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DIREITO PROCESSUAL CIVIL
1. Agravo de Instrumento em Ação Civil Pública
AREsp 2.159.586-RJ, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 3/12/2024
A norma específica inserida no microssistema de tutela coletiva, prevendo a impugnação de decisões interlocutórias mediante agravo de instrumento (art. 19 da Lei n. 4.717/1965), não é afastada pelo rol taxativo do art. 1.015 do CPC/2015, uma vez que o inciso XIII desse artigo contempla o cabimento do agravo em outros casos expressamente referidos em lei.
1.1. Caso Hipotético
Dra. Gertrudes, advogada atuante na defesa do meio ambiente, ajuizou uma ação civil pública para impedir a construção de um empreendimento em área de proteção ambiental. No meio do processo, solicitou o aditamento da inicial para incluir novas provas e argumentos, mas o juiz negou o pedido por intempestividade.
Inconformada, Dra. Gertrudes recorreu via agravo de instrumento. O problema? O tribunal de origem entendeu que a decisão interlocutória do juiz não estava no rol taxativo do artigo 1.015 do CPC/2015, o que impediria o agravo. Para Gertrudes, porém, a ação civil pública faz parte do microssistema de tutela coletiva, em que há previsão expressa para o cabimento do agravo de instrumento contra decisões interlocutórias.
1.2. Inteiro Teor
Não bastasse a taxatividade mitigada definida pelo STJ no julgamento do REsp 1.696.396/MT, apreciado sob o rito de demandas repetitivas, as duas Turmas de Direito Público do Superior Tribunal de Justiça têm entendido que a norma específica inserida no microssistema de tutela coletiva, prevendo a impugnação de decisões interlocutórias mediante agravo de instrumento (art. 19 da Lei n. 4.717/1965), NÃO é afastada pelo rol taxativo do art. 1.015 do CPC/2015, notadamente porque o inciso XIII daquele preceito contempla o cabimento daquele recurso em outros casos expressamente referidos em lei.
Assim, conquanto não prevista especificamente na Lei de Ação Civil Pública, a regra legal prevista na Lei da Ação Popular estende-se a todas as ações inseridas no microssistema de tutela coletiva, de modo que é cabível a interposição de agravo de instrumento na espécie.
1.3. Confira Também!
LEGISLAÇÃO
Código de Processo Civil (CPC/2015), art. 1.015.
Lei n. 4.717/1965, art. 19.
PRECEDENTES QUALIFICADOS
REsp 1.696.396/MT (Tema 988/STJ).
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Questões: 1. O agravo de instrumento é cabível em ações civis públicas. 2. A Lei da Ação Popular não pode ser aplicada por analogia às ações civis públicas. Gabarito: 1. Certo. 2. Errado. |
2. Saneamento Básico em Terras Indígenas
AREsp 2.381.292-PR, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 10/12/2024
Os entes estaduais são partes legítimas para figurar no polo passivo de ação que busca garantir o fornecimento regular de água potável e saneamento básico a terra indígena.
2.1. Caso Hipotético
Creosvaldo, líder de uma comunidade indígena, viu seu povoado sofrer há anos com a falta de água potável e saneamento básico. Cansado de esperar, foi para a justiça para garantir esses serviços, mas o Estado alegou que a responsabilidade era exclusiva da União, com base na Lei de Saneamento Básico (Lei n. 11.445/2007).
Em resposta, Creosvaldo argumentou que, além de saneamento, a questão envolvia manutenção da saúde indígena, tema que exige atuação conjunta da União e dos estados.
2.2. Inteiro Teor
Não se está em discussão a hipótese de simples fornecimento de saneamento básico, mas da prestação desse serviço (de saneamento) como meio indispensável à manutenção das condições da saúde indígena.
Consoante interpretação dos arts. 19-C, 19-D e 19-E da Lei n. Lei n. 8.080/1990, em se tratando de ações para fins de concretização da saúde indígena, exige-se a atuação não apenas da União, mas também dos Estados (art. 19-E). Essa norma expressa já seria suficiente para justificar a manutenção do Estado do Paraná no polo passivo da lide, mas não é a única razão.
Além disso, também sob a perspectiva da Lei n. 11.445/2007, não haveria exclusão da responsabilidade estadual, pois, o caso em exame não discute a competência para fixar Plano Nacional de Saneamento Básico (art. 52, I), esta sim de responsabilidade da União.
Na hipótese, o que se discute, na realidade, é a obrigação de atendimento local/regional de saneamento, cuja execução é operada em articulação com os Estados (art. 52, II), o que justifica a pertinência subjetiva passiva do ente estadual.
2.3. Confira Também!
LEGISLAÇÃO
Lei n. 11.445/2007, art. 52, I e II
Lei n. 8.080/1990, art. 19-C, art. 19-D, art. 19-E
Hora de praticar! CERTO ou ERRADO: |
Questões: 1. O Estado pode ser responsabilizado pela falta de saneamento básico em terras indígenas, pois a saúde indígena exige atuação conjunta dos entes federativos. 2. A obrigação de fornecer saneamento básico às terras indígenas é exclusiva da União. Gabarito: 1. Certo. 2. Errado. |
3. Motoristas de Aplicativo e o Vínculo de Emprego
REsp 2.144.902-MG, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 3/12/2024, DJEN 6/12/2024
Compete à Justiça comum, e não à Justiça do Trabalho, julgar demanda ajuizada por motorista de aplicativo em face da empresa gestora de plataforma digital, tendo em vista a relação de natureza civil existente entre as partes
3.1. Caso Hipotético
Creosvaldo dirigia para um aplicativo de transporte há dois anos, seguindo seus próprios horários e decidindo quando e onde trabalhar. Quando teve sua conta desativada, entrou na Justiça do Trabalho pedindo reconhecimento de vínculo empregatício, alegando que era subordinado à plataforma.
A empresa, por sua vez, argumentou que Creosvaldo não tinha jornada fixa, nem ordens diretas da empresa, e que seu trabalho era autônomo, regido por contrato civil. Portanto a competência para decidir a causa seria da Justiça Comum, não da laboral.
3.2. Inteiro Teor
O sistema jurídico brasileiro oferece DUAS hipóteses de enquadramento para prestadores de serviço, empregado e autônomo.
