defesa do consumidor, conforme definido no citado precedente da Segunda Seção (REsp 1.438.263-SP).

     Nessas condições, para a propositura da ação coletiva por associação que atua como representante processual dos associados, conforme previsto no art. 5º, XXI, da CF/1988, faz-se necessária a apresentação de autorização ou procuração específica dos associados, ou concedida pela Assembleia Geral convocada para esse fim, bem como a lista nominal dos associados representados, nos termos estabelecidos pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 573.232/SC (Tema n. 82/STF), de repercussão geral.

     No entanto, constatada a irregularidade de representação da associação, poderá ser designado prazo razoável para que seja sanado o vício, sendo que, nessa hipótese, a extinção do processo somente poderá ser decretada se, após regular intimação, a associação autora não promover a regularização, consoante determina o art. 76 do CPC/2015.

10.3. Da DECISÃO.

Na hipótese de ação coletiva proposta por associação em defesa dos interesses individuais e exclusivos de seus filiados, sem reflexos no interesse público de defesa do consumidor, é imprescindível a autorização ou procuração específica dos associados, ou concedida pela Assembleia Geral, bem como a lista nominal dos associados representados.

AgInt no AREsp 1.404.482-GO, Rel. Ministro Marco Buzzi, Rel. para acórdão Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, por maioria, julgado em 3/12/2024 (Info Extraordinário 23)

11.  Honorários advocatícios em ação cautelar preparatória

11.1.               Dos FATOS.

Uma grande construtora entrou com uma ação cautelar contra uma fornecedora para discutir multa em contrato milionário. A briga contratual, no entanto, deveria ser resolvida em arbitragem, e a ação judicial foi extinta sem julgamento do mérito.

Os advogados da fornecedora pretendiam o recebimento de honorários de sucumbência sobre o valor da causa ou do contrato. A construtora, no entanto, alegava que, como o caso ainda seria decidido na arbitragem, não havia vencedor ou perdedor na ação judicial, devendo a base se cálculo ser equitativa.

11.2.               Análise ESTRATÉGICA.

11.2.1. Do DIREITO.

LEGISLAÇÃO

Código de Processo Civil (CPC), art. 85, § 2º e § 8º

11.2.2. Dos FUNDAMENTOS.

Cinge-se a controvérsia em saber qual o parâmetro deve ser utilizado para a fixação dos honorários advocatícios de sucumbência na hipótese em que a decisão de extinção do incidente ou ação acessória não declara a dívida extinta ou inexistente, nem reduz seu valor, não ficando inviabilizada a cobrança futura do débito.

     Conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, os honorários de sucumbência devem ser arbitrados por apreciação equitativa, com observância dos critérios do § 2º do art. 85 do CPC/2015, conforme disposto no § 8º desse mesmo dispositivo, quando a extinção do processo acessório ou do incidente ou do cumprimento provisório de sentença não tem correlação imediata com o valor da causa, ou porque não se observa proveito econômico com tal resultado de extinção do feito (AgInt no AREsp n. 1.416.180/SP, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 8/5/2023, DJe 17/5/2023).

     No caso, a extinção da cautelar preparatória se deu em razão do não ajuizamento da ação principal no juízo arbitral no prazo de trinta dias. Todavia, conforme consignou o Tribunal a quo, foi instaurado procedimento arbitral pela parte, de modo que as controvérsias havidas, inclusive as abrangidas no processo cautelar, serão ainda discutidas na seara arbitral.

     Portanto, considerando que a discussão acerca da controvérsia terá continuidade no juízo arbitral, o proveito econômico deve ser considerado inexistente ou inestimável, bem como o valor da causa não se mostra adequado para a fixação dos honorários de sucumbência, impondo-se o seu arbitramento por apreciação equitativa, nos termos do art. 85, § 8º, do CPC/2015.

11.3. Da DECISÃO.

No caso de extinção de ação cautelar preparatória sem a declaração de extinção, inexistência ou redução da dívida, e sem inviabilizar a cobrança futura do débito, os honorários advocatícios devem ser arbitrados por apreciação equitativa, nos termos do art. 85, § 8º, do CPC/2015.