Os requisitos legais cumulativos necessários à configuração da condição de EMPREGADO, previstos nos artigos 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho, consistem em pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e subordinação. Por exclusão, não preenchidos tais requisitos, e existindo legislação específica que disciplina a relação jurídica, ainda que não de modo extenso, evidencia-se a hipótese de relação de prestação de serviço autônomo.
Os prestadores de serviço de transporte privado via plataformas digitais têm sua atividade prevista em lei especial, qual seja, Lei da Política Nacional de Mobilidade Urbana (Lei n. 12.587/2012). Ademais, no exercício de sua função, NÃO preenchem os requisitos cumulativos acima descritos, na medida em que não satisfeitos os requisitos da não eventualidade e subordinação.
Motoristas de aplicativos, como são popularmente conhecidos, exercem liberdade plena no que se refere à escolha do momento em que se colocam à disposição na plataforma. Não eventualmente, a atividade é exercida como forma de complementação de renda em períodos determinados exclusivamente pelo motorista.
Além disso, a prestação do serviço de transporte via plataformas não denota subordinação. O que se verifica é que as plataformas, ao disponibilizarem o acesso ao serviço, estabelecem uma série de condições mínimas de comportamento ao prestador de serviço e ao consumidor, bem como condições de estado ao veículo particular que será utilizado, tudo com a finalidade de garantir segurança e efetividade ao negócio jurídico intermediado.
A interpretação de tais condições conduz a uma intervenção no exercício das relações particulares e na dinâmica da atividade econômica que descaracterizaria não só a relação ora em debate, mas outros contratos de natureza empresária que manifestamente estabelecem condições, padronizações e limitações no exercício da relação negocial e não por isso configuram relação de emprego ou trabalho.
À luz da legislação vigente, verifica-se que os motoristas, prestadores do serviço de transporte, NÃO preenchem os requisitos necessários à configuração de relação de emprego ou trabalho e atuam de modo autônomo, sem vínculo de emprego com a empresa gestora da plataforma digital em questão. |
Assim, o sistema de transporte privado individual intermediado a partir de provedores de rede de compartilhamento detém natureza de cunho civil.
No caso, a pretensão formulada na inicial consiste na reativação de sua conta perante a plataforma para que siga prestando o serviço de transporte privado de pessoas, bem como a reparação pelos danos decorrentes da suspensão. A causa de pedir da demanda em questão origina-se, portanto, do alegado descumprimento do contrato de intermediação para a prestação de serviços de transporte firmado entre as partes.
Dessa forma, na medida em que a causa de pedir e o pedido trazido na inicial não se referem à existência de relação de trabalho entre as partes, limitando-se o conflito a questões de relação jurídica de cunho eminentemente CIVIL, não está configurada hipótese de competência da justiça especializada.
3.3. Confira Também!
LEGISLAÇÃO
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), art. 2º e art. 3º
Lei n. 12.587/2012 (Lei da Política Nacional de Mobilidade Urbana)
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Questões: 1. Há vínculo empregatício entre motoristas de aplicativo e a plataforma digital, pois há subordinação fática. 2. A relação entre motorista e plataforma digital tem natureza civil, e não trabalhista, diante da ausência de não eventualidade e subordinação. Gabarito: 1. Errado. 2. Certo. |
4. Insolvência Civil e Execução Frustrada
AgInt no REsp 2.034.944-RS, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 12/11/2024.
Na hipótese de execução singular frustrada, é desnecessária a prévia desistência do processo de execução, bastando que fique suspenso até a prolação de sentença definitiva na ação de insolvência civil.
4.1. Caso Hipotético
Geremias, empresário do setor têxtil, foi processado por vários credores, mas não tinha bens suficientes para quitar suas dívidas. Depois que várias execuções restaram frustradas, os credores decidiram veicular seus pedidos em ação de insolvência civil para que todos os débitos fossem pagos de forma organizada.
Geremias tentou impedir a ação, alegando que as execuções individuais deveriam ser extintas antes de os credores ingressarem com o pedido de insolvência. Os credores, no entanto, argumentaram que bastava que as execuções fossem suspensas, pois a insolvência ainda precisava ser declarada pelo juiz.
Podem os credores, após a verificação de insuficiência de bens do devedor na execução singular, promover a ação declaratória de insolvência civil (arts. 748 e seguintes do CPC de 1973), sem que tenham sido extintas as execuções individuais?
4.2. Inteiro Teor
O processo de insolvência, em sua PRIMEIRA fase, visa aferir o estado de insolvência do devedor apto a dar início a uma execução coletiva, momento em que possui estrutura de processo de conhecimento. Somente na SEGUNDA fase, caso demonstrada a insolvência, é que o processo se torna propriamente executivo, formando a massa ativa da insolvência.
Logo, somente a partir da declaração da insolvência e da instauração do concurso universal de credores é que se torna vedado ao credor utilizar-se de mais de uma via judicial, devendo seguir com a tentativa de obtenção do crédito apenas pelo processo de insolvência. Isso porque, antes desse momento, o credor não tem garantia de que o estado de insolvência será reconhecido, restando ilógico impor-lhe a necessidade de desistência prévia da execução singular manejada.
Nesse sentido, em consonância com os princípios da instrumentalidade das formas, da primazia do julgamento do mérito e da celeridade e economia processuais, evitando-se que os atos processuais da expropriação singular se tornem ineficazes, bem como que haja a necessidade de ajuizamento de nova execução, é cabível a SUSPENSÃO do processo singular, permitindo-se que seja retomado o seu curso, caso não haja a declaração de insolvência. Todavia, ocorrendo esta última, os autos deverão ser remetidos ao juízo universal da insolvência.
4.3. Confira Também!
LEGISLAÇÃO
Código de Processo Civil de 1973 (CPC/1973), arts. 748 a 753
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Questões: 1. O credor pode ajuizar ação de insolvência civil sem necessidade de desistir da execução singular, desde que esta fique suspensa. 2. Com a declaração judicial da insolvência, deve-se obrigatoriamente extinguir todas as execuções individuais em andamento. Gabarito: 1. Certo. 2. Certo. |
DIREITO TRIBUTÁRIO
5. ICMS e a Perda de Energia em Processos Industriais
REsp 1.854.143-MG, Rel. Ministro Paulo Sérgio Domingues, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 10/12/2024, DJEN 17/12/2024
Os “gases ventados” constituem perdas inerentes a qualquer processo produtivo e, ainda que não comercializados, não afastam o direito ao crédito de ICMS, visto que a energia elétrica foi consumida no processo de industrialização, nos termos do art. 33, II, b, da Lei Complementar n. 87/1996 (Lei Kandir).
5.1. Caso Hipotético
Gasosão Ltda, indústria de gases medicinais, foi surpreendida pela Fazenda estadual, que queria estornar créditos de ICMS sobre a energia elétrica utilizada no processo produtivo. O motivo? Parte da energia consumida por Gasosão Ltda resultava na liberação de “gases ventados” na atmosfera, ou seja, um subproduto que não era comercializado. Para o fisco, como aqueles gases ventados não geravam receita, todo o crédito de ICMS da energia elétrica utilizada para produzi-los deveria ser estornado.
Gasosão contestou, alegando no processo produtivo de gases industriais e medicinais (oxigênio, nitrogênio e argônio), há a dispensação na atmosfera de gases que não atendem os critérios de qualidade exigidos pelo comprador e cujo acúmulo, se não disperso na atmosfera, tem potencial para comprometer a qualidade da produção regular e, igualmente, para danificar a estrutura física da indústria. Para a indústria, esses descartes são perdas inerente ao processo industrial.
5.2. Inteiro Teor
A Lei Complementar n. 87/1996 (Lei Kandir), a teor do art. 20, caput e § 1º, ao implementar a não cumulatividade do ICMS, permitiu o aproveitamento dos créditos referentes à aquisição de quaisquer produtos intermediários, desde que comprovada a necessidade de sua utilização para a realização do objeto social do estabelecimento empresarial. No que tange especificamente às operações de entrada de energia elétrica no estabelecimento, a referida LC, em seu art. 33, II, b, autoriza o creditamento do imposto nos casos em que essa energia é consumida no processo de industrialização.
Em análise conjunta do art. 20, § 1º, com o art. 33, II, b, ambos da Lei Complementar n. 87/1996, constata-se que o legislador, em momento algum, buscou limitar a fruição dos créditos de ICMS a depender da destinação dada à mercadoria final produzida com o produto intermediário adquirido. Apesar de a comercialização do produto constituir pressuposto lógico do fim almejado pelo processo de industrialização, a lei não traz essa limitação expressa, de modo que não cabe ao Poder Judiciário subverter a competência do Poder Legislativo e impô-la, como postula o Estado recorrente.
Logo, os “gases ventados” constituem refugo – perdas inerentes a qualquer processo produtivo – e, ainda que não comercializados, não afastam o direito ao crédito de ICMS visto que a energia elétrica foi consumida no processo de industrialização, tal como prescreve o supramencionado art. 33, II, b, da Lei Complementar n. 87/1996.
Ademais, deve prevalecer o posicionamento da Primeira Seção do STJ segundo o qual é “cabível o creditamento referente à aquisição de materiais (produtos intermediários) empregados no processo produtivo, inclusive os consumidos ou desgastados gradativamente, desde que comprovada a necessidade de sua utilização para a realização do objeto social da empresa – essencialidade em relação à atividade-fim” (EAREsp n. 1.775.781/SP, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Seção, julgado em 11/10/2023, DJe de 1/12/2023).
5.3. Confira Também!
Lei Complementar 87/1996 (Lei Kandir), art. 20, caput e § 1º; e art. 33, II, b.
Hora de praticar! CERTO ou ERRADO: |
Questões: 1. Diante da não cumulatividade do ICMS, é permitido o aproveitamento dos créditos referentes à aquisição de quaisquer produtos intermediários. Porém, para que o crédito de ICMS seja reconhecido, a energia deve resultar exclusivamente em produtos comercializados. 2. A energia elétrica consumida no processo industrial pode gerar crédito de ICMS, mesmo que parte dela resulte em perdas técnicas. Gabarito: 1. Errado. 2. Certo. |
6. Seguro Garantia e o Prazo para Embargos à Execução Fiscal
REsp 2.185.262-RJ, Rel. Ministro Paulo Sérgio Domingues, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 17/12/2024, DJEN 23/12/2024
Nas execuções fiscais, o prazo para oposição de embargos à execução deve iniciar-se após a intimação do executado acerca do aceite do seguro garantia pelo Juiz.
6.1. Caso Hipotético
Geremias, empresário do setor de transportes, precisou oferecer seguro garantia em uma execução fiscal para evitar bloqueios nas contas da empresa. Fez o depósito e, após a aceitação pelo juízo, apresentou seus embargos à execução.
O juiz rejeitou os embargos por intempestividade, argumentando que o prazo tinha corrido desde a juntada do seguro aos autos. Geremias recorreu, rebatendo que o prazo deveria começar a contar apenas após o juiz aceitar formalmente a garantia, pois antes disso não havia segurança de que o seguro seria considerado válido.
6.2. Inteiro Teor
Que papo é esse de seguro garantia?
O seguro garantia funciona como uma garantia oferecida pelo contribuinte para assegurar o pagamento dos valores supostamente devidos e exigidos pela Fazenda Pública. Para tanto, o contribuinte contrata uma apólice de seguro junto a uma seguradora e essa apólice é então apresentada como garantia de que o pagamento será efetuado caso o contribuinte perca a discussão em âmbito judicial, sendo a relação entre contribuinte e seguradora de âmbito privado, sem qualquer participação da Fazenda Nacional ou do Poder Judiciário.
Ok. E agora, como funciona o prazo?
Sobre o prazo para oposição de embargos à execução, o art. 16, II, da Lei n. 6.830/1980 (Lei de Execução Fiscal – LEF) dispõe que o prazo de 30 dias será contado da juntada da prova do seguro garantia e, em seu parágrafo 1º, deixa claro que não serão admissíveis os embargos antes de garantida a execução.
Esse dispositivo leva à interpretação de que existem dois momentos processuais na garantia da execução fiscal pelo executado: 1) a juntada do seguro garantia aos autos e 2) o aceite pelo Juiz da causa, o que resulta no início do prazo para oposição dos embargos à execução. |
Sendo o aceite do seguro garantia uma condição de procedibilidade para apresentar os embargos à execução, é possível afirmar que, se o Juiz transferisse para a Fazenda Nacional a análise de sua suficiência estaria consequentemente transferindo a jurisdição, tendo como resultado a violação ao art. 16 do Código de Processo Civil de 2015. Assim, o prazo para a oposição de embargos à execução deve se dar após o aceite da garantia pelo Juiz da causa.