AREsp 1.191.535-MG, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, por maioria, julgado em 3/12/2024 (Info Extraordinário 23)

12.  Honorários advocatícios em sentença de extinção da execução por ilegitimidade passiva em embargos à execução

12.1.               Dos FATOS.

Uma empresa de tecnologia foi demandada em execução, mas conseguiu provar que o débito não era de sua responsabilidade. Para isso, apresentou embargos à execução, que foram aceitos, extinguindo a cobrança.

O exequente rapidamente passou a afirmar que como a execução foi extinta sem que houvesse um julgamento sobre o mérito da dívida, não haveria sucumbência. Deve o exequente pagar honorários advocatícios?

12.2.               Análise ESTRATÉGICA.

12.2.1. Dos FUNDAMENTOS.

No caso, a parte opôs embargos à execução, objetivando desconstituir o título executivo, que embasa a ação de execução.

     Os embargos à execução foram extintos sem resolução do mérito, em virtude da perda do seu objeto, tendo em conta a extinção da própria execução pelo reconhecimento da ilegitimidade passiva dos executados. Ainda, a sentença dos embargos condenou os embargantes ao pagamento das custas processuais, sem condenação em honorários advocatícios.

     Os embargantes apelaram da sentença buscando a condenação da exequente – embargada ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, em atenção ao princípio da causalidade.

     O Tribunal de Justiça deu provimento ao apelo dos embargantes, ao fundamento, em síntese, de que “a extinção da execução originária deu-se exclusivamente pelo reconhecimento da ilegitimidade passiva dos executados (…). Não obstante a extinção, ex ofício, da lide executiva, observa-se que foi formada a angularização processual e opostos embargos à execução, de modo que, à luz do princípio da causalidade, a apelada deve arcar com as custas processuais e com os honorários advocatícios”.

     Verifica-se que o entendimento esposado está em consonância com a pacífica jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça assente no sentido de que, “nos casos de extinção do processo sem resolução de mérito, a responsabilidade pelo pagamento de honorários e custas deve ser fixada com base no princípio da causalidade, segundo o qual a parte que deu causa à instauração do processo deve suportar as despesas dele decorrentes” (AgInt no AREsp 2.439.703/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 15/4/2024, DJe de 17/4/2024).

     Na espécie, quem deu causa à oposição dos embargos à execução fora o exequente que manejara execução contra parte ilegítima, que teve de apresentar defesa.

Nesse mesmo sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é assente de que são devidos honorários advocatícios sucumbenciais pelo exequente quando acolhida a exceção de pré-executividade, ainda que parcialmente (AgInt nos EDcl no REsp n. 1.906.905/SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 10/6/2024, DJe de 14/6/2024).

     Esse entendimento é aplicável ao caso, porquanto os embargos à execução foram extintos por perda do objeto, ante a extinção da execução originária pelo reconhecimento da ilegitimidade dos executados.

12.3. Da DECISÃO.

São devidos honorários advocatícios sucumbenciais pelo exequente, quando os embargos à execução são extintos por perda do objeto, ante a extinção da execução originária pelo reconhecimento da ilegitimidade dos executados

AgInt no AREsp 2.586.064-SC, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 9/9/2024, DJe 13/9/2024 (Info Extraordinário 23)

13.  Impugnação ao valor da causa. Pressuposto processual objetivo. Análise prévia à extinção do processo obrigatória.

13.1.               Dos FATOS.

Uma empresa de logística entrou com uma ação contra um cliente, alegando quebra de contrato e pretendendo indenização. O cliente, no entanto, contestou logo de cara, dizendo que o valor da causa estava inflado e deveria ser reduzido.

O juiz, antes mesmo de analisar a impugnação ao valor da causa, extinguiu o processo por entender que a questão deveria ser resolvida na arbitragem, conforme contrato entre as partes. O réu reclamou: argumentou que, antes de qualquer decisão, o juiz deveria analisar e corrigir o valor da causa, pois isso impactava diretamente em custas e honorários.