6.3. Confira Também!
LEGISLAÇÃO
Código de Processo Civil (CPC), art. 16
Lei n. 6.830/1980, art. 16, II, e § 1º
Hora de praticar! CERTO ou ERRADO: |
Questões: 1. O seguro garantia opera o pagamento da dívida, suspendendo todos os seus corolários. 2. A simples juntada do seguro garantia aos autos já inicia automaticamente o prazo para os embargos. Gabarito: 1. Errado. 2. Errado. |
7. Exceção de Pré-Executividade após Embargos Rejeitados (I)
REsp 2.130.489-RJ, Rel. Ministro Paulo Sérgio Domingues, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 17/12/2024, DJEN 23/12/2024
Após a propositura e o julgamento de improcedência dos embargos à execução fiscal, está configurada a preclusão consumativa, não sendo mais cabível a apresentação de exceção de pré-executividade mesmo sob o fundamento de matérias suscetíveis de conhecimento de ofício, ou de quaisquer nulidades do título.
7.1. Caso Hipotético
Pagonada ME foi cobrada judicialmente por um débito de IPTU que insistia ser indevido. Para se defender, Pagonada apresentou embargos à execução, mas apesar de sua combatividade, restou sucumbente. Seguindo o cumprimento, apresentou nova tese jurídica, agora por meio de exceção de pré-executividade, para alegar a nulidade no título cobrado, por haveria imunidade quanto à incidência de IPTU, embora não alegada até então.
A Fazenda argumentou que Pagonada não podia mais discutir o caso, pois ela já tinha esgotado todas as oportunidades de defesa nos embargos. Pagonada retrucou que nulidades podem ser alegadas a qualquer tempo.
7.2. Inteiro Teor
Como funciona a execução fiscal…
Proposta a execução fiscal para a cobrança de dívida ativa, sobre a qual paira presunção relativa de certeza e liquidez, à luz do art. 3º, caput, da Lei n. 6.830/1980 (Lei de Execução Fiscal – LEF), a parte executada é citada para pagar a dívida ou garantir o juízo, sob pena de se sujeitar a medidas coativas de execução forçada.
Garantido o juízo, a parte executada terá a oportunidade de se defender, veiculando toda e qualquer matéria útil à defesa de seu patrimônio jurídico nos embargos à execução fiscal, cujo cabimento se encontra disciplinado pelo art. 16 da Lei n. 6.830/1980.
Embora sejam os embargos à execução o meio de defesa expressamente previsto na Lei de Execuções Fiscais, a doutrina e a jurisprudência pátrias há muito são unânimes em garantir à parte executada a apresentação de exceção de pré-executividade, por meio de protocolo de simples petição nos próprios autos, objetivando desconstituir a higidez do título executivo fiscal, desde que cumpridos simultaneamente dois requisitos, quais sejam:
- que verse sobre matéria de ordem pública, cognoscível de ofício pelo magistrado, referentes aos pressupostos processuais, às condições da ação, à inexistência ou à deficiência do título executivo; e
- que o acolhimento das razões da parte excipiente não demandem dilação probatória.
A consolidação da jurisprudência pelo cabimento daquele incidente processual culminou na edição da Súmula 393 pelo STJ (“A exceção de pré-executividade é admissível na execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de ofício que não demandem dilação probatória“).
Para as execuções em geral, o Código de Processo Civil veio a prever a possibilidade de se requerer ao juiz a nulidade do processo executivo fundada na ausência dos atributos de certeza, liquidez ou exigibilidade, independentemente de embargos à execução, por meio dos arts. 518 e 803.
Assim, na execução em geral, como na execução fiscal, mesmo sem a oposição de embargos à execução e ausente penhora para prévia garantia do juízo, a parte litigante que figura no polo passivo da demanda exacional pode suscitar matérias passíveis de que delas o juiz conheça de ofício enquanto não extinto o processo executivo.
Mas pode a parte executada excepcionar mesmo após terem sido julgados seus embargos à execução fiscal?
R: Aí já é demais (Para a Primeira Turma)!!!!
Os embargos oportunizam à parte veicular toda matéria útil que servisse a sua defesa, ou se há impedimento à parte executada de inovar ou ampliar a matéria de defesa, via simples petição, ante a ocorrência da preclusão consumativa, ainda que se trate de questões de ordem pública que devem ser decretadas de ofício pelo magistrado.
Há julgados da Segunda Seção e da Segunda Turma do STJ que aceitam a apresentação de “exceção de pré-executividade” após a rejeição dos embargos à execução de título extrajudicial em geral ou título judicial para tratar de matéria de ordem pública não alegada e apreciada nos embargos. Todavia, ainda que se viesse a admitir, que nas execuções em GERAL pudesse haver a apresentação de novas matérias de defesa, nas execuções FISCAIS não é assim.
A previsão de regra processual na lei geral, no caso o Código de Processo Civil, não implica sua incidência automática na execução de título extrajudicial regulada por lei especial, no caso da execução fiscal, regida pela Lei n. 6.830/1980. A aplicação do CPC de forma subsidiária à execução fiscal é reservada para as situações nas quais o regramento especial é silente e não haja incompatibilidade entre as normas.
Ao contrário do art. 917 do CPC, o § 2º do art. 16 da LEF deixa claro que, nos embargos, a parte executada deverá concentrar toda sua defesa com vistas a desconstituir o processo executivo. |
O dispositivo da LEF em questão evidencia que os embargos à execução fiscal são regidos pelo PRINCÍPIO DA EVENTUALIDADE, que impõe à parte litigante a obrigação de arguir todas as teses que entender cabível para defesa de seu direito na ocasião oportuna e de uma só vez, sob pena de ver precluso o direito de suscitá-las posteriormente.
Em suma: opostos embargos à execução fiscal, nos quais se inaugurou a discussão defensiva por meio de um processo cognitivo pleno, com a observância do contraditório e a formação de conjunto probatório, a prolação de sentença definitiva de improcedência do pedido obsta que a parte executada complemente a defesa já deduzida. Está configurada a preclusão consumativa, que garante a segurança das relações processuais e previne a criação de obstáculos para a conclusão efetiva do processo de execução.
Logo, mesmo as matérias suscetíveis de conhecimento de OFÍCIO, ou quaisquer nulidades do título que poderiam ser alegadas durante o trâmite dos embargos à execução, NÃO podem ser arguidas posteriormente por meio de exceção de pré-executividade, porque transitou em julgado a decisão que declarou hígido e exigível o crédito exequendo.
7.3. Confira Também!
LEGISLAÇÃO
Lei n. 6.830/1980 (Lei de Execução Fiscal), artigos 3º, caput ; e 16, § 2º.
Código de Processo Civil (CPC), artigos 518, 803 e 917.
SÚMULAS
Súmula n. 393/STJ
8. Exceção de Pré-Executividade Após Embargos à Execução (II)
REsp 2.045.492-RJ, Rel. Ministro Teodoro Silva Santos, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 10/12/2024, DJEN 20/12/2024.
Desde que não se trate de reiteração de matérias já decididas em embargos à execução e estejam preenchidos os demais requisitos de cabimento da exceção de pré-executividade, não há, abstratamente, impedimento à apresentação desta após o ajuizamento daquele.
8.1. Caso Hipotético
Imagine o mesmíssimo caso da decisão 7, só que pela relata russa da justiça, a questão caiu em outra Turma do STJ…
Portanto, a controvérsia diz respeito à possibilidade de apresentação de exceção de pré-executividade em execução fiscal, após o ajuizamento dos embargos à execução, mas antes do trânsito em julgado da sentença proferida na via autônoma de impugnação, com a veiculação de matéria não alegada na petição de embargos.
8.2. Inteiro Teor
A eficácia preclusiva da coisa julgada prestigia a segurança jurídica e a estabilidade das relações sociais, notadamente, por considerar como repelidos até mesmo os argumentos que a parte poderia alegar, em sua defesa, e não apenas aqueles que efetivamente alegou.
No que concerne aos embargos à execução, porém, a aplicação do instituto da eficácia preclusiva da coisa julgada parece peculiar, pois, embora formalmente se trate de ação de conhecimento – nos embargos o executado assume a condição de autor – a referida via de impugnação também reveste-se de nítido caráter DEFENSIVO.
Nesse sentido, caso se considere que o autor, embargante, deva alegar toda a matéria de defesa na petição de embargos à execução, sob pena de arcar com as consequências da eficácia preclusiva da coisa julgada, será forçoso concluir que, após o trânsito em julgado da sentença, nada mais poderá alegar em seu favor.
De outro vértice, encarando-se os embargos à execução como ação de conhecimento pura, a alteração da causa de pedir poderia, a depender do caso, ensejar o manejo de nova ação, tendo em vista que “[u]ma ação é idêntica a outra quando possui as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido” e que “[h]a coisa julgada quando se repete ação que já foi decidida por decisão transitada em julgado”, conforme prevê o art. 337, §§ 2º e 4º, do CPC.
Na hipótese, conforme constou no acórdão recorrido, ao tempo da apresentação da exceção de pré-executividade, ainda não havia passado em julgado a sentença que julgou os embargos à execução manejados pela parte. Por simples raciocínio de lógica dedutiva, chega-se à conclusão de que se não há trânsito em julgado, não há se falar em eficácia preclusiva, pois aquele é condição sine qua non para a configuração desta.
Igualmente, no tocante a eventual preclusão consumativa, não há, abstratamente, impedimento à apresentação de exceção de pré-executividade após o ajuizamento de embargos à execução, desde que, evidentemente, não se trate de reiteração de matérias já decididas, a teor do art. 507 do CPC.
Com efeito, “[é] possível a apresentação de exceção de pré-executividade, apesar da anterior oposição de embargos à execução. Todavia, não é dado ao executado rediscutir matéria suscitada e decidida nos embargos à execução, em razão da eficácia preclusiva da coisa julgada” (AgInt nos EDcl no REsp n. 2.059.394/PE, Relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 23/10/2023, DJe de 26/10/2023).
8.3. Confira Também!
LEGISLAÇÃO
Código de Processo Civil (CPC), art. 337, §§ 2º e 4º; art. 507; e art. 508.
DIREITO CIVIL
9. Sucessão e o Valor Real de Créditos Herdados
REsp 2.168.268-SC, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 3/12/2024, DJEN 6/12/2024
O valor nominal, constante de escritura pública, não é suficiente, por si só, para quantificar o valor do bem herdado, no caso de transferência de título de crédito por sucessão.
9.1. Caso Hipotético
Creide herdou uma nota promissória de seu falecido pai, mas logo descobriu que o crédito, na prática, valia muito menos do que o valor nominal registrado no inventário… A empresa devedora da promissória estava falida e dificilmente pagaria integralmente o valor devido.
Quando credores do espólio tentaram cobrar as dívidas da herança, Creide argumentou que a responsabilidade sucessória deveria ser limitada ao valor real do crédito herdado, e não ao valor teórico constante da escritura pública. Os credores insistiam que a promissória deveria ser considerada pelo valor total, independentemente da real possibilidade de pagamento.
A controvérsia é: o valor NOMINAL de uma nota promissória deve ser utilizado para calcular o valor do patrimônio transferido por herança e, consequentemente, estabelecer o alcance das obrigações sucessórias?
9.2. Inteiro Teor
Como funciona a sucessão & inventário:
A abertura da sucessão transmite, de forma automática (princípio da saisine), a propriedade de todo o patrimônio dos herdeiros e legatários, nos termos 1.784 do Código Civil, englobando tanto os direitos e créditos como as obrigações e dívidas existente à data do óbito.
Após concluída a partilha, cada herdeiro responde proporcionalmente à parte herdada que lhe coube até o limite do acréscimo patrimonial dela decorrente.
A determinação das forças da herança, em sua extensão objetiva, deve por em relevo o sentido econômico do acréscimo patrimonial, devendo seu real valor ser mensurado conforme a natureza do bem jurídico herdado.
Sobre os títulos de crédito e as consequências para a sucessão:
A nota promissória, enquanto título de crédito cambial, é bem móvel que materializa direito literal, autônomo e abstrato, destinado a facilitar a circulação econômica de crédito, reduzindo seus riscos jurídicos e econômicos ao afastar a possibilidade de oposição de exceções pessoais contra endossatários.
Nesse sentido, a avaliação econômica para determinar o real valor de mercado dos títulos e do próprio crédito deve levar em consideração aspectos relacionados aos riscos de crédito (inadimplência e mora), além do tempo de antecipação da disponibilidade financeira e da chance de recuperação dos créditos em mora, motivo pelo qual o valor nominal constante de escritura pública, por si só, não é suficiente para quantificar o valor do bem herdado.