13.2.               Análise ESTRATÉGICA.

13.2.1. Dos FUNDAMENTOS.

A controvérsia reside na possibilidade de o Juízo incompetente decidir sobre a impugnação ao valor da causa, alegada na contestação, antes de declarar a extinção do processo sem resolução do mérito.

     O valor da causa é elemento essencial e obrigatório da petição inicial, cuja regularidade deve ser fiscalizada pelo juiz de ofício.

     A correção do valor da causa é um instrumento de política judiciária destinado a coibir a litigância irresponsável, garantir o adequado custeio do serviço jurisdicional e influenciar diretamente na fixação dos honorários advocatícios.

     Assim, por ser pressuposto processual objetivo intrinsecamente ligado à validade da petição inicial, a impugnação ao valor da causa deve ser analisada pelo Juízo incompetente antes da extinção do processo sem julgamento do mérito.

13.3. Da DECISÃO.

A impugnação ao valor da causa é questão processual preliminar, cuja análise deve preceder a extinção do processo sem julgamento do mérito.

REsp 2.169.414-GO, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 17/12/2024, DJEN 23/12/2024 (Info Extraordinário 23)

14.  Competência do juízo cível para processo e julgamento da ação de partilha.

14.1.               Dos FATOS.

Eduardo e Mônica se divorciaram em 2015, mas deixaram a partilha dos bens para depois. Em 2018, Lucas resolveu cobrar sua parte e entrou com uma ação para dividir os bens. Em 2020, Mônica requereu medidas protetivas contra Eduardo, alegando violência doméstica.

Diante disso, o juiz da Vara de Família, onde tramitava a partilha, entendeu que o caso deveria ser transferido para o Juizado de Violência Doméstica. Eduardo protestou, dizendo que a partilha não tinha nada a ver com o pedido de medidas protetivas, pois a ação havia sido ajuizada anos antes. Mônica, por outro lado, argumentava que a violência doméstica alterava a dinâmica da partilha e que o caso deveria ser julgado no contexto das novas circunstâncias.

14.2.               Análise ESTRATÉGICA.

14.2.1. Do DIREITO.

LEGISLAÇÃO

Lei n. 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), art. 14-A, caput, § 1º e § 2º

14.2.2. Dos FUNDAMENTOS.

Trata-se, na origem, de conflito de competência que se originou de ação – cujo objeto se relacionava apenas à partilha dos bens – proposta por ex-cônjuge em 2018, anos após o divórcio ter ocorrido em 2015.

     Essa ação tramitou até 2020 perante a Vara de Família, quando aquele Juízo declinou de ofício sua competência para o Juízo da Vara de Violência Doméstica e Familiar, em razão do superveniente ajuizamento de medida protetiva.

     Segundo o caput do art. 14-A, acrescido à Lei Maria da Penha pela Lei n. 13.894/2019: “a ofendida tem a opção de propor ação de divórcio ou de dissolução de união estável no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.”. Já o parágrafo segundo dispõe que “iniciada a situação de violência doméstica e familiar após o ajuizamento da ação de divórcio ou de dissolução de união estável, a ação terá preferência no juízo onde estiver”. Por outro lado, o parágrafo primeiro ressalva que: “exclui-se da competência dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher a pretensão relacionada à partilha de bens”.

     Dessa forma, se depreende da literalidade do texto legal que a pretensão relacionada à partilha de bens foi expressamente excluída da competência dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, sendo, assim, preservada a competência do Juízo Cível para sua apreciação.

     Portanto, considerando-se que não se trata de ação de divórcio ou de dissolução de união estável envolvendo apenas a partilha de bens anos após o divórcio, é evidente a violação ao § 1º do art. 14-A.

     Também resta violado literalmente o § 2º do mesmo dispositivo legal, pois tendo a ação de partilha sido ajuizada mais de um ano antes do requerimento da medida protetiva, a consequência prevista em lei – caso se tratasse de ação de divórcio ou dissolução de união estável – seria a tramitação com “preferência no juízo onde estiver”.