Assim, essa quantificação do valor real do título, ainda que não seja simples, especialmente para aqueles vencidos e não pagos, é imprescindível e deve anteceder à eventual penhora de valores pessoais dos herdeiros, concretizando a limitação de sua responsabilidade pessoal.
9.3. Confira Também!
LEGISLAÇÃO
Código Civil (CC), art. 1.784
Hora de praticar! CERTO ou ERRADO: |
Questões: 1. O valor nominal da nota promissória herdada é insuficiente, por si só, para quantificar o patrimônio transferido. 2. A herança responde pelas dívidas deixadas pelo falecido, mas somente até o limite do valor real dos bens recebidos pelos herdeiros. Gabarito: 1. Certo. 2. Certo. |
DIREITO DO CONSUMIDOR
10. Vazamento de Dados e Responsabilidade da Empresa
REsp 2.147.374-SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 3/12/2024, DJEN 6/12/2024.
É passível a imputação das obrigações previstas no art. 19, II, da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), ao agente de tratamento de dados, na ocasião de vazamento de dados pessoais não sensíveis do titular, decorrente de atividade alegadamente ilícita (ataque hacker).
10.1. Caso Hipotético
Josefina, cliente de um banco digital, foi vítima de um vazamento de dados pessoais que expôs seu CPF, endereço e informações bancárias. O banco alegou que o vazamento foi causado por um ataque hacker, um fator externo que o isentaria de qualquer responsabilidade.
Josefina, no entanto, argumentou que a instituição bancária deveria ter adotado medidas de segurança mais robustas, pois a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) exige que os agentes de tratamento protejam as informações de seus clientes. Se não provar que tomou todas as precauções necessárias, o banco deveria ser responsabilizado.
10.2. Inteiro Teor
Ao inscrever a proteção e o tratamento de dados pessoais no rol dos direitos e garantias fundamentais da Constituição Federal (art. 5º, LXXIX), a Emenda Constitucional n. 115/2022 inaugurou um novo capítulo no ordenamento jurídico brasileiro no que tange aos direitos de personalidade, à liberdade e à autodeterminação informativa.
Nesse sentido, as empresas que se enquadram na categoria dos agentes de tratamento têm a obrigação legal de tomar todas as medidas de segurança esperadas pelo titular dos dados para que suas informações sejam protegidas, e seus sistemas utilizados para o tratamento de dados pessoais devem estar estruturados de forma a atender aos requisitos de segurança, aos padrões de boas práticas e de governança e aos princípios gerais previstos na LGPD e às demais normas regulamentares.
Ademais, compliance de dados é o esforço de conformidade e de aplicação da LGPD nas atividades das empresas que lidam com tratamento de dados. Referido instrumento assume importância central ao induzir não apenas à obediência ao direito, mas também à comprovação da efetividade dos programas de conformidade.
O tratamento de dados pessoais configura-se como irregular quando deixa de fornecer a segurança que o titular dele poderia esperar (“expectativa de legítima proteção“), consideradas as circunstâncias relevantes, entre as quais as técnicas de tratamento de dados pessoais disponíveis à época em que foi for realizado (art. 44, III, da LGPD). |
No caso de a empresa de tratamento não provar que determinado vazamento dos dados tenha ocorrido exclusivamente em razão de incidente de segurança (ataque hacker), é impossível aplicar em seu favor a excludente de responsabilidade do art. 43, III, da LGPD.
Assim, é correta a conclusão de concretizar os direitos do titular dos dados ao condenar a empresa responsável pelo tratamento de dados na obrigação de apresentar informação das entidades públicas e privadas com as quais realizou o uso compartilhado dos dados da recorrida (art. 18, VII, da LGPD) e a fornecer declaração completa que indique a origem dos dados, a inexistência de registro, os critérios utilizados e a finalidade do tratamento, bem como a cópia exata de todos os dados referentes ao titular constantes em seus bancos de dados (art. 19, II, da LGPD).
10.3. Confira Também!
LEGISLAÇÃO
Constituição Federal. art. 5º, LXXIX.
Emenda Constitucional nº 115/2022.
Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), artigos 18, VII; 19, II; 43, III; 44, III.
Hora de praticar! CERTO ou ERRADO: |
Questões: 1. O vazamento de dados pessoais por ataque hacker pode gerar responsabilidade para a empresa, caso ela não comprove que adotou medidas adequadas e suficientes de segurança. 2. Se o vazamento de dados ocorrer por ação de terceiros (hackers), a empresa nunca pode ser responsabilizada. Gabarito: 1. Certo. 2. Errado. |
11. Taxas de Instalação em Contratos de Compra e Venda de Imóveis
REsp 2.041.654-RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 10/12/2024, DJEN 13/12/2024.
É válida a cláusula contratual que, redigida com destaque, transfere ao promitente comprador a obrigação de pagar o preço de instalações e ligações de serviços públicos nos contratos de promessa de compra e venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária, ainda que ausente a quantificação precisa do valor dos serviços.
11.1. Caso Hipotético
Nerso comprou um apartamento na planta e, ao receber as chaves, descobriu que teria que pagar uma taxa extra pela instalação de energia e saneamento. Ele alegou que não havia sido informado previamente sobre essa cobrança e que a construtora deveria arcar com os custos.
A construtora, por sua vez, disse que a cláusula estava no contrato, com destaque, e que não poderia prever o valor exato dessas instalações no momento da assinatura.
11.2. Inteiro Teor
Dos direitos do consumidor
A fim de concretizar o comando constitucional de proteção ao consumidor (art. 5º, XXXII, CF/1988) e de combater as desigualdades materiais decorrentes da vulnerabilidade deste no mercado de consumo (art. 4º, I, do CDC), o Código de Defesa do Consumidor elenca, de modo exemplificativo, os diversos direitos do consumidor e os inúmeros deveres a que se submetem os fornecedores de produtos e serviços.
Dentre os direitos básicos do consumidor, inclui-se “a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem (art. 6º, III, do CDC).
No que tange à proteção contratual do consumidor, o art. 46 do CDC dispõe que “os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance”.
Há, portanto, um dever de que as informações consideradas relevantes sobre o produto ou serviço sejam transmitidas ao consumidor de modo adequado e eficiente, com o devido destaque das cláusulas onerosas no momento da realização dos contratos consumeristas.
Então, como fica a cobrança das taxas?
O valor cobrado pelas concessionárias e permissionárias de serviços públicos trata-se de preço público (tarifa) destinado às despesas com instalações (materiais e equipamentos, mão de obra, deslocamento, testes de segurança, etc.) para as ligações definitivas de serviços públicos, como luz urbana e saneamento básico (abastecimento de água potável, esgotamento sanitário, limpeza urbana, drenagem de resíduos sólidos e manejo das águas pluviais urbanas, nos termos do art. 3º, I, da Lei n. 11.445/2007).
Dessa forma, não se pode afirmar que a cobrança da tarifa pela instalação e ligações definitivas dos serviços públicos, por si só, seja abusiva, pois o valor que tem como finalidade remunerar serviço essencial e autônomo que será efetivamente prestado pelas concessionárias e permissionárias após a construção do bem.
Nada obstante, em observância ao dever de informação que permeia os contratos regidos pelo Código de Defesa do Consumidor, a cláusula que lhe transfere os ônus pelo pagamento de eventuais custos adicionais deve ser redigida com destaque e de modo eficiente.
Conclui-se que é válida a cláusula contratual que, redigida com destaque, transfere ao promitente comprador a obrigação de pagar o preço de instalações e ligações de serviços públicos nos contratos de promessa de compra e venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária, ainda que ausente a quantificação precisa do valor dos serviços.
11.3. Confira Também!
LEGISLAÇÃO
Constituição Federal (CF/1988), art. 5º, XXXII
Código de Defesa do Consumidor (CDC/1990), art. 4º, I
Lei n. 11.445/2007, art. 3º, I
Hora de praticar! CERTO ou ERRADO: |
Questões: 1. A cláusula que transfere ao comprador os custos de instalações de serviços públicos é válida, desde que redigida com destaque. 2. Diante da ausência do valor exato da respectiva taxa, é puramente protestativa e, portanto, abusiva, a cláusula que transfere ao promitente comprador a obrigação de pagar o preço de instalações e ligações de serviços públicos nos contratos de promessa de compra e venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária. Gabarito: 1. Certo. 2. Errado. |
12. Erro Médico e Cirurgia Plástica Estética
REsp 2.173.636-MT, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 10/12/2024, DJEN 18/12/2024.
Em se tratando de cirurgia plástica estética não reparadora, caso o resultado seja desarmonioso, segundo o senso comum, presume-se a culpa do profissional e o dever de indenizar, ainda que não tenha sido verificada imperícia, negligência ou imprudência.
12.1. Caso Hipotético
Creide decidiu fazer uma mamoplastia para melhorar a aparência dos seios, mas, após a cirurgia, ficou insatisfeita com o resultado. Alegou que as mamas ficaram assimétricas e que o cirurgião deveria indenizá-la por não cumprir a obrigação de resultado.
O médico argumentou que usou a técnica correta, mas que o organismo de cada paciente reage de forma diferente.
12.2. Inteiro Teor
Em se tratando de cirurgia plástica estética não reparadora, existe consenso na jurisprudência e na doutrina de que se trata de obrigação de RESULTADO. Diante do que disposto no art. 14, § 4º, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), a responsabilidade dos cirurgiões plásticos estéticos é subjetiva, havendo presunção de culpa, com inversão do ônus da prova.
Ademais, o uso da técnica adequada na cirurgia estética NÃO é suficiente para isentar o médico de culpa, nos casos em que o resultado da operação não foi aquele desejado pelo paciente. Assim, nessas situações, com a inversão do ônus da prova, entende-se que a culpa do médico seria presumida e a ele caberia elidir essa presunção, mediante prova de ocorrência de algum fator imponderável, apto a eximi-lo do seu dever de indenizar por não ter alcançado o resultado pretendido com a cirurgia, tais como caso fortuito, força maior ou culpa exclusiva da vítima.
Embora o art. 6º, inciso VIII, do CDC seja aplicado aos cirurgiões plásticos, a inversão do ônus da prova, prevista neste dispositivo, não se destina apenas à comprovação de fator imponderável que possa ter contribuído para o resultado negativo da cirurgia, mas, principalmente, AUTORIZA que o cirurgião faça prova do resultado satisfatório alcançado, segundo o senso comum, e não segundo os critérios subjetivos de cada paciente.
Logo, em se tratando de cirurgia plástica estética não reparadora, quando não tiver sido verificada imperícia, negligência ou imprudência do médico, mas o resultado alcançado não tiver agradado o paciente, somente se pode presumir a culpa do profissional se o resultado for desarmonioso, segundo o senso comum. |
12.3. Confira Também!
LEGISLAÇÃO
Lei n. 8.078/90 (CDC), arts. 6º, VIII, e 14, § 4º
Hora de praticar! CERTO ou ERRADO: |
Questões: 1. Em cirurgia plástica estética eletiva, incide a responsabilidade do médico se o resultado for desarmonioso segundo o julgamento do paciente/consumidor. 2. Nas hipóteses de cirurgia plástica estética eletiva, o cirurgião plástico não tem responsabilidade se utilizar a técnica correta, independentemente do resultado final. Gabarito: 1. Errado. 2. Errado. |
DIREITO PROCESSUAL PENAL
13. Conflito de Competência antes da Denúncia
REsp 2.162.562-SE, Rel. Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 3/12/2024, DJEN 20/12/2024.
A ausência de oferecimento de denúncia não impede o reconhecimento do conflito de competência.
13.1. Caso Hipotético
Joselito foi investigado por um crime de estelionato, mas a denúncia ainda não havia sido apresentada. Enquanto isso, dois juízos se declararam incompetentes para julgar o caso, e ninguém sabia quem deveria decidir a questão.
O Ministério Público alegou que o conflito de competência só poderia ser reconhecido após o oferecimento da denúncia, pois antes disso não haveria processo penal formalizado. Já a defesa sustentava que a incerteza sobre o juízo competente comprometia o direito de defesa.
13.2. Inteiro Teor
A configuração de conflito de competência exige a demonstração de que (1) dois ou mais juízes se declararam competentes ou incompetentes para o julgamento do mesmo fato criminoso, ou que (2) entre eles surgiu controvérsia sobre unidade de juízo, junção ou separação de processos, conforme expressa disposição do art. 114 do CPP.
É pacífica a jurisprudência do STJ no sentido de que “somente haverá conflito de competência quando houver manifestação de dois órgãos jurisdicionais que se considerem competentes ou incompetentes para julgamento da mesma causa”. (AgRg no CC n. 188.912/RJ, relatora Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, julgado em 10/8/2022, DJe 18/8/2022).
Na hipótese, verifica-se o Tribunal de origem pontuou que “o feito foi originariamente distribuído para o Juizado Especial Criminal, que declinou da competência” e que “Recebidos os autos pelo Juízo de Direito da Vara Criminal, entendeu que somente devem ser processadas e julgadas pela Vara Criminal as infrações penais (crimes e contravenções) praticadas em desfavor de criança, de adolescente ou de idoso, em situação de vulnerabilidade, nas quais a Lei comine pena máxima superior a 2 anos”.
Observa-se, portanto, que, embora não tenha havido oferecimento de denúncia, as autoridades jurisdicionais que supervisionavam a atividade investigativa findaram por divergir negativamente acerca da competência para conhecimento dos fatos, a indicar o preenchimento dos requisitos do art. 114 do CPP.
13.3. Confira Também!
LEGISLAÇÃO
Código de Processo Penal (CPP), art. 114
Hora de praticar! CERTO ou ERRADO: |
Questões: 1. O conflito de competência pode ser reconhecido mesmo antes do oferecimento da denúncia. 2. Para a existência de conflito de competência passível de julgamento, é necessário o início formal do processo penal via denúncia formalizada. Gabarito: 1. Certo. 2. Errado. |
14. Cadeia de Custódia e Provas Digitais Corrompidas
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministra Daniela Teixeira, Rel. para acórdão Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por maioria, julgado em 10/12/2024, DJEN 26/12/2024.
A corrupção de parte dos arquivos digitais compromete a integralidade da prova, inviabilizando sua utilização.
14.1. Caso Hipotético
Gertrudes foi acusada de participar de um esquema de fraudes bancárias e teve seu celular apreendido. A perícia extraiu as mensagens e documentos, mas parte dos arquivos ficou corrompida e inacessível.
A defesa argumentou que a prova era incompleta e não poderia ser usada contra Gertrudes, pois havia o risco de que elementos favoráveis a ela tivessem sido perdidos. O Ministério Público sustentou que a parte recuperada era suficiente para comprovar o crime.
A questão em discussão consiste em saber se a prova digital obtida mediante busca e apreensão, com parte dos arquivos corrompidos e inacessíveis, pode ser admitida em juízo…
14.2. Inteiro Teor
Como que se comprova a integridade da prova digital?
O tema foi examinado pela primeira vez pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do AgRg no RHC 143.169/RJ, em que foi esclarecido que se pode utilizar a documentação das hashes, cuja finalidade é permitir a comparação posterior entre os arquivos.
Hash é uma função criptográfica que transforma dados em uma sequência fixa de caracteres. É uma espécie de “impressão digital” do documento, que permite identificar se o conteúdo foi alterado. |
Agora, o simples fato de se ter documentado as hashes dos arquivos (formados a partir do espelhamento do conteúdo de cada aparelho eletrônico apreendido), por si só, não garante a integridade do material. A simples existência da hash não permite concluir que o arquivo apresentado é autêntico e íntegro: para se auditar essas características, é necessário comparar a hash do arquivo espelhado com a daquele apresentado no processo.
No caso, seria necessário comparar, então, pelo menos as hashes dos arquivos disponibilizados à defesa em nuvem, no link enviado pelo Ministério Público, com as hashes daqueles constantes dos HDs de origem e do “HD do Fisco”, onde foram armazenados. Sendo idênticos os códigos, podemos concluir que os arquivos constantes nesses suportes são também idênticos.
No caso, a acusação e o juízo de origem se recusaram a adotar esse procedimento, havendo um prejuízo concreto à confiabilidade da prova, porque não há como saber se os arquivos são, de fato, os mesmos.
Além disso, na situação sob análise, há um fato incontroverso: Ministério Público, juízo singular e acórdão recorrido reconhecem que parte do material apreendido é absolutamente inacessível, porque seus arquivos foram corrompidos por “algum tipo de erro”, que se acredita ter acontecido no momento da extração dos dados na busca e apreensão. O problema principal da causa está, dessarte, na ofensa à integralidade da prova.
Todos os agentes processuais reconhecem que a defesa não tem acesso à integralidade do material, pois parte dos arquivos foi irremediavelmente perdida, por algum erro desconhecido. Não se sabe qual parte dos arquivos é essa, se ela fomentaria uma elucidação melhor dos fatos ou mesmo se ela corroboraria alguma linha fática defensiva. Por exclusiva responsabilidade do Estado, essa informação se perdeu, e não há como acessá-la.
Em resumo, a prova digital está incompleta. Considerando que parte das conversas se perdeu por responsabilidade exclusiva do Estado, quando esses dados estavam em sua custódia, é ônus do Estado arcar com as repercussões jurídicas da incompletude da prova. Isso porque, se o remanescente da interceptação fosse admitido em juízo, pairariam eternamente dúvidas muito relevantes sobre o conjunto probatório.
Portanto, à semelhança da situação julgada no HC 160.662/RJ, não houve a “salvaguarda da integralidade do material colhido na investigação, repercutindo no próprio dever de garantia da paridade de armas”.
A jurisprudência do STJ, em casos análogos, determina a inadmissibilidade de provas incompletas, em respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa, e à própria confiabilidade dos registros de corpo de delito.
Assim, mantendo íntegra e coerente jurisprudência desta Corte Especial, como manda o art. 926 do Código de Processo Civil (CPC), deve-se aplicar aqui a mesma solução dada no AgRg no RHC 143.169/RJ, em 2023, e ao HC 160.662/RJ, em 2014, no sentido da inadmissibilidade da prova digital que não atende a requisitos mínimos de confiabilidade.
14.3. Confira Também!
LEGISLAÇÃO
Código de Processo Civil (CPC), art. 926.
Hora de praticar! CERTO ou ERRADO: |
Questões: 1. A corrupção de parte dos arquivos digitais no momento da extração, tornando-os inacessíveis, compromete a integridade da prova, que se torna inadmissível no processo, em seu todo. 2. Se parte dos arquivos digitais foi perdida, a prova restante ainda pode ser usada normalmente no processo, tanto pela defesa quanto pela acusação. Gabarito: 1. Certo. 2. Errado. |
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Estratégia Concursos