14.3. Da DECISÃO.

A pretensão relacionada à partilha de bens em situação de violência doméstica e familiar exclui-se da competência dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a mulher.

Processo em segredo de justiça, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 10/12/2024, DJEN 18/12/2024 (Info Extraordinário 23)

15.  . Ação indenizatória. Competência territorial em atos da serventia

15.1.               Dos FATOS.

Um empresário ficou sabendo que um imóvel foi transferido. Descobriu que sua assinatura no documento fora falsificada. Ao que parece, o tabelião que lavrou a procuração não conferiu adequadamente a identidade do suposto vendedor.

O empresário processou o cartório, pedindo indenização pelos danos causados. Moveu a ação em seu próprio domicílio, entendendo ser a relação consumerista. O tabelião apresentou preliminar de incompetência, entendendo que a demanda deveria correr no local da serventia.

15.2.               Análise ESTRATÉGICA.

15.2.1. Do DIREITO.

LEGISLAÇÃO

Constituição Federal (CF/1988), art. 236

Código de Processo Civil (CPC/2015), art. 53, III, f e V

Código de Defesa do Consumidor (CDC), art. 101, I

15.2.2. Dos FUNDAMENTOS.

A controvérsia centra-se na definição do foro competente para julgar ação de indenização por danos morais e materiais, decorrente de suposta falha de serviço de Tabelião, que teria lavrado procuração afirmadamente fraudulenta sem verificar a autenticidade dos documentos apresentados.

     Desse modo, a discussão consiste em determinar se a ação indenizatória deve ser proposta no domicílio do autor, nos termos dos arts. 101, I, do CDC e 53, V, do CPC/2015, ou na sede da serventia notarial, na forma do art. 53, III, f, do CPC/2015.

O Código de Processo Civil de 1973 não possuía disposição específica sobre o tema. Com a entrada em vigor do CPC/2015, o legislador trouxe solução clara e objetiva para esses casos, reconhecendo a particularidade dos atos notariais e de registro, que possuem fé pública e são praticados por delegação do Poder Público (art. 236 da Constituição Federal).

     O Código de Defesa do Consumidor (CDC), em seu art. 101, I, estabelece o domicílio do consumidor como um dos critérios para determinar o foro competente nas ações de responsabilidade civil de fornecedores de produtos e serviços.

     No entanto, o CPC/2015, ao tratar especificamente de danos causados por atos notariais e de registro, fixa a sede da serventia como foro competente para a respectiva demanda indenizatória.

     Dessa forma, independentemente da aplicação das normas consumeristas nas relações jurídicas que envolvam atividade notarial, o Juízo competente para julgar ação de reparação de dano por ato praticado em razão do ofício é o do lugar da sede da serventia notarial ou do registro. Isso ocorre porque o art. 53, III, f, do CPC/2015 é norma específica e mais recente que o Código de Defesa do Consumidor.

     Pela mesma razão, não se deve aplicar o inciso V do art. 53 do CPC, segundo o qual, “é competente o foro: de domicílio do autor ou do local do fato, para a ação de reparação de dano sofrido em razão de delito […]”. Pelo princípio da especialidade, havendo norma específica que regula a situação particular, ela se sobrepõe à norma geral.

     Portanto, ao considerar a especialidade e a cronologia legislativa, a regra especial e posterior prevista no Código de Processo Civil deve ser aplicada, prevalecendo sobre o critério geral de outros normativos.

     No mais, tratando-se de ação de responsabilidade civil em que a causa de pedir é a falha no serviço prestado pelo Tabelião no exercício de suas funções, a presença de outras partes no polo passivo não é suficiente para alterar a competência territorial.

15.3. Da DECISÃO.

O foro competente para julgar ação de indenização por danos morais e materiais decorrente de suposta falha de serviço notarial por Tabelião é o da sede da serventia notarial ou do registro.

REsp 2.011.651-RS, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 26/11/2024, DJEN 4/12/2024 (Info Extraordinário 23)

Créditos:

Estratégia Concursos

Acesse também o material de estudo!

Leave a Reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